Sussurros








Capítulo Quatorze

Eu voltei para a casa da fazenda pouco antes das oito. Eu virei a chave na tranca, segurei a maçaneta e bati meu quadril contra a porta. Eu tinha ligado para minha mãe poucas horas antes do jantar; ela estava no escritório, terminando algumas coisas, sem ter certeza se estaria em casa e eu esperava encontrar a casa quieta, escura e fria.
Na terceira batida, a porta cedeu e eu arremessei minha bolsa na escuridão em seguida lutei com a chave que ainda estava atolada na fechadura. Desde a noite que o Patch veio, a fechadura desenvolveu uma disposição gananciosa. Eu me perguntei se Dorothea tinha notado hoje cedo.
“Me-dê-a-porcaria-da-chave,” eu disse, mexendo para que ela se soltasse.
O relógio do vovô no hall badalou a hora, e oito dongs altos reverberaram no silêncio. Eu estava andando na sala para acender o fogão a lenha quando ouvi um farfalhar de tecido e um rangido baixo do outro lado da sala.
Eu berrei.
!” minha mãe disse, jogando longe o cobertor e sentando-se apressadamente no sofá. “Qual é o problema do mundo?”
Eu tinha colocado uma mão em cima do meu coração e a outra espalmada na parede para me segurar. “Você me assustou!”
“Eu caí no sono. Eu tivesse ouvido você entrar eu teria falado alguma coisa.”
Ela tirou o cabelo do rosto e piscou como uma coruja. “Que horas são?”
Eu me joguei na poltrona mais próxima e tentei recuperar as batidas normais do meu coração. Minha imaginação tinha conjurado um par de olhos atrás de uma máscara de esqui. Agora eu tinha certeza que ele não era uma invenção da minha imaginação, eu tinha um desejo irresistível de contar tudo para minha mãe, desde que ele tinha pulado no Neon até seu papel como atacante da . Ele estava me perseguindo e era violento. Nós temos que trocar as fechaduras das portas. E parece lógico que a polícia se envolva. Eu me sentiria muito mais segura com um policial estacionado na guia.
“Eu ia esperar para tocar no assunto,” mamãe disse, interrompendo meus pensamentos, “mas eu não tenho certeza se o momento perfeito vai aparecer.”
Eu fiz uma careta. “O que está acontecendo?”
Ela deu um longo suspiro. “Estou pensando em por a casa da fazenda à venda.”
O que? Por quê?”
“Eu estou lutando há um ano e não estou conseguindo o quanto eu esperava. Eu considerei ter um segundo emprego, mas honestamente, não acho que tenha horas suficientes no dia.” Ela riu sem nenhum traço de humor. “Os salários da Dorothea são modestos, mas é um dinheiro extra que não temos. A única coisa que posso pensar é nos mudar para uma casa menor. Ou um apartamento.”
“Mas esta é a nossa casa.” Todas as minhas memórias estão aqui. As memórias do meu pai estão aqui. Eu não podia acreditar que ela não se sentisse do mesmo jeito. Eu faria tudo que pudesse para ficar.
“Vou dar mais três meses,” ela disse. “Mas não quero que tenha muitas esperanças.”
Certo, então eu sabia que não podia dizer para mamãe sobre o cara com a máscara de esqui. Ela se demitiria do trabalho amanhã. Ela pegaria um emprego local e não haveria absolutamente nenhuma escolha a não ser vender a casa da fazenda.
“Vamos falar sobre algo mais brilhante,” mamãe disse, colocando um sorriso em seu rosto. “Como foi o jantar?”
“Bom,” eu disse melancolicamente.
“E a ? Como está a recuperação dela?”
“Ela poderá voltar para a escola amanhã.”
Mamãe sorriu ironicamente. “Ela ter quebrado o braço esquerdo foi uma coisa boa. Se não ela não conseguiria tomar notas nas aulas e eu posso imaginar o quão desapontador isso seria para ela.”
“Há, há,” eu disse. “Eu vou fazer chocolate quente.” Eu fiquei em pé e apontei por sobre meu ombro para a cozinha. “Você quer?”
“Na verdade isso soa perfeito. Eu vou acender o fogo.”
Depois de uma rápida passada pela cozinha para pegar as xícaras, leite e a caixa de chocolate em pó, eu voltei e descobri que mamãe tinha colocado uma chaleira com água no fogão a lenha. Eu me empoeirei no braço do sofá e passei a xícara para ela.
“Como você soube que estava apaixonada pelo Papai?” Eu perguntei, fazendo um esforço para parecer casual. Havia sempre a possibilidade de que falar sobre Papai traria rios de lágrimas, algo que eu esperava evitar.
Mamãe sentou no sofá e ergueu seus pés e os colocou na mesinha de centro. “Eu não sabia. Não até estarmos casados por um ano.”
Não era a resposta que eu esperava. “Então... por que você casou com ele?”
“Porque eu achava que estava apaixonada. E quando você acha que está apaixonada, você fica disposta a aguentar e trabalhar para que se transforme em amor.”
“Você ficou apavorada?”
“Por causa do casamento?” Ela riu. “Essa foi a parte divertida. Comprar o vestido de noiva, reservar a capela, usar um solitário de diamante.”
Eu imaginei o sorriso malicioso do Patch. “Alguma vez você ficou com medo do Papai?”
“Sempre que o New England Patriots perdia.”
Sempre que o New England Patriots perdia, meu pai ia para a garagem e acelerava sua motosserra. Dois Outonos atrás ele arrastou sua motosserra para a floresta atrás da nossa propriedade, derrubou dez árvores e as transformou em lenha. Nós ainda temos mais da metade da pilha para queimar.
Mamãe afagou o sofá ao seu lado e eu me enrolei nela, descansando minha cabeça no seu ombro. “Sinto falta dele,” eu disse.
“Eu também.”
“Tenho medo de me esquecer como ele se parecia. Não nas fotos, mas andando por aí nos sábados pela manhã suando fazendo ovos mexidos.”
Mamãe enlaçou seu dedo no meu. “Você é muito parecida com ele, desde criança.”
“Sério?” eu me sentei reta. “De que maneira?”
“Ele era um bom aluno, muito inteligente. Ele não era chamativo ou comunicativo, mas as pessoas o respeitavam.”
“O Papai era... misterioso?”
Mamãe pareceu procurar em sua mente. “Pessoas misteriosas tem muitos segredos. Seu pai era um livro aberto.”
“Ele já foi rebelde?”
Ela deu uma gargalhada alta e curta. “Você o vê dessa forma? Herrison , a pessoa mais ética do mundo... Rebelde?” Ela deu uma engasgada teatral. “Deus me perdoe! Por um tempo ele teve cabelo comprido. Era ondulado e loiro – igual ao de surfista. Claro, que seus óculos com aro de tartaruga mataram o visual. Então... Eu deveria perguntar o que nos trouxe a esse assunto?”
Eu não tinha ideia de como explicar para minha mãe meus sentimentos conflituantes em relação ao Patch. Eu não tinha ideia de como explicar Patch, ponto. Provavelmente minha mãe estava esperando uma descrição que incluía o nome dos pais, seu boletim, quais esportes ele praticava e em quais faculdades ele pretendia se inscrever. Eu não queria alarmá-la dizendo que eu
apostava meu cofrinho que o Patch tinha uma ficha criminal. “Tem um cara,” eu disse, incapaz de não sorrir ao pensar no Patch. “Estamos saindo ultimamente. Sobretudo coisas de escola.”
“Ooh, um cara,” ela disse misteriosamente. “Bem? Ele está no clube do xadrez? Conselho estudantil? Time de tênis?”
“Ele gosta de pool33,” eu disse otimista.

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33 Em inglês a palavra pool pode significar piscina e mesa de bilhar. Aqui ela quis dizer mesa de bilhar, mas sua mãe achou que ela estava falando de piscina.
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“Um nadador! Ele é bonito como o Michael Phelps? Claro, eu sempre preferi Ryan Lochte quando o assunto é aparência.”
Eu pensei em corrigir minha mãe. Pensando bem, provavelmente era melhor não esclarecer. Pool, natação... É próximo certo?
O telefone tocou e mamãe se esticou no sofá para atender. Dez segundos de ligação e ela se jogou no sofá e bateu com a mão na testa. “Não, não é problema. A primeira coisa que farei amanhã pela manhã é correr até lá, pegar e levar.”
“Hugo?” Eu perguntei depois que ela desligou. Hugo era o chefe da minha mãe e dizer que ele ligava toda hora era falar o mínimo. Uma vez ele ligou para ela ir ao trabalho porque ele não sabia mexer na máquina de tirar cópias.
“Ele deixou alguns papéis inacabados no escritório e precisa que eu vá lá. Tenho que fazer cópias, mas não devo demorar mais que uma hora. Você já terminou seu dever de casa?”
“Ainda não.”
“Então posso dizer para mim mesma que não teríamos passado um tempo juntas mesmo que eu estivesse aqui.” Ela suspirou e ficou em pé. “Vejo você em uma hora?”
“Diga ao Hugo que ele deveria te pagar mais.”
Ela riu. “Muito mais.”
Assim que tive a casa só para mim, eu tirei a louça do café da manhã da mesa da cozinha para dar espaço para meus livros escolares. Inglês, história do mundo, biologia. Armada com meu lápis número dois novinho, eu abri o primeiro livro e fui ao trabalho.
Quinze minutos depois minha mente se rebelou, recusando-se a digerir outro parágrafo do sistema feudal europeu. Eu me perguntei o que o Patch estaria fazendo depois do trabalho. Dever de casa? Difícil de acreditar. Comendo pizza e assistindo basquete na TV? Talvez, mas não parecia a cara
dele. Fazendo apostas e jogando bilhar no Bo’s Arcade? Isso parecia um bom palpite.
Eu tinha um desejo inexplicável de dirigir até o Bo’s e defender meu comportamento de mais cedo, mas esse pensamento foi rapidamente colocado em perspectiva pelo simples fato de eu não ter tempo. Minha mãe estará em casa em um tempo menor do que eu levaria para fazer meia viagem até lá. Isso sem mencionar que Patch não era o tipo de cara que você poderia simplesmente sair caçando. No passado, nossos encontros tinha sido de acordo com a agenda dele, não a minha. Sempre.
Eu subi as escadas para me trocar e colocar alguma coisa mais confortável. Eu empurrei a porta do meu quarto e dei três passos antes de parar. As gavetas da minha cômoda foram arrancadas, roupas espalhadas pelo chão. A cama estava destroçada. As portas do guarda-roupa estavam abertas, penduradas tortas pelas dobradiças. Livros e porta-retratos espalhados pelo chão.
Eu vi o reflexo de um movimento na janela do outro lado do cômodo e me virei. Ele estava em pé, encostado na parede atrás de mim, vestido dos pés a cabeça de preto e usando a máscara de esqui. Meu cérebro estava em um turbilhão enevoado, começando a transmitir corra! para as minhas pernas, quando ele foi para a janela, escancarou-a e agilmente pulou para fora.
Eu desci três degraus de cada vez, atirei-me ao redor do corrimão, voei do corredor para a cozinha e liguei 911.
Quinze minutos depois um carro da polícia esbarrou na calçada. Tremendo, eu destranquei a porta e deixei os dois policiais entrarem. O primeiro policial a entrar era baixo, cintura grossa e com o cabelo parcialmente preto e cinza. O outro era alto, magro com os cabelos quase tão escuros quanto os do Patch, mas aparado em cima da orelha. De um jeito estranho ele vagamente se assemelhava ao Patch. Compleição mediterrânea, face simétrica, olhos puxados.
Eles se apresentaram; o policial de cabelo escuro era o Detetive Basso. Seu parceiro era o Detetive Holstijic.
“Você é a ?” O Detetive Holstijic perguntou.
Eu confirmei com um aceno de cabeça.
“Seus pais estão em casa?”
“Minha mãe saiu alguns minutos antes de eu ligar para o 911.”
“Então você está em casa sozinha?”
Outro aceno de cabeça.
“Por que você não nos conta o que aconteceu?” ele perguntou, cruzando seus braços e aumentando sua base de sustentação, enquanto o Detetive Basso dava alguns passos pela casa dando uma olhada ao redor.
“Eu cheguei as oito e fiz um pouco de dever de casa,” eu disse. “Quando eu subi para meu quarto, eu o vi. Estava tudo bagunçado. Ele detonou meu quarto.”
“Você o reconheceu?”
“Ele estava usando uma máscara de esqui. E as luzes estavam apagadas.”
“Alguma marca distinta? Tatuagens?”
“Não.”
“Altura? Peso?”
Eu procurei, com relutância, na minha memória de curto prazo. Eu não queria reviver o momento, mas era importante que eu lembrasse qualquer pista. “Peso médio, mas um pouquinho alto. Quase do mesmo tamanho do Detetive Basso.”
“Ele disse alguma coisa?”
Eu chocalhei a cabeça.
O Detetive Basso reapareceu e disse, “Tudo limpo,” para seu parceiro. Então ele subiu para o segundo andar. O assoalho rangia com o sobrepeso conforme ele passava pelo corredor, abrindo e fechando as portas.
O Detetive Holstijic abaixou para examinar a fechadura da porta da sala. “A porta estava destrancada ou estragada quando você chegou em casa?”
“Não. Eu usei minha chave para entrar. Minha mãe estava dormindo na sala.”
O Detetive Basso apareceu no alto da escada.
“Você pode nos mostrar o que está estragado?” ele me perguntou.
Eu e o Detetive Holstijic subimos as escadas juntos e eu indiquei o caminho pelo corredor para onde o Detetive Basso estava em pé bem na porta do meu quarto com suas mãos em seus quadris, inspecionando meu quarto.
Eu fiquei completamente parada, um formigamento de medo rastejou por mim. Minha cama estava feita. Meus pijamas estavam em cima do meu travesseiro, bem do jeitinho que eu os tinha deixado hoje de manhã. As gavetas da minha cômoda estavam fechadas, com os porta-retratos arrumados em cima. O baú que fica no pé da minha cama estava fechado. O chão estava limpo. As cortinas penduradas na janela, painéis lisos, um de cada lado da janela fechada.
“Você disse que viu o intruso,” o Detetive Basso disse. Ele estava olhando para mim com o olhar duro que não perdia nada. Olhos que eram especialistas em filtrar mentira.
Eu dei um passo para dentro do quarto, mas faltava o toque familiar de conforto e segurança. Havia uma nota de violação e ameaça. Eu apontei para a
janela do outro lado do quarto, tentando manter minha mão firme. “Quando eu entrei, ele pulou pela janela.”
O Detetive Basso olhou para fora da janela. “Uma longa jornada até o chão,” ele observou. Ele tentou abrir a janela. “Você a trancou depois que ele pulou?”
“Não, eu corri para o andar de baixo e liguei para o 911.”
“Alguém trancou.” O Detetive Basso ainda estava me olhando com olhos cortantes, sua boca era uma linha fina.
“Não tenho certeza se alguém seria capaz de escapar depois de um pulo desses,” o Detetive Holstijic disse, juntando-se ao seu parceiro perto da janela. “Teria sorte se escapasse com uma perna quebrada.”
“Talvez ele não tenha pulado, talvez ele tenha descido pela árvore,” eu disse.
O Detetive Basso virou sua cabeça ao redor. “Bem? Esta? Ele escalou ou pulou? Ele poderia ter te empurrado ao passar por você e sair pela porta da frente. Esta seria a opção lógica. É isso que eu teria feito. Eu vou perguntar mais uma vez. Pense com muito cuidado. Você realmente viu alguém no seu quarto esta noite?”
Ele não acreditava em mim. Ele achava que eu tinha inventado. Por um momento eu fiquei tentada a pensar a mesma coisa. O que há de errado comigo? Por que a minha realidade estava torcida? Por que a realidade nunca batia? Para minha própria sanidade eu disse a mim mesma que não era eu. Era ele. O cara com a máscara de esqui. Ele estava fazendo isso. Eu não sabia como, mas a culpa era dele. O Detetive Holstijic quebrou o silêncio tenso dizendo, “Quando seus pais chegam em casa?”
“Eu moro com minha mãe. Ela teve que dar uma passadinha no escritório.”
“Nós precisamos te perguntar mais algumas coisas,” ele continuou. Ele apontou para eu sentar na minha cama, mas eu balancei a cabeça entorpecida. “Recentemente você terminou com um namorado?”
“Não.”
“E drogas? Você tem um problema com drogas, agora ou no passado?”
Não.”
“Você mencionou que vive com sua mãe. E seu pai? Onde ele está?”
“Isso foi um engano,” eu disse. “Sinto muito. Eu não deveria ter ligado.”
Os dois detetives trocaram olhares. O Detetive Holstijic fechou os olhos e massageou os cantos internos. O Detetive Basso parecia que já tinha perdido tempo demais e estava pronto para ir embora.
“Nós temos coisas para fazer,” ele disse. “Você vai ficar bem sozinha aqui até sua mãe voltar?”
Eu mal o ouvi; eu não conseguia tirar os olhos da janela. Como ele tinha feito isso? Quinze minutos. Ele teve quinze minutos para dar um jeito de voltar para dentro e colocar o quarto em ordem antes da polícia chegar. E comigo no andar de baixo o tempo todo. Ao perceber que estive sozinha com ele na casa, eu estremeci.
O Detetive Holstijic estendeu seu cartão de trabalho. “Sua mãe poderia nos telefonar quando ela chegar?”
“Nos vemos por aí,” o Detetive Basso disse. Ele já estava no meio do corredor. 

Capítulo Quinze

“Você acha que Elliot matou alguém?”
“Shhhh!,” eu alertei , olhando pelas mesas de laboratório para assegurar que ninguém estava entreouvindo.
“Sem ofensa, querida, mas isso está começando a ficar ridículo. Primeiro ele me atacou. Agora ele é um assassino. Foi mal, mas Elliot? Um assassino? Ele é, tipo, o cara mais simpático que eu já conheci. Quando foi a última vez que ele esqueceu de segurar a porta para você passar? Ah, sim, é verdade... nunca.”
e eu estávamos na aula de biologia, e estava de cabeça baixa em uma mesa. Nós tínhamos que analisar a pressão sanguínea do pulso do nosso parceiro, e supostamente deveria estar descansando silenciosamente por cinco minutos. Normalmente eu estaria trabalhando com Patch, mas o Treinador havia nos dado um dia livre, o que significava que estávamos livres para escolher nossos próprios parceiros. e eu estávamos no fundo da sala; Patch estava trabalhando com um garoto chamado Thomas Rookery na frente da sala.
“Ele foi interrogado como suspeito em uma investigação criminal,” eu sussurrei, sentindo os olhos do Treinador pairarem em cima de nós. Eu fiz algumas notas no meu caderno de biologia. O objeto está calmo e relaxado. O objeto já parou de falar há cerca de três minutos e meio. “A polícia obviamente pensou que ele tinha motivos.”
“Você tem certeza que é o mesmo Elliot?”
“Quantos Elliot Saunderer's você acha que estudavam no Kinghorn em Fevereiro?”
passou seus dedos pelo estômago. “É que é realmente muito, muito difícil de acreditar. E aliás, e daí se ele foi interrogado? O importante é que ele foi absolvido. Eles não o declararam culpado.”
“Porque a polícia achou uma carta de suicídio no apartamento da Halverson.”
“E que é mesmo a Halverson?”
“Kjirsten Halverson,” eu disse impacientemente. “A garota que supostamente se enforcou.”
“Talvez ela tenha mesmo se enforcado. Quero dizer, e se um dia ela disse, 'Hey, a vida é uma droga', e pulou de uma árvore com uma corda no pescoço? Isso acontece.”
“Você não acha uma coincidência muito grande o apartamento dela ter mostrado evidências de arrombamento quando a carta foi encontrada?”
“Ela morava em Portland. Arrombamentos acontecem.”
“Eu acho que alguém a colocou lá. Alguém que queria Elliot longe de suspeitas.”
“Quem iria querer Elliot longe de suspeitas?”, perguntou.
Eu dei a ela o meu melhor olhar duh.
se sentou reta com a ajuda de seu cotovelo bom. “Então você está dizendo que Elliot levou Kjirsten até uma árvore, amarrou uma corda em seu pescoço, jogou ela lá de cima, depois invadiu o apartamento dela e colocou uma carta falsa de suicídio que provava que ela mesma tinha se matado.”
“Por que não?”
retornou o olhar duh. “Porque os policiais já analisaram tudo. Se eles dizem que foi um suicídio, eu acredito.”
“E que tal isso,” eu disse. “Algumas semanas depois de Elliot ser absolvido, ele se transferiu de escola. Por que alguém iria sair de Kinghorn Prep para estudar no CHS?”
“Você tem um ponto aí.”
“Acho que ele está tentando escapar do passado. Acho que ficou muito desconfortável estudar no mesmo campus onde ele matou Kjirsten. Ele está com a consciência pesada.” Eu encostei meu lápis nos lábios. “Eu preciso ir ao Kinghorn Prep e fazer algumas perguntas. Ela morreu há apenas dois meses; todo mundo ainda deve estar fofocando sobre isso.”
“Eu não sei, . Eu estou sentindo vibrações ruins quanto a iniciar uma operação de espionagem no Kinghorn. Quero dizer, você vai perguntar sobre Elliot, especificamente? E se ele descobrir? O que ele vai pensar?”
Eu a olhei. “Ele só tem algo com o que se preocupar se ele for realmente culpado.”
“E depois ele vai matar você para silenciá-la.” deu um sorriso igual ao do gato Cheshire34. Eu não. “Eu quero descobrir quem me atacou tanto quanto você,” ela continuou com uma nota mais séria na voz, “mas eu juro pela minha vida que não foi o Elliot. Eu repassei essa cena na memória, tipo, umas cem vezes. Não combina. Nem chega perto. Confie em mim.”

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34 Cheshire cat é o gato de “Alice no país das maravilhas”.
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“Ok, talvez Elliot não atacou você,” eu disse, tentando satisfazer , mas não querendo limpar o nome de Elliot. “Ele ainda tem muitas coisas contra ele. A) ele estava envolvido em uma investigação de assassinato, B) ele é quase simpático demais – é assustador – e C) ele é amigo de Jules.”
franziu o cenho. “Jules? O que há de errado com Jules?”
“Você não acha estranho que toda vez que estamos com eles, Jules vai embora?”
“O que você quer dizer com isso?”
“Na noite em que fomos para Delphic, Jules foi embora quase que imediatamente para usar o banheiro. Ele alguma hora voltou? Depois que eu fui comprar o algodão doce, Elliot o encontrou?”
“Não, mas eu aposto em problemas intestinais.”
“Então, ontem à noite, ele misteriosamente ficou doente.” Eu esfreguei a borracha da ponta do meu lápis no nariz, pensando. “Ele parece ficar doente frequentemente.”
“Eu acho que você está exagerando. Talvez... talvez ele tenha SIF.”
“SIF?”
“A Síndrome do Intestino Frágil.”
Eu descartei a sugestão de para vasculhar a minha mente à procura de uma resposta aceitável. Kinghorn Prep ficava a uma hora de distância de carro. Se a escola era tão rigorosa como Elliot dissera que era, como Jules conseguia tempo para vir a Coldwater visitá-lo? Eu o via toda as manhãs antes da escola no Enzo's Bistro com Elliot. Ainda mais, ele sempre dá uma carona a Elliot depois da escola. Era quase como se Elliot tivesse Jules na palma da mão.
Mas isso não era tudo. Eu esfreguei a borracha com mais força na ponta do nariz. O que eu estava deixando passar?
“Por que Elliot mataria Kjirsten?” Eu me perguntei em voz alta. “Talvez ela o tenha visto fazendo algo ilegal, e ele a matou para silenciá-la.”
soltou um suspiro. “Isso está começando a ir à terra do Isso Absolutamente Não Faz Sentindo Algum.”
“Há algo mais. Algo que nós não estamos vendo.”
me olhou como se a minha lógica estivesse passando as férias em outro planeta. “Pessoalmente, eu acho que você está vendo até demais. Isso está começando a se parecer com uma caça às bruxas.”
E então de repente eu soube o que eu estava deixando passar. Isso estava me incomodando o dia todo, chamando do fundo da minha mente, mas eu estava muito concentrada em todo o resto para prestar atenção. O Detetive Basso havia me perguntando se havia algo faltando. E só agora eu notei que havia, sim, algo faltando. Eu deixei o artigo sobre Elliot no topo da minha penteadeira ontem à noite. Mas esta manhã – eu consultei minha memória para ter certeza –, o artigo tinha sumido. Simplesmente sumido.
“Aimeudeus,” eu disse. “Elliot invadiu a minha casa ontem à noite. Foi ele! Ele roubou o artigo.” Desde que o artigo estava em primeiro plano, era óbvio que Elliot havia revirado o meu quarto de cabeça para baixo para me aterrorizar – possivelmente como punição por eu ter encontrado o artigo, em primeiro lugar.
“Espera, o quê?”, disse.
“O que foi?”, perguntou o Treinador, parando ao meu lado.
“É, o que foi?” ecoou. Ela apontou e riu de mim por trás das costas do Treinador.
“Hm – o objeto não aparenta ter pulsação,” eu disse, dando um beliscão forte no pulso de .
Enquanto o Treinador verificava o pulso de , ela fingiu estar desmaiando e se abanou. O Treinador capturou os meus olhos com os dele, olhando-me sobre os óculos. “Bem aqui, . Batendo alto e forte. Tem certeza que o objeto não fez nenhum movimento, incluindo falar, durante os cinco minutos inteiros? O pulso não está tão lento quanto eu teria esperado.”
“O objeto não concorda com a parte do não-falar,” se intrometeu. “E o objeto não consegue descansar sobre uma mesa tão dura. O objeto gostaria de propor uma troca de lugares para ser o novo objeto.”
usou sua mão direita para me afastar e se sentar no meu lugar.
“Não me faça mudar de ideia quanto a deixar vocês escolherem seus próprios parceiros,” o Treinador nos disse.
“Não me faça mudar de ideia quanto a vir à escola,” disse docemente.
O Treinador lançou a ela um olhar de advertência, e então pegou meu caderno de anotações, seus olhos correndo pela página completamente branca.
“O objeto compara laboratórios de biologia com overdose de sedativos,” disse.
O Treinador deu um assobio alto, e todos os olhos na classe se viraram para nós.
“Patch?”, ele disse. “Importa-se em vir aqui? Parece que nós estamos tendo um problema com parceiros de laboratório.”
“Eu estava só brincando, disse rapidamente. “Aqui – eu faço a experiência.”
“Você deveria ter pensado nisso quinze minutos atrás,” o Treinador disse.
“Por favor, me perdoe?”, ela pediu, batendo os cílios de forma angelical.
O Treinador colocou o caderno dela debaixo de seu braço bom. “Não.”
Desculpe!, fez com os lábios por sobre o ombro enquanto andava relutantemente para a frente da sala.
Um momento depois Patch sentou-se na mesa ao meu lado. Ele juntou as mãos preguiçosamente entre os joelhos e manteve um olhar firme sobre mim.
“O quê?”, eu disse, sentindo-me nervosa sob o peso de seu olhar.
Ele sorriu. “Eu estava me lembrando dos saltos de tubarão. Ontem à noite.”
Eu senti o usual peso no estômago que Patch sempre me fazia sentir, e como sempre, não consegui distinguir se era uma coisa boa ou ruim.
“Como foi a sua noite?”, eu perguntei, minha voz cuidadosamente neutra enquanto eu tentava quebrar o gelo. Minhas aventuras de espionagem ainda jaziam desconfortavelmente entre nós.
“Interessante. A sua?”
“Não muito.”
“O dever de casa foi brutal, hein?”
Ele estava gozando de mim. “Eu não fiz o dever de casa.”
Ele tinha o sorriso de uma raposa. “Quem você fez?35

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35 Nesse caso, o Patch quis insinuar que se agarrou com alguém ou coisas assim hihi
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Eu fiquei sem fala por um momento. Eu fiquei ali com minha boca entreaberta. “Isso foi alguma insinuação?”
“Só curioso com qual é a minha competição.”
“Cresça.”
O seu sorriso se alargou. “Relaxe.”
“Eu já estou andando em gelo fino com o Treinador, então me faça um favor e vamos nos concentrar na experiência. Eu não estou no humor de brincar, então, se você não se importa...”, eu lancei um olhar severo para a mesa.
“Não posso,” ele disse. “Eu não tenho coração.”
Eu disse a mim mesma que ele não estava sendo literal.
Eu me relaxei na cadeira e pousei minhas mãos sobre o estômago. “Avise-me quando os cinco minutos tiverem se passado.” Eu fechei os olhos, preferindo não ter que olhar os olhos de Patch me observando.
Alguns minutos depois eu abri uma fresta do meu olho.
“Acabou o tempo,” disse Patch.
Eu levantei meu pulso para que ele tirasse a pulsação. Patch pegou minha mão, e uma onda de calor subiu pelo meu braço e terminou com um aperto no estômago.
“O pulso do objeto aumentou com o contato,” ele disse.
“Não escreva isso.” Eu deveria soar indignada. Na verdade, soou como se eu estivesse lutando com um sorriso.
“O Treinador quer que sejamos honestos.”
“O que você quer?”, eu perguntei.
Os olhos de Patch se conectaram aos meus. No fundo ele estava sorrindo. Eu sabia disso.
“Com exceção, você sabe, daquilo,” eu disse.
Depois da escola eu fui ao escritório da Senhorita Greene para a nossa sessão. No final das aulas, Dr. Hendrickson sempre mantinha sua porta entreaberta, um convite implícito para os alunos entrarem. Sempre que eu passava por esse lado do corredor agora, a Senhorita Greene mantinha sua porta fechada. Completamente.
O Não Perturbe estava implícito.
,” ela disse, abrindo a porta assim que eu bati, “por favor, entre. Sente-se.”
Seu escritório estava cheio de coisas e decorado hoje. Ela havia trazido várias plantas, e um painel com pinturas de plantas decorado estava pendurado na parede atrás de sua mesa.
A Senhorita Greene disse, “Eu venho pensando muito sobre o que você disse semana passada. Eu cheguei à conclusão óbvia que o nosso relacionamento precisa ser construído sobre respeito e confiança. Não vamos mais discutir sobre o seu pai, a não ser que seja preciso.”
“Ok,” eu disse cautelosamente. Sobre o que nós íamos conversar?
“Eu ouvi algumas notícias decepcionantes,” ela disse. Seu sorriso desapareceu e ela se aproximou, descansando seus cotovelos sobre a mesa. Ela segurava uma caneta, e a rolava entre as palmas das mãos. “Eu não quero invadir a sua vida pessoal, , mas eu achei que eu havia sido perfeitamente clara quanto à minha preocupação com o seu envolvimento com Patch.”
Eu não tinha muita certeza sobre aonde isso ia dar. “Eu não tenho dado aulas a ele.” E, realmente, isso tinha algo a ver com o trabalho dela?
“Sábado à noite Patch lhe deu uma carona para casa de Delphic Seaport. E você o convidou para entrar.”
Eu lutei para abafar um arfar. “Como você sabe sobre isso?”
“Parte do meu trabalho como psicóloga é guiá-la,” Senhorita Greene disse. “Por favor, prometa que vai tomar muito cuidado quando estiver perto de Patch.” Ela me olhou como se estivesse esperando por meu juramento sagrado.
“É meio complicado,” eu disse. “Minha carona me deixou presa em Delphic. Eu não tive escolha. Não é como se eu procurasse oportunidades para passar mais tempo com Patch.” Bem, exceto por ontem à noite no Borderline. Em
minha defesa, eu honestamente não esperava ver Patch. Ele deveria ter tido sua noite de folga.
“Fico muito feliz em ouvir isso,” Senhorita Greene respondeu, mas ela não parecia muito convencida da minha inocência. “Tirando isso, há mais alguma coisa que você gostaria de discutir hoje? Qualquer coisa que esteja presa na sua mente?”
Eu não ia contar que Elliot havia invadido minha casa. Eu não confiava na Senhorita Greene. Eu não podia meter meu dedo no meio, mas algo nela me incomodava. E eu não gostava do jeito que ela continuava insistindo que Patch era perigoso e não me contava o por quê. Era quase como se ela tivesse uma agenda de espionagem.
Eu tirei minha mochila do chão e abri a porta. “Não”, eu disse. 

Capítulo Dezasseis

estava encostada no meu armário, rabiscando no seu personagem com um marcador roxo.
“Oi,” ela disse quando não havia mais nada no corredor entre nós.
“Onde você esteve? Eu chequei o laboratório do eZine e a biblioteca.”
“Eu tive uma reunião com a Srta. Greene, a nova psicóloga da escola.” Eu disse muito normalmente, mas por dentro, eu tinha um sentimento oco e trêmulo. Eu não conseguia parar de pensar no Elliot invadindo a minha casa. O que o impediria de fazer isso novamente? Ou de fazer alguma coisa pior?
“O que aconteceu?” a perguntou.
Eu girei a combinação do meu armário e tirei os livros. “Você sabe quanto um alarme bom custa?”
“Sem ofensas, babe, mas ninguém vai roubar seu carro.”
Eu atirei um olhar negro para a . “É para minha casa. Eu quero ter certeza que o Elliot não entre novamente.”
olhou em volta e limpou sua garganta.
“O que?” eu disse.
levantou as mãos. “Nada. Nadinha mesmo. Se você ainda está empenhada em jogar isso no Elliot... Esta é a sua prerrogativa. É uma prerrogativa louca, mas hey, é sua.”
Eu bati a porta do meu armário para fechar e o barulho ecoou pelo corredor. Eu engoli uma resposta acusadora que de todas as pessoas ela deveria acreditar em mim e no lugar disso eu disse, “Estou indo para a biblioteca, estou meio que com pressa.”
Nós saímos do prédio e cruzamos a área em direção ao estacionamento e eu fiz isso brevemente. Eu olhei em volta procurando o Fiat, mas foi quando eu me lembrei que mamãe tinha me deixado a caminho do trabalho essa manhã. E com o braço quebrado da , ela não estava dirigindo.
“Droga,” a disse, lendo meus pensamentos, “estamos sem carro.”
Protegendo meus olhos do sol, eu olhei para a rua. “Acho que isso significa que temos que caminhar.”
“Nós não. Você. Eu iria, mas uma vez por semana é meu limite para biblioteca.”
“Você não foi à biblioteca essa semana,” eu apontei.
“Yeah, mas talvez eu tenha que ir amanhã.”
“Amanhã é quinta-feira. Em toda sua vida, você já estudou de quinta-feira?”
colocou o dedo nos lábios e fez uma expressão pensativa. “Alguma vez eu já estudei de quarta-feira?”
“Não que eu me lembre.”
“Então é isso. Eu não posso ir. Seria ir contra uma tradição.”
Trinta minutos depois eu subi as escadas indo para a porta principal da biblioteca. Uma vez lá dentro, eu coloquei meu dever de casa embaixo de uma luminária e fui direto para o laboratório de mídia, onde eu vasculhei pela internet tentando encontrar mais informações sobre o ‘Enforcamento em Kinghorn’. Eu não achei muita coisa. Inicialmente havia sido muito comentado, mas depois que o bilhete de suicídio foi descoberto e o Elliot foi solto, as notícias mudaram.
Era hora de viajar para Portland. Eu não ia aprender muito mais peneirando artigos e notícias arquivadas, mas talvez eu tivesse mais sorte dando uma voltinha por lá.
Eu saí da internet e liguei para minha mãe.
“Eu preciso estar em casa as nove hoje?”
“Sim, por quê?”
“Eu estava pensando em tomar um ônibus até Portland.”
Ela me lançou uma de suas risadas do tipo você deve achar que sou louca.
“Eu preciso entrevistar alguns estudantes na Kinghorn Preparatória,” eu disse. “É para um projeto que tenho feito pesquisas.” Não era uma mentira. Não de verdade. Claro que teria sido muito mais fácil para justificar se eu não tivesse queimada pela culpa de esconder dela uma invasão e subsequentemente a visita da polícia. Eu pensei em dizer a ela, mas toda vez que eu abria minha boca para dizer as palavras, elas escapavam. Estamos lutando para sobreviver. Precisamos da renda da mamãe. Se eu falasse para ela sobre o Elliot, ela se demitiria imediatamente.
“Você não pode ir para a cidade sozinha. É uma escola noturna e em breve estará escuro. Além do mais, quando você chegar lá, os estudantes já terão saído.”
Eu suspirei. “Ok, estarei em casa em breve.”
“Eu sei que prometi uma carona pra você, mas estou presa no escritório.” Escutei ela remexer nos papéis e imaginei se ela tinha o telefone preso no queixo e o fio enrolado no seu corpo várias vezes. “Seria muito pedir para você caminhar?”
A temperatura só estava um pouquinho baixa, eu tinha minha jaqueta e duas pernas. Eu podia caminhar. O plano parecia muito mais razoável na minha
cabeça, porque o pensamento de caminhar até em casa me deixava oca por dentro. Mas deixando de lado a possibilidade de passar a noite na biblioteca, eu não via outra escolha.
Eu tinha quase passado pelas portas da biblioteca quando ouvi meu nome. Eu me virei e vi a Marcie Millar diminuindo a distância entre nós.
“Eu ouvi sobre a ,” ela disse. “É realmente triste. Quero dizer, quem a atacaria? A menos que, você sabe, eles não pudessem evitar. Talvez tenha sido em auto defesa. Ouvi dizer que estava escuro e chovendo. Seria fácil confundir a com um alce. Um urso, ou um búfalo. Sério, qualquer animal pesado serviria.”
“Gosh, é bom conversar com você, mas tem muitas coisas que prefiro fazer. Como por exemplo, prender minha mão no dispositivo de lixo.” Eu continuei andando para a saída.
“Espero que ela esteja desintoxicada da comida do hospital,” Marcie disse, ainda atrás de mim. “Eu ouvi dizer que elas são ricas em gordura. Ela não pode continuar a ganhar muito peso.”
Eu dei um giro. “Chega. Mais uma palavra e eu vou…” Nós duas sabíamos que esse era um trato vazio.
Marcie deu um sorrisinho. “Você vai o que?”
“Vadia,” eu disse.
“Geek36.”


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36 Geek é uma expressão idiomática da língua inglesa, uma “gíria” que define pessoas peculiares ou excêntricas obcecadas com tecnologia, eletrônica, jogos eletrônicos ou de tabuleiro etc.
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“Cadela.”
“Aberração.”
“Porca anoréxica.”
“Wow,” Marcie disse, inclinando-se para trás melodramaticamente com a mão no coração. “Eu deveria supostamente estar ofendida? Avalie essa ideia. Isso é notícia velha. Pelo menos eu sei como exercitar um pouco de autocontrole.”
O segurança em pé perto da porta limpou sua garganta. “Certo, parem com isso. Vão para fora ou eu vou colocar as duas no meu escritório e ligar para os pais de vocês.”
“Fale com ela,” Marcie disse, apontando um dedo para mim. “Eu sou aquela que está tentando ser legal. Ela me atacou verbalmente. Eu estava apenas oferecendo minhas condolências à amiga dela.”
“Eu disse lá fora.”
“Você fica bem de uniforme,” Marcie disse a ele, dando um sorriso tóxico, sua marca registada.
Ele apontou para a porta com a cabeça. “Saiam daqui.” Mas não soou metade rude.
Marcie andou casualmente para a porta. “Importa-se em segurar a porta para mim? Minhas mãos são pequenas.” Ela estava segurando um livro. Um brochura.
O guarda empurrou o botão para pessoas deficientes e as portas automaticamente se abriram.
“Obrigada por isso,” Marcie disse, jogando um beijo para ele.
Eu não a segui. Eu não sabia o que aconteceria se eu o fizesse, mas eu estava cheia de emoções negativas que eu só poderia fazer coisas que me arrependeria. Ela chamar meu nome e a briga estava abaixo de mim. A menos que eu estivesse lidando coma Marcie Millar.
Eu me virei e voltei para a biblioteca. Para o elevador, eu entrei na gaiola de metal e apertei o botão do andar subterrâneo. Eu poderia ter esperado alguns minutos a Marcie ir embora, mas eu conhecia outro caminho e resolvi ir por ele. Cinco anos atrás a cidade tinha aprovado a mudança da biblioteca pública para um prédio histórico bem no centro da Cidade Antiga Coldwater. O tijolo vermelho datava de 1850 e o prédio era completo com uma romântica cúpula e uma widow’s walk37 para ver os navios vindo do mar. Infelizmente, não havia estacionamento no prédio, então um túnel subterrâneo foi cavado para ligar a biblioteca com o estacionamento subterrâneo do tribunal do outro lado da rua. Agora a garagem servia aos dois prédios.

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37 É uma plataforma no teto do edifício cercada e geralmente tem uma cúpula. Não sei em português como seria o nome disso, segue o link para uma foto: http://en.wikipedia.org/wiki/File:Widows_Walk_Gaithersburg.jpg
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O elevador chiou para parar e eu saí. O túnel era repleto de luzes fluorescentes que cintilava um roxo pálido. Levei um tempo para forçar meus pés andarem. Fui atingida pelo pensamento repentino do meu pai na noite que ele foi morto. Eu me perguntava se ele estava em uma rua remota e escura como o túnel à frente.
Pare com isso, eu disse para mim mesma. Foi um ataque de violência aleatório. Você passou o último ano com paranóia de qualquer beco escuro, quarto escuro, cubículo escuro. Você não pode viver o resto da sua vida com medo de colocarem uma arma em você.
Determinada a provar que o medo estava na minha cabeça, eu andei pelo túnel, ouvindo a leve batida dos meus sapatos no concreto. Mudando minha mochila para o ombro esquerdo, eu calculei quanto tempo levaria para caminhar até em casa e, querendo ou não, eu estava pronta para tomar o atalho pelo trilho do trem agora que estava escurecendo. Esperava que se eu mantivesse meus pensamentos ocupados e otimistas, eu não teria tempo para me concentrar no meu crescente senso de alarme.
O túnel acabou e uma forma escura estava parada bem à frente.
Eu parei o passo no meio e meu coração diminuiu algumas batidas. Patch estava usando uma camiseta preta, jeans surrado, botas com ponteira de aço. Seus olhos pareciam dizer que ele não seguia as regras. Seu sorriso era muito astuto para oferecer conforto.
“O que você está fazendo aqui?” eu perguntei, tirando um punhado de cabelo do meu rosto e olhando além dele para um carro parado acima do solo. Eu sabia que estava bem em frente, mas diversas lâmpadas fluorescentes estavam queimadas, dificultando ver claramente. Se, estupro, assassinato, ou qualquer outra atividade vil estivesse na mente do Patch, ele me encurralou no lugar perfeito.
Enquanto o Patch se movia na minha direção, eu andava para trás. Eu vi minha chance e fui em direção ao carro. Tropeçando em volta, ficando do lado oposto do Patch, com o carro entre nós.
Patch olhou para mim por cima do carro. Suas sobrancelhas ergueram.
“Eu tenho perguntas,” eu disse. “Muitas.”
“Sobre?”
“Sobre tudo.”
Sua boca torceu e eu tinha certeza que ele estava tentando não sorrir. “E se minhas respostas não machucarem, você vai dar um tempo nisso?” Ele fez um gesto em direção à saída da garagem.
Esse era o plano. Mais ou menos. Tirando alguns grandes problemas, como o fato do Patch ser muito mais rápido que eu.
“Vamos ouvir as perguntas,” ele disse.
“Como você sabia que eu estava na biblioteca esta noite?”
“Pareceu-me um bom palpite.”
Por nenhum momento eu acreditei que o Patch estava aqui por pressentimento. Ele tinha um lado que era quase predatório. Se as forças armadas soubessem dele, fariam de tudo para recrutá-lo.
Patch precipitou-se para a esquerda. Eu contrapus seu movimento, correndo para a traseira do carro. Quando o Patch arremeteu, eu também o fiz. Ele estava na frente do carro e eu estava na traseira.
“Onde você estava domingo a tarde?” eu perguntei. “Você me seguiu enquanto eu fazia compras com a ?” O Patch poderia não ser o cara da máscara de esqui, mas não significa que ele não tivesse envolvido nos recentes acontecimentos perturbadores. Ele estava escondendo alguma coisa de mim. Ele estava escondendo alguma coisa de mim desde o dia que nos encontramos. Era uma coincidência que o último dia normal da minha vida tinha sido antes daquele dia fatídico? Eu acho que não.
“Não. E a propósito, como foi? Comprou alguma coisa?”
“Talvez,” eu disse fora de guarda.
“Como?”
Eu pensei naquele dia. Eu e só tínhamos ido até a Victoria’s Secret. Eu tinha gastado trinta dólares em um sutiã preto rendado, mas eu não ia chegar aí. Em vez disso eu contei sobre a minha tarde, começando com o sentimento de eu estar sendo seguida e acabando comigo encontrando a na calçada, vítima de um assalto.
“Bem?” Eu exigi quando terminei. “Você tem alguma coisa para dizer?”
“Não.”
“Você não tem ideia do que aconteceu com a ?”
“Novamente, não.”
“Eu não acredito em você.”
“Isso é porque você tem problemas de confiança.” Ele espalmou as duas mãos no carro, inclinando no capô. “Já passamos por isso.”
Eu senti meu temperamento faiscar. Patch tinha mudado a conversa de novo. No lugar de iluminar ele, o holofote estava direcionado para mim. Eu não gosto especialmente de ser lembrada que ele sabia todo o tipo de coisa sobre mim. Coisas particulares. Como meu problema de confiança.
Patch andou repentinamente para o sentido horário. Eu corri dele, parando quando ele o fez. Quando estávamos parados novamente, seus olhos prenderam os meus, quase como se ele estivesse tentando descobrir qual seria meu próximo movimento para fugir dele.
“O que aconteceu no Archangel? Você me salvou?” eu perguntei.
“Se eu tivesse te salvado, não estaríamos aqui tendo essa conversa.”
“Você quis dizer se você não tivesse me salvado não estaríamos aqui. Eu estaria morta.”
“Não foi isso que eu disse.”
Eu não fazia ideia do que ele quis dizer. “Por que não estaríamos aqui?”
“Você estaria aqui.” Ele pausou. “Eu provavelmente não.”
Antes que eu pudesse descobrir o sobre que ele estava falando, ele se atirou para mim novamente, dessa vez atacando pela direita. Momentaneamente confusa, eu deixei diminuir a distância entre nós. Em vez de parar, Patch contornou o carro. Eu saí correndo direto para a garagem.
Eu tinha passado três carros antes de ele agarrar meu braço. Ele me virou e me apoiou contra uma viga de cimento.
“Tanta coisa por aquele plano,” ele disse.
Eu olhei para ele. Acredito que havia muito pânico por trás disso. Por um instante ele deu um sorriso transbordante com intenções obscuras, confirmando que eu tinha razão para estar suando.
“O que está acontecendo?” eu disse, trabalhando duro para não parecer hostil. “Como eu posso jurar ouvir sua voz na minha cabeça? E por que você disse que veio para escola por minha causa?”
“Eu estava cansado de admirar suas pernas à distância.”
“Eu quero a verdade.” Eu engoli em seco. “Eu mereço toda a revelação.”
“Toda a revelação,” ele repetiu com um sorriso astuto. “Isso tem alguma coisa a ver com a promessa que você fez de me expor? Sobre o que exatamente estamos falando aqui?”
Eu não conseguia me lembrar do que estávamos falando. Tudo que eu sabia era que o olhar do Patch era especialmente quente. Eu tinha que quebrar o contato visual, então eu mandei meus olhos para minhas mãos. Elas estavam cintilantes com o suor e eu as escondi atrás das minhas costas.
“Eu tenho que ir,” eu disse. “Tenho dever de casa.”
“O que aconteceu lá dentro?” Ele indicou os elevadores com o queixo.
“Nada.”
Antes que eu pudesse impedi-lo, ele tinha a palma da minha mão pressionada na dele, formando um campanário com elas. Ele escorregou os dedos entre os meus, me prendendo a ele. “Suas articulações são brancas,” ele disse, roçando sua boca nelas. “E você saiu parecendo possessa.”
“Me solta. E eu não estava possessa. Não de verdade. Se você me der licença, eu tenho dever de casa –“
.” Patch disse meu nome suavemente, mas ainda com cada intenção de conseguir o que queria.
“Eu tive uma briga com a Marcie Millar.” Eu não fazia ideia de onde a confissão tinha vindo. A última coisa que eu queria era dar ao Patch outra janela para dentro de mim. “Ok?” Eu disse, com uma nota de exasperação na minha voz. “Satisfeito? Você pode, por favor, me deixar ir agora?”
“Marcie Millar?”
Eu tentei soltar meus dedos, mas Patch tinha uma ideia diferente.
“Você não conhece a Marcie?” Eu disse cinicamente. “Difícil de acreditar, considerando que um: você cursa o Colégio Coldwater. E dois: você tem um cromossomo Y.”
“Conte-me sobre a briga,” ele disse.
“Ela chamou a de gorda.”
“E?”
“Eu a chamei de porca anoréxica.”
Parecia que o Patch estava tentando não abrir um sorriso. “É isso? Sem socos? Sem mordidas, apertões e puxões de cabelo?”
Eu estreitei um olhar para ele.
“Vamos ter que te ensinar a lutar, Anjo?”
“Eu posso lutar.” Eu ergui meu queixo apesar da mentira.
Desta vez ele não se importou em segurar um sorriso.
“Na verdade, eu tenho aulas de boxe.” Kickboxing. No ginásio. Uma vez.
Patch ergueu suas mãos como um alvo. “Dê-me um soco. O mais forte que conseguir.”
“Eu – não sou fã de violência desnecessária.”
“Estamos sozinhos aqui.” As botas do Patch estavam niveladas com a ponta dos meus sapatos. “Em cara como eu poderia tirar vantagem de uma garota como você. Melhor me mostrar o que você consegue.”
Eu andei para trás e a moto preta do Patch entrou no meu campo de visão.
“Deixe-me te dar uma carona,” ele ofereceu.
“Eu vou caminhar.”
“Está tarde e escuro.”
Ele tinha razão. Eu gostando ou não.
Mas internamente eu tinha sido colocada a força num jogo de cabo-de-guerra. Em primeiro lugar eu tinha sido idiota em ir andando para casa e agora eu estava presa entre duas decisões ruins: carona com o Patch, ou o risco de ter alguém pior por aí.
“Estou começando a pensar que a única razão para você continuar a me oferecer uma carona é porque você sabe que eu não sou apaixonado por essa coisa.” Eu soltei um suspiro nervoso, eu enfiei o capacete e montei atrás dele. Não era minha culpa que eu estava pertinho dele. O assento não era exatamente espaçoso.
Patch fez um som baixinho de diversão. “Eu posso pensar em algumas outras razões.”
Ele acelerou pela garagem, indo em direção a saída. Uma cancela automática branca e vermelha barrava a saída. Eu estava me perguntando se o Patch diminuiria a velocidade o suficiente para colocar o dinheiro na máquina, quando ele desacelerou a moto, me jogou para mais próximo dele. Ele colocou o dinheiro na máquina e acelerou a moto para a saída.
Patch guiou sua moto para a entrada da minha garagem e eu segurei nele para manter meu equilíbrio enquanto eu descia. Eu devolvi o capacete.
“Obrigada pela carona,” eu disse.
“O que você vai fazer no sábado a noite?”
Um tempo de pausa. “Eu tenho um encontro com o habitual.”
Isso pareceu acender seu interesse. “O habitual?”
“Lição de casa.”
“Cancele.”
Eu estava me sentindo muito mais relaxada. Patch era quente e sólido e seu cheiro era fantástico. Como hortelã e terra escura. Ninguém tinha pulado em nós na volta para casa e todas as janelas do andar inferior da casa da fazenda brilhavam com a luz. Pela primeira vez durante o dia todo eu me senti segura.
Exceto que o Patch tinha me encurralado em um túnel escuro e estava possivelmente me perseguindo. Talvez não tão segura.
“Eu não saio com estranhos,” eu disse.
“É uma ótima coisa para se fazer. Eu te pego às cinco.” 

Capítulo Dezassete

Houve uma chuva fria durante todo o dia de sábado e eu me sentei perto da janela olhando ela cair sobre a crescente poças de lama no chão. Eu tinha uma velha cópia de Hamlet no meu colo, uma caneta atrás da minha orelha, e um copo vazio de chocolate quente aos meus pés. O documento com as perguntas compreensão de leitura sobre a mesa, estava tão vazio como agora, quando a Sra. Lemon entregou em sala de aula há dois dias. Isso foi ruim. Minha mãe tinha ido para sua aula de ioga há quase trinta minutos, e apesar de eu ter praticado algumas maneiras diferentes de dar a notícia da minha saída com Patch, não cheguei a lugar algum. Eu disse-me que não era algo importante. Eu já tenho dezasseis anos e eu posso decidir quando sair de casa. Perfeito. Agora eu teria que pagar minha culpa a noite toda. Quando o relógio do hall tocou anunciando 4:30, felizmente deixei o livro de lado e corri para o meu quarto. Eu passei quase o dia todo fazendo minha lição de casa e trabalho doméstico, o que tinha mantido os meus pensamentos longe da reunião de hoje à noite. Mas agora que estava no minuto final, os nervos de antecipação superaram tudo. Eu não queria pensar sobre, Patch e eu tínhamos negócios inacabados.
O nosso último beijo foi subitamente cortado. Mais cedo ou mais tarde o nosso beijo seria resolvido. Eu não tinha dúvida de quanto ele queria que se resolvesse, só não me esqueceria de estar pronta para o que quer que aconteça hoje à noite. Além de tudo isso, o aviso de não ajudava em nada já que continuava a aparecer como uma bandeira vermelha em minha mente: “Fique longe de Patch”. Eu estava em pé diante do espelho olhando o que eu usava.
A maquiagem era mínima, reduzido a uma única passada de rímel. O cabelo emaranhado, mas e se estivesse estranho? Passei pouco brilho em meus lábios. Eu lambi meus lábios para os deixar com aparência úmida. Isso me fez pensar mais sobre o meu quase-beijo com Patch, e eu tive um ataque involuntário de calor. Se um quase-beijo poderia fazer isso comigo, eu me perguntava o que poderia acontecer com um beijo “completo”.
Minha reflexão sorriu.
“Não é grande coisa” – disse a mim mesma analisando os meus brincos. O primeiro par era grande, longo e turquesa... e me fez ver como eu estava trabalhando demais. Coloquei-a de lado e tentei novamente com pequenas gotas de opala. Melhor. Fiquei imaginando que Patch tinha em mente. Jantar? Um filme?
“É como uma aula de biologia” – eu disse indiferentemente a minha reflexão. – “Apenas sem a parte de biologia, e da classe”.
Eu coloquei na minha calça jeans e sapatos tubo bailarina. Envolvi um lenço de seda azul céu em volta da minha cintura, por cima do meu tronco. Então eu amarrei por atrás de meu pescoço, deixando a blusa estilo frente única. Eu balancei meu cabelo e depois ouvi batidas na porta.
“Já vou.” Corri para a escada a baixo. Eu verifiquei uma última vez que estive no espelho do corredor, em seguida, abri a porta e encontrei dois homens em casacos pretos na varanda.
.” Disse o detetive Basso, segurando seu distintivo da polícia.
“Nós nos encontramos de novo.” Levei um tempo para encontrar a minha voz.
“O que você está fazendo aqui?” Ele apontou para o lado com a cabeça.
“Você se lembra de meu parceiro Detetive Bait, e se importa se fizermos algumas perguntas?” Isso soava como se estivesse pedindo permissão. De fato, soou quase como um ameaça.
“Sobre o que?” Perguntei, quebrando o meu olhar entre os dois.
“Sua mãe está em casa?” Perguntou o detetive Basso.
“Ela está na yoga. Por quê? O que está acontecendo?” Eles arrastaram os pés e entraram na casa.
“Você pode nos dizer o que aconteceu entre você e Marcie Miller na biblioteca, na tarde de quarta-feira?” Detetive Bait perguntou e se sentou confortável no sofá. Detetive Basso permaneceu de pé, examinando cuidadosamente as fotografias de família sobre a mesa. Suas palavras levaram um momento para serem registadas em meu cérebro. A biblioteca. Na tarde de quarta-feira. Marcie Miller.
“Marcie está bem?” Eu perguntei. Não era nenhum segredo que Marcie não ocupava um espaço uma caloroso e amoroso em meu coração. Mas isso não significa que eu queria vê-la em problemas ou, pior, em perigo.
E, especialmente, não queria que ela parada em qualquer problema que possa me deixar envolvida. O detetive Basso colocou as mãos nos quadris.
“O que faz você pensar que ela não está se sentindo bem?”
“Eu não fiz nada para Marcie.”
“Por que vocês duas estavam discutindo?” - O outro detetive perguntou: - “O guarda me disse que na saída biblioteca as coisas estavam ficando ruim entre vocês”
“Não é assim.”
“Como foi?”
“Nós dissemos algumas coisas uma a outra.” Eu disse, na esperança de explicar.
“Que coisas?”
“Coisas estúpidas,” disse em retrospecto.
“Eu preciso ouvir essas coisas, .”
“Eu a relacionei com suínos anoréxicos.” Meu rosto estava queimado e minha voz saiu humilhada. Se a situação não fosse tão grave, poderia ter desejado fazer algo mais cruel e degradante. Para não falar de algo que fazia mais sentido. Os detetives trocaram olhares.
“Teve uma ameaça?” perguntou Detetive Bait.
“Não.”
“O que você fez após a biblioteca?”
“Vim para casa.”
“Você continuou com a Marcie?”
“Não. Como eu disse. Eu vim para casa. Vão me dizer o que aconteceu com Marcie?”
“Há alguém que possa verificar isso?”, Perguntou o detetive Basso.
“Meu companheiro de biologia. Me encontrou na biblioteca e se ofereceu para me levar para casa.”
Eu tinha um ombro apoiado nas portas que dava para a sala de estar, e o detetive Basso andou e mudou-se para um lado oposto, na minha frente.
“Vamos ouvir o que você diz sobre esse parceiro de Biologia.”
“Que tipo de pergunta é essa?” Ele estendeu as mãos.
“É uma questão bastante básica. Mas se você quiser perguntas mais específicas que posso fazer. Quando eu estava na escola, geralmente oferecia carona para as meninas em que eu estava interessado. Vamos dar um passo além. Qual é o seu relacionamento com seu parceiro... fora da sala de aula de biologia?”
“Você está brincando, certo?” Um lado da boca do detetive Basso ficou rosa.
“Isso é o que eu pensava. Você e seu namorado bateram em Marcie Miller?”
“Marcie foi espancada?”
Ele deixou a porta e se posicionou diretamente em frente de mim.
“Você queria mostrar o que acontece com as meninas quando elas não mantém a boca fechada? Você acha que ela merecia alguns arranhões? Eu conheci meninas como Marcie quando eu estava na escola. Elas merecem não
é? O que Marcie merecia, ? Alguém bateu nela na noite de quarta-feira e eu acho que você sabe mais do que quer admitir.”
Eu estava tentando duramente suprimir os meus pensamentos. Com medo que de alguma forma estes fossem refletidas na minha cara. Talvez tenha sido uma coincidência que na mesma noite em que eu reclamei para Patch sobre Marcie, ela apanhou. Mas da mesma forma, talvez fosse ele... ou não.
“Nós vamos ter de conversar com seu namorado,” disse o detetive Bait.
“Ele não é meu namorado. E meu companheiro de biologia.”
“Ele está vindo para cá agora?” Eu sabia que deveria ser direta. Mas, pensando bem, não podia aceitar que Patch poderia ferir Marcie. Marcie não era o melhor tipo de pessoa e tinha ganhado um monte de inimigos. Alguns desses inimigos talvez fossem capazes de tal brutalidade. Mas Patch não era um deles. A brutalidade sem sentido não era o seu estilo.
“Não,” eu disse. Detetive Basso deu-me um sorriso.
“Se arruma para uma noite em casa?”
“As vezes,” eu disse, com o mais frieza com que me atrevi a responder. O detetive Bait puxou um pequeno caderno de um dos bolsos do casaco. Ele abriu e pegou uma caneta.
“Nós vamos precisar do seu nome e do seu número.”
Dez minutos depois de os detetives terem ido embora, um Jeep Commando preto chegou em minha casa. Patch correu através da chuva para a varanda, vestindo jeans, botas e camisa cinza escuro térmica.
“Carro novo?” Eu perguntei depois que eu abri a porta. Um misterioso sorriso surgiu.
“Eu ganhei ele um par de noites atrás em um jogo de bilhar.”
“Alguém aposta um carro?”
“Ele não estava muito feliz com isso. Estou tentando ficar longe de becos escuros pelos próximos dias.”
“Ouviu falar de Marcie Millar?” Eu falei ali mesmo, esperando que a pergunta o pegasse de surpresa.
“Não. O que aconteceu?” Sua resposta veio fácil e eu decidi que isso provavelmente significava que ele estava dizendo a verdade. Infelizmente, não sabia quando ele estava mentindo, Patch não era qualquer amador.
“Alguém bateu nela.”
“Pena.”
“Qualquer ideia de quem poderia ter feito?” Se Patch ouviu a preocupação em minha voz, não mostrou. Ele encostou na parede e passou a mão pelo queixo, pensativo.
“Não.”
Eu perguntei a mim mesma se eu pensei que ele estava escondendo algo. No entanto, detectar coisas nunca foi meu forte. Eu nunca tive muita experiência em fazer isso. Normalmente eu confiava nas pessoas ao meu redor... normalmente.
Patch estacionou o Jeep por trás da Bo’s Arcade. Quando chegamos à frente da fila, o caixa fixou os olhos em mim e depois em Patch, uma e outra vez, como se tentasse encontrar uma conexão.
“Que é?” Disse Patch, e lançou três bilhetes de entrada sobre a mesa.
O caixa fez o seu olhar penetrante sobre mim. Ele percebeu que eu não conseguia parar de olhar para o molde de tatuagens verdes que cobria cada centímetro de seus braços. Ele moveu um pouco de chiclete? tabaco? Para o outro lado do seu lábio inferior e disse, “Você perdeu alguma coisa?”
“Só gostei de sua tatu –” Comecei. Ele me mostrou os dentes afiados como um cão.
“Eu não acho que ele gostou de mim,” sussurrei para Patch quando estávamos a uma distância segura.
“O Bo não gosta de ninguém.”
“Quem é Bo? Bo do Bo’s Arcade?”
“Este é Bo’s Arcade Junior. Bo pai morreu há vários anos.”
“Como?” Eu perguntei.
“Briga de bar.”
Eu senti uma vontade inquietante de correr na direção do Jeep e sair rapidamente do estacionamento.
“Aqui é seguro?” Eu perguntei.
Patch olhou para os lados. “Anjo.”
“Só perguntei.” A parte debaixo com as mesas de bilhar parecia exatamente como na primeira noite que eu vim. As paredes pretas pintadas de cinza escuro. Mesas vermelhas no meio da sala. Mesas de poker espalhadas ao redor dos cantos. Lâmpadas de luz baixa curvando pelo teto. O cheiro dos cigarros congestionando o fluxo aéreo. Patch escolheu a mesa mais distante da escada. Ele pediu dois refrigerantes 7UP e os destampou na borda da mesa.
“Eu nunca joguei bilhar.” Confessei.
“Escolha um taco.” Ele apontou para o aparador de varas embutido na parede. Eu levantei um e trouxe-o para nossa mesa. Patch passou a mão sobre a boca para sorrir.
“O que?” Eu disse.
“Você não pode marcar um Home Run em bilhar.”
“Sem Home Run. Entendido.” Seu sorriso alargou.
“Você está segurando o taco como um bastão de basebol.” Eu olhei para minhas mãos. Ele estava certo. Eu estava segurando-o como um bastão.
“Assim fica mais confortável.” Ele mudou-se atrás de mim, pôs as mãos nos meus quadris e me posicionou na frente da mesa. Deslizou as mãos em volta de mim e tomou o taco de sinuca.
“Assim...”, disse ele, reorganizando a minha mão direita até a poucos centímetros.
“E... assim,” continuou, levando a minha mão esquerda em um círculo com o polegar e o indicador. Ele então colocou sua mão esquerda sobre a mesa. Como um tripé. Ele empurrou a ponta do taco de bilhar no meio do círculo e sobre a junta do meu dedo médio.
“Dobre sua cintura.” Eu inclinei em direção à mesa de bilhar, seu hálito aquecendo minha garganta. Ele puxou para trás o taco de sinuca e levou-o através do círculo.
“Em que bola quer bater?”, perguntou, referindo-se ao triângulo de bolas acomodados no final da mesa. “O amarelo da frente parece uma boa escolha.”
“Vermelho é minha cor favorita.”
“Então, será a vermelha.” Patch levou o taco para trás e através do círculo, apontando para a bola, praticando. Eu mirei a bola branca para dentro do triângulo mas ela foi parar além da mesa.
“Foi um pouco desviado,” ele disse. Senti-me sorrir.
“O que quer apostar?”
“Cinco dólares.” Eu senti ele balançando a cabeça suavemente.
“Seu casaco.”
“Você quer o meu casaco?”
“Eu quero ver você tira-lo.”
Meu braço se moveu para trás e disparou o taco de sinuca com meus dedos, batendo na bola. Em seguida, atirou a bola para a frente, batendo a bola vermelha, destruindo o triângulo, deixando as bolas bagunçadas em todos os sentidos.
“Ok,” eu disse, tirando minha jaqueta jeans.
“Eu posso dizer que estou um pouco chocado.” Patch examinou meu lenço de seda/camisa halter. Seus olhos eram negros como o mar à meia-noite, a expressão contemplativa. “Muito bom,” disse ele. Em seguida, passou-se à volta da mesa, observando a posição onde as bolas estavam.
“Cinco dólares que você não pode bater a azul.” Eu disse, selecionando a bola que foi separada da bola branca para um monte de bolas de outras cores.
“Eu não quero seu dinheiro,” disse Patch. Nossos olhos se encontraram e a menor das covinhas apareceu em seu rosto. Minha temperatura subiu um grau.
“Então o que você quer?” Eu perguntei. Patch abaixou o seu taco de sinuca para a mesa, tomou impulso e golpeou forte a bola branca. No instante que a bola branca golpeou a verde, esta golpeou por sua vez a bola oito e com o impulso bateu lindamente na azul. Eu soltei um riso nervoso e tentei encobrir o meu toque dos dedos. Um mau hábito não posso desfazer.
“Ok, talvez eu esteja mais do que um pouco impressionada.” Patch ainda estava debruçado sobre a mesa e então olhou para mim. Seus olhos aqueceram minha pele.
“Nós nunca apostamos tudo,” disse. Resisti à vontade para mudar de posição. O taco de sinuca sentiu o aperto entre as minhas mãos e eu limpei minha mão discretamente no meu colo. Como se não fosse o bastante de transpiração, Patch disse:
“Você me deve. Algum dia eu vou cobrar.”
Eu ri, mas veio um som fora do tom. “Bem que você queria.”
Passos pesados ecoaram no piso da escada. Um rapaz alto e fibroso, com um nariz aquilino e cabelo desarrumado apareceu com uma substância negra. Olhando primeiro a Patch, em seguida, fixou os olhos em mim.
Um pequeno sorriso apareceu em seu rosto quando ele estendeu a mão e agarrou meu 7Up, que eu tinha deixado na beira da mesa de sinuca.
“Desculpe-me, mas eu acho que é –” eu comecei a dizer.
“Você não mencionou que ela era tão bela aos olhos,” disse ele a Patch, limpando a boca com as costas de sua mão. Ele falou com um forte sotaque irlandês.
“Eu não mencionei que você é tão feio aos olhos também,” Patch retrucou, sua boca no estado de relaxamento que precede um sorriso. O rapaz inclinou-se sobre a mesa de sinuca ao lado de mim e me ofereceu sua mão.
“Meu nome é Rixon, amor.” Eu ofereci minha mão com relutância.
.”
“Estou interrompendo alguma coisa aqui?” Rixon disse, dividindo e inquirindo um olhar entre mim e o Patch.
“Não,” eu disse ao mesmo tempo em que o Patch disse, “Sim.”
De repente Rixon de um soco de brincadeira no Patch, e os dois caíram no chão, rolando e trocando socos. Havia um o som de uma risada rude, punhos contra a carne, tecido se rasgando e as costas nuas do Patch ficaram a vista. Com dois talhos ao longo dela. Eles começavam perto dos seus rins e
terminavam nas escápulas, abertos com a forma de um V invertido. As cicatrizes eram tão grotescas que quase engasguei em horror.
“Me larga!” Rixon berrou.
Patch saiu de cima dele e ficou em pé, sua camisa estava rasgada, meio aberta. Ele a arrancou e jogou numa lata de lixo no canto.
“Me dê sua camisa,” ele disse para o Rixon.
Rixon deu uma piscada para mim. “O que você acha ? Devo dar a camisa para ele?”
Patch deu um passo para frente como se fosse dar o bote de brincadeira e Rixon ergueu suas mãos perto de seus ombros.
“Calminha,” ele disse, indo para trás. Ele tirou seu moletom e o jogou para Patch, revelando uma camiseta justa por baixo.
Enquanto Patch descia o moletom por seu abdome forte o suficiente para borboletas voarem pelo meu estômago, Rixon virou para mim. “Ele disse como ele conseguiu esse apelido?”
“Como?”
“Antes do nosso bom amigo Patch aqui competir no bilhar, o rapaz era favorecido no boxe Irlandês. Ele não era muito bom nisso.” Rixon abanou a cabeça. “Verdade seja dita, ele era completamente patético. Eu passei muitas noites remendando ele38, e logo todos começaram a chamá-lo de Patch. Eu dizia para ele desistir do boxe, mas ele não me ouvia.”

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38 A expressão no inglês é ‘patching him up’ daí que tiraram o Patch.
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Patch olhou nos meus olhos e deu um sorriso de medalha de ouro de briga em bar. Apenas o sorriso era assustador o suficiente, mas embaixo da fachada, tinha uma nota de desejo. Mais que uma nota na verdade. Uma sinfonia completa de desejo.
Patch inclinou sua cabeça em direção às escadas e ergueu sua mão para mim. “Vamos dar o fora daqui,” ele disse.
“Onde estamos indo?” eu perguntei, com meu estômago descendo aos joelhos.
“Você vai ver.”
Enquanto nós subíamos as escadas, Rixon falou alto para mim, “Boa sorte com esse aí, querida!” 

Capítulo Dezoito

Na viagem de volta, Patch pegou a saída para Topsham e estacionou ao lado da histórica fábrica de papel Topsham na margem do rio Androscoggin. Certa vez a fábrica tinha sido usada para transformar a polpa das árvores em papel. Agora uma placa grande atravessava o lado do prédio e dizia CERVEJARIA SEA DOG CO39. O rio era largo e agitado, com árvores antigas margeando os dois lados.

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39 Nome da nova empresa.
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Ainda estava chovendo forte, e a noite tinha caído ao nosso redor. Eu tinha que dar um toque pra minha mãe em casa. Eu não tinha contado a ela que eu ia sair por que... Bem, a verdade é que o Patch não é o tipo de cara que as mães gostam. Ele é o tipo de que faz com que elas troquem as fechaduras da casa.
“Podemos fazer um lanchinho?” eu perguntei.
O Patch abriu a porta do lado do motorista. “Alguma coisa em particular?”
“Um sanduíche de peru. Mas sem picles. Oh, e sem maionese.”
Eu podia dizer que ganhei um de seus sorrisos que nunca chegavam à superfície. Parece que eu ganho muito desses. Desta vez, eu não descobri o que eu tinha falado para merecer.
“Vou ver o que posso fazer,” ele disse, deslizando para fora.
Patch deixou as chaves na ignição e o aquecedor ligado. Nos primeiros minutos eu revi nossa tarde muito longe na minha mente. E então isso me lembrou de que eu estava sozinha no Jeep do Patch. Seu espaço privado.
Se eu fosse o Patch, e eu quisesse esconder uma coisa muito secreta, não poderia ser no meu quarto, no meu armário da escola, nem mesmo na minha mochila, todos esses lugares podiam ser confiscados ou sofrer uma busca sem aviso prévio. Eu esconderia no meu Jeep preto brilhante com um sofisticado sistema de alarme.
Eu tirei meu cinto de segurança e remexi na pilha de livros didáticos próximos ao meu pé, sentindo um sorriso misterioso fluir na minha boca ao pensar em descobrir um dos segredos do Patch. Eu não estava esperando encontrar nada em particular; eu deveria ter procurado a combinação do seu armário ou o número do seu celular. Mexendo em uns papéis antigos da escola bagunçando os tapetes do chão, eu encontrei um perfumador de ambiente de pinho meio usado, um CD do AC/DC Highway to Hell, tocos de lápis e um recibo
de uma 7-Eleven com a data de quarta-feira às 10:18 P.M. Nada especialmente surpreendente ou revelador.
Eu abri o porta-luvas e fucei através do manual do carro e outros documentos oficiais. Tinha um brilho de cromado e meus dedos roçaram em um metal. Eu puxei uma lanterna de aço e a liguei, mas nada aconteceu. Eu desparafusei o fundo, achando que a lanterna tinha um pouco de luz, e com certeza, não tinha baterias. Eu me perguntei por que Patch tinha uma lanterna que não funcionava guardada em seu porta-luvas. Foi o último pensamento que tive antes que meus olhos pousassem em um líquido áspero que tinha secado na ponta da lanterna.
Sangue.
Muito cuidadosamente, eu guardei a lanterna no porta-luvas e a fechei fora do meu alcance de visão. Eu disse a mim mesma que havia muitas coisas que poderiam levar a ter sangue em uma lanterna. Como segurá-la com uma mão machucada, usá-la para empurrar um animal morto para fora da estrada… bater com força em um corpo até que a pele se rasgue.
Com meu coração batendo forte, eu pulei na primeira conclusão que se apresentou. Patch tinha mentido. Ele tinha atacado a Marcie. Ele tinha me deixado na noite de quarta, trocado a moto pelo Jeep, e saiu procurando ela. Ou talvez seus caminhos se cruzaram por acaso e ele agiu por impulso. De qualquer maneira, Marcie estava machucada, a polícia está envolvida e Patch era o culpado.
Racionalmente, eu sei que isso era uma conclusão precipitada e um grande salto, mas emocionalmente, as apostas eram altas demais para voltar e pensar sobre isso. Patch tinha um passado assustador e muitos, muitos segredos. Se violência brutal e sem sentido era um deles, eu não estava segura saindo sozinha com ele.
Um flash de luz no horizonte. O Patch saiu do restaurante e correu pelo estacionamento segurando uma sacola marrom em uma mão e dois refrigerantes na outra. Ele foi em direção ao lado do motorista e subiu no Jeep. Ele ergueu o boné e esfregou a chuva de seu cabelo. Ondas escuras saiam para todos os lados. Ele me passou a sacola marrom.
“Um sanduíche de peru, sem maionese e picles, e alguma coisa para segurá-lo embaixo.”
“Você atacou a Marcie Millar?” eu perguntei calmamente. “Eu quero a verdade – agora.”
O Patch abaixou sua 7UP da boca. Seus olhos cortaram os meus. “O que?”
“A lanterna no seu porta-luvas. Explique.”
“Você abriu meu porta-luvas?” Ele não pareceu aborrecido, mas também não pareceu satisfeito.
“A lanterna tem sangue seco nela. A polícia veio na minha casa mais cedo. Eles acham que eu estou envolvida. Marcie foi atacada na noite de quarta-feira, logo depois que eu te disse que não a suportava.”
Patch deu uma risada curta, sem humor. “Você acha que eu usei a lanterna para bater na Marcie.”
Ele procurou atrás do banco e tirou uma arma grande. Eu gritei.
Ele se inclinou e tampou minha boca com sua mão. “Arma de Paintball,” ele disse. Seu tom era gelado.
Eu dividi os olhares entre a arma e o Patch, sentindo muito branco ao redor dos meus olhos.
“Eu joguei paintball no começo dessa semana,” ele disse. “Achei que já tínhamos superado isso.”
“I-Isso não explica o sangue na lanterna.”
“Não é sangue,” ele disse, “é tinta. Estávamos jogando Pega Bandeira.”
Meus olhos voltaram-se para o porta-luvas que guardava a lanterna. A lanterna era... A bandeira. Uma mistura de alívio, idiotice e culpa por ter acusado o Patch nadou através de mim. “Oh,” eu disse lamentando. “Eu – sinto muito.”
Mas parecia um pouco tarde para desculpas.
Patch ficou olhando diretamente para frente através do pára-brisa, respirando profundamente. Eu me perguntei se ele estava usando o silêncio para deixar sair um pouco da raiva. Afinal eu o tinha acusado de atacar uma pessoa. Eu me sentia horrível por isso, mas minha mente estava muito atrapalhada para pedir desculpas corretamente.
“Pela descrição que você fez da Marcie, parece que ela provavelmente tem alguns inimigos,” ele disse.
“Tenho certeza que a e eu estamos no topo da lista,” eu disse, tentando melhorar o ambiente, mas tinha um fundo de verdade.
Patch estacionou na casa da fazenda e desligou o carro. Seu boné estava quase em cima de seus olhos, mas agora sua boca tinha uma sugestão de sorriso. Seus lábios pareciam macios e suaves e eu estava tendo dificuldades para desviar meu olhar. O melhor de tudo é que eu estava grata por ele parecer ter me perdoado.
“Vamos ter que trabalhar mais no nosso jogo de bilhar, Anjo,” o Patch disse.
“Por falar em bilhar.” Eu limpei minha garganta. “Eu gostaria de saber onde e quando você vai querer aquela... coisa que lhe devo.”
“Não essa noite.” Seus olhos assistiam os meus de perto, julgando minha resposta. Eu tinha sido pega entre o alívio da minha mente e desapontamento. Mas a maior parte era desapontamento.
“Eu tenho uma coisa para você,” Patch disse. Ele procurou debaixo do seu assento e puxou uma sacola de papel branca com pimentas vermelhas impressa. Uma embalagem para viagem da Borderline. Ele colocou entre nós.
“Pra que isso?” eu perguntei, espreitando dentro do saco, sem ter absolutamente nenhuma ideia do que teria lá dentro.
“Abra.”
Eu puxei uma caixa de papelão marrom para fora do saco e levantei a tampa. Dentro tinha um globo de neve com a miniatura do Parque de Diversões Delphic Seaport dentro. Fios de bronze foram torcidos formando um círculo para a roda gigante e para os loopings da montanha russa; chapas de metal manchado faziam o Tapete Mágico.
“É lindo,” eu disse, um pouco confusa por ele me comprar um presente. “Obrigada. De verdade. Eu adorei.”
Ele tocou o vidro curvado. “Aqui é o Arcanjo, antes de ser remodelado.” Atrás da roda gigante, um fio fino com fitas formava os montes e vales do Arcanjo. Um anjo com as asas quebradas estava no ponto mais alto, sua cabeça inclinada, olhando para baixo, sem olhos. “O que realmente aconteceu na noite que fomos nela juntos?” eu perguntei.
“Você não quer saber.”
“Se você me disser, vai ter que me matar?” eu meio que brinquei.
“Não estamos sozinhos,” Patch respondeu, olhando através do pára-brisas.
Eu olhei para cima e vi minha mãe parada na porta de entrada aberta. Para meu horror, ela saiu e andou em direção ao Jeep.
“Deixe-me conduzir a conversa,” eu disse, guardando o globo de neve de volta na caixa. “Não fale nada. Nenhuma palavra!”
Patch saiu e deu a volta para minha porta. Nós encontramos minha mãe no meio do caminho da entrada de carros.
“Eu não sabia que você ia sair,” ela me disse, sorrindo, mas não de um jeito relaxado. Era uma sorriso que dizia, Vamos conversar mais tarde.
“Foi meio que de última hora,” eu expliquei.
“Eu vim direto para casa depois da yoga,” ela disse. O resto estava implícito. Sorte minha, mas não para você. Eu estava contando com ela ter saído para tomar um suco com suas amigas depois da aula. Nove de dez vezes ela ia. Ela virou sua atenção para o Patch. “É bom finalmente te conhecer. Aparentemente minha filha é uma grande fã sua.”
Eu abri minha boca para uma introdução extremamente concisa e mandar o Patch pegar seu caminho, mas minha mãe se adiantou. “Eu sou a mãe da . Blyte .”
“Esse é o Patch,” eu disse, acelerando meu cérebro para dizer alguma coisa que parasse rapidamente com as gentilezas. Mas a únicas coisas que eu podia pensar era gritar Fogo! ou fingir uma crise. De algum jeito, as duas opções pareciam mais humilhantes que enfrentar uma conversa entre minha mãe e o Patch.
me disse que você é um nadador40,” mamãe disse.

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40 Lembram da dualidade da palavra pool em inglês? Quando a mãe da fez confusão entre piscina e mesa de bilhar? Quem não lembra, volte no capítulo 14 ;)
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Eu senti o Patch se mexer com uma risada ao meu lado. “Um nadador?”
“Você está no time de natação da escola, ou em uma liga da cidade?”
“É mais... por diversão,” Patch disse, me dando um olhar questionador.
“Bem diversão também é bom,” mamãe disse. “Onde você nada? No centro recreativo?”
“Sou mais um cara tipo ao ar livre. Rios e lagos.”
“Não é frio?” mamãe perguntou.
Ao meu lado, o Patch sacudiu. Perguntei-me o que tinha perdido. Nada sobre a conversa parecia fora do comum. E eu estava do lado da minha mãe nessa. Maine não era um lugar tropical, quente. Nadar ao ar livre era frio, mesmo na época do verão. Se Patch era realmente um nadador ao ar livre, ou ele era louco ou tinha um alto limiar de dor.
“Certo!” eu disse, tirando proveito da calmaria. “Patch precisa ir.” Vá! eu fiz com a boca para ele.
“É um Jeep bem legal,” mamãe perguntou. “Seus pais compraram para você?”
“Eu mesmo peguei.”
“Você deve ter um emprego bom.”
“Eu sirvo mesas no Borderline.”
Patch estava dizendo o mínimo possível, mantendo-se cuidadosamente misterioso. De volta na minha mente, eu não podia parar de pensar no seu passado assustador. Até agora eu tinha fantasiado sobre descobrir seus segredos mais profundos e escuros porque eu queria provar para mim mesma e para o Patch que eu era capaz de sacá-lo. Mas agora eu queria saber seus segredos porque eles eram parte dele. E sem contar o fato que eu rotineiramente tentava negar que eu sentia algo por ele. Quanto mais tempo eu passava com ele, mais eu sabia que esses sentimentos não iam embora.
Mamãe fez uma careta. “Espero que o trabalho não atrapalhe os estudos. Pessoalmente, não acho que estudantes do colegial deveriam trabalhar durante o ano escolar. Vocês já têm muitas coisas.”
Patch sorriu. “Isso não tem sido um problema.”
“Se importa se eu perguntar seu rendimento escolar?” Mamãe disse. “Seria muito rude?”
“Caramba! Está ficando tarde –“, eu comecei a falar alto, consultando o relógio que eu não estava usando. Eu não podia acreditar que minha mãe estava sendo tão mala sobre isso. Era um mau sinal. Isso só dizia que sua primeira impressão do Patch era pior que eu temia. Isso não era uma apresentação. Era uma entrevista.
“Dois-ponto-dois,” Patch disse.
Minha mãe olhou para ele.
“Ele está brincando,” eu disse baixinho. Eu dei um empurrão discreto no Patch em direção ao Jeep. “Patch tem coisas para fazer. Lugares para ir. Pool41 para jogar –“ Eu coloquei minha mão na boca.

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41 De novo nos deparamos com a linda palavrinha Pool que significa piscina e mesa de bilhar.
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“Jogar?” minha mãe disse, parecendo confusa.
se referia ao Bo’s Arcade,” Patch explicou. “Mas não é para lá que estou indo. Eu tenho alguns assuntos para resolver.”
“Nunca estive no Bo’s,” ela disse.
“Não é tão bom assim,” eu disse. “Você não está perdendo nada.”
“Espere,” mamãe disse, soando como se uma bandeira vermelha tivesse surgido em sua memória. “É fora da costa? Perto do Delphic Seaport? Não houve um tiroteio no Bo’s alguns anos atrás?”
“Lá está mais domesticado do que costumava ser,” Patch disse. Eu estreitei meus olhos para ele. Ele tinha me ferrado. Eu tinha planejado mentir sobre o Bo’s ter qualquer histórico de violência.
“Você gostaria de entrar e tomar sorvete?” Mamãe perguntou, soando abafada, pega entre fazer uma coisa educada e agir sob o impulso de me levar para dentro e trancar a porta. “Nós temos apenas de baunilha,” ela adicionou para azedar o convite. “Está há algumas semanas aberto.”
Patch balançou a cabeça. “Eu tenho que ir andando. Talvez na próxima vez. Foi um prazer te conhecer, Blythe.”
Eu peguei a interrupção da conversa como minha deixa e empurrei minha mãe para a porta da frente, aliviada que a conversa não tinha sido tão ruim como poderia ter sido. De repente mamãe se virou.
“O que você e fizeram essa noite?” ela perguntou para o Patch.
Patch olhou para mim e ergueu suas sobrancelhas ligeiramente.
“Nós jantamos em Topsham,” eu respondi rapidamente. “Sanduíches e refrigerantes. Uma noite puramente inofensiva.”
O problema era que meus sentimentos por Patch não eram inofensivos. 

Capítulo Dezanove

Eu deixei o globo de neve em sua caixa e enfiei dentro do meu armário atrás de uma pilha de suéteres com padrão de diamante que eu tinha roubado do meu pai. Quando eu abri o presente a frente do Patch, o Delphic parecera brilhante e lindo, arco-íris de luz girando dos arames. Mas sozinha no meu quarto, o parque de diversão parecera assombrado. Um campo ideal para espíritos separados dos corpos. E eu não tinha muita certeza de que não havia uma câmera escondida dentro.
Após colocar uma camisola larga e calça de pijama floral, eu liguei para .
“Bem?” ela disse. “Como foi? Obviamente ele não te matou, então esse é um bom começo.”
“Jogamos sinuca.”
“Você odeia sinuca.”
“Ele me deu algumas dicas. Agora que eu sei o que estou fazendo, não é tão ruim.”
“Aposto que ele podia te dar algumas dicas em outras áreas da sua vida.”
“Hmm.” Normalmente, o comentário dela podia ter incitado pelo menos um rubor de mim, mas meu humor era sério demais. Eu estava concentrada no trabalho, pensando.
“Eu sei que disse isso antes, mas o Patch não instila uma profunda sensação de conforto em mim,” disse. “Eu ainda tenho pesadelos com o cara com a máscara de esqui. Em um dos meus pesadelos, ele arrancou sua máscara, e adivinha quem se escondia por trás dela? Patch. Pessoalmente, acho que devia tratá-lo como uma bomba armada. Algo nele não é normal.”
Isso é exatamente sobre o que eu queria falar.
“O que faria com que alguém tivesse uma cicatriz em formato de V nas costas?” eu perguntei a ela.
Houve um momento de silêncio.
“Anormal,” engasgou. “Você o viu pelado? Onde aconteceu? No jipe dele? Na casa dele? Nos seu quarto?”
“Eu não o vi pelado! Foi meio que um acidente.”
“Aham, já ouvi essa desculpa antes,” disse .
“Ele tinha uma cicatriz enorme em formato de V de cabeça para baixo nas costas. Isso não é um pouquinho estranho?”
“É claro que é estranho. Mas é do Patch que estamos falando. Ele tem alguns parafusos a menos. Eu vou dar um chute e dizer... briga de gangue? Cicatrizes de guerra? Marcas de derrapagem de uma batida com carro?
Metade do meu cérebro estava focado na minha conversa com , mas a outra metade mais subconsciente tinha se desviado. Minha memória voltava para a noite que Patch tinha me desafiado a andar no Arcanjo. Eu recapturei as pinturas apavorantes e bizarras na lateral dos carros. Eu me lembrava das bestas chifrudas arrancando as asas do anjo. Eu me lembrava do V negro de ponta-cabeça onde as asas do anjo costumavam estar.
Eu quase derrubei o telefone.
“D-desculpa, o quê?” eu perguntei a quando percebi que ela tinha continuado a conversa e estava esperando pela minha resposta.
“O que. Aconteceu. Depois?” ela repetiu, enunciando cada palavra. “Terra para . Eu preciso de detalhes. Estou morrendo aqui.”
“Ele se meteu numa briga e sua camiseta rasgou. Fim da história. Não tem nada de o-que-aconteceu-depois.”
prendeu a respiração. “É disso que estou falando. Vocês dois saíram juntos... e ele se mete numa briga? Qual o problema dele? Parece que ele é mais animal do que humano.”
Na minha mente eu ficava alternando entre a pintura das cicatrizes do anjo e das cicatrizes do Patch. Ambas as cicatrizes tinham sarado à cor de alcaçuz preto, ambas corriam das omoplatas até os rins, e ambas se curvavam enquanto viajavam pelo comprimento das costas. Eu disse a mim mesma que havia uma boa chance de ser meramente uma coincidência muito bizarra que as pinturas no Arcanjo descrevam as cicatrizes do Patch perfeitamente. Eu disse a mim mesma que um monte de coisas podia causar cicatrizes como as do Patch. Brigas de gangue, cicatrizes de prisão, marcas de derrapagem – exatamente como dissera. Infelizmente, todas as desculpas pareciam mentiras. Como se a verdade estivesse me encarando, mas eu não era corajosa o bastante para olhar de volta.
“Ele foi um anjo?” perguntou.
Eu voltei à mim. “O quê?”
“Ele foi um anjo, ou ele correspondeu à sua imagem de bad boy? Porque, sério? Eu não estou engolindo essa versão toda da história de ele-não-tentou-nada.”
"? Eu tenho que ir." Minha voz estava juncada com teias de aranha.
“Estou vendo como é. Você vai desligar antes que eu consiga os detalhes da parada."
“Nada aconteceu no encontro, e nada aconteceu depois. Minha mãe nos encontrou na entrada.”
“Não creio!”
“Eu não acho que ela goste do Patch.”
“Não diga!” disse. “Quem teria adivinhado?”
“Eu te ligo amanhã, está bem?”
“Bons sonhos, querida.”
Sem chance, eu pensei.
Após eu sair do telefone com a , eu andei pelo corredor até o escritório provisório da minha mãe e liguei o nosso IBM ultrapassado. A sala era pequena, com um teto inclinado, mais uma cumeeira do que uma sala. Uma janela engordurada com cortinas laranja desbotadas dos anos 70 tinha visto para o jardim lateral. Eu podia ficar totalmente de pé em cerca de 30 porcento da sala.
Nos outros 70 porcento, o alto do meu cabelo roçava nas vigas expostas do refúgio. Um único bulbo exposto estava pendurado ali.
Dez minutos mais tarde o computador conseguiu uma conexão discada na internet, e eu digitei “cicatrizes de asas de anjos” na barra de pesquisa do Google. Eu pairei com o meu dedo sobre a tecla de enter, com medo de que se eu fosse adiante com isso, eu teria que admitir que eu estava realmente considerando a possibilidade de que Patch era – bem, não... humano.
Eu apertei o enter e cliquei com o mouse no primeiro link antes que eu pudesse me convencer a não fazer isso.
ANJOS CAÍDOS: A ATERRORIZANTE VERDADE
Na criação do jardim do Éden, anjos celestiais foram mandados à Terra para zelar por Adão e Eva. Logo, contudo, alguns anjos colocaram seus olhos no mundo além das paredes do jardim. Eles se viram como os futuros governantes da população da Terra, cobiçando poder, dinheiro, e até mesmo mulheres humanas.
Juntos eles tentaram e convenceram Eva a comer o fruto proibido, abrindo os portões guardando o Éden. Como punição por esse grave pecado e por abandonarem seus deveres, Deus arrancou as asas dos anjos e os baniu à Terra para sempre.
Eu pulei alguns parágrafos, meu coração batendo erraticamente.
Anjos caídos são os mesmos espíritos malignos (ou demônios) descritos na Bíblia que possuem corpos humanos. Anjos caídos vagam pela Terra procurando por corpos humanos para molestar e controlar. Eles tentam humanos a fazer coisas más ao comunicarem pensamentos e imagens diretamente há suas mentes. Se um anjo caído tiver sucesso em tornar um humano maligno, ele pode entrar no corpo do humano e influenciar a personalidade e as ações dele ou dela.
Contudo, a possessão de um corpo humano por um anjo caído só pode se dar durante o mês judaico de Cheshvan. Cheshvan, conhecido como “o mês amargo”, é o único mês sem quaisquer feriados ou jejuns judaicos, tornando-o um mês não-sagrado. Entre as luas nova e cheia durante o Cheshvan, anjos caídos invadem corpos humanos em rebanho.
Meu olhar hesitou no monitor do computador por alguns minutos após eu terminar de ler.
Eu não tinha pensamentos. Nenhum. Somente uma complexidade de emoções deturpada dentro de mim. Frio, um espanto assustado e mau presságio entre eles.
Um tremor involuntário despertou meus sentidos. Eu me lembrei das poucas vezes em que tive certeza de que Patch tinha rompido os métodos normais de comunicação e sussurrado diretamente para a minha mente, exatamente como o artigo clamava que anjos caídos podem fazer. Comparando essa informação com as cicatrizes de Patch, seria possível... o Patch podia ser um anjo caído? Ele queria possuir o meu corpo?
Eu olhei rapidamente pelo resto do artigo, diminuindo quando lia algo ainda mais bizarro.
Anjos caídos que tem um relacionamento sexual com um humano produzem uma prole sobre-humana chamada nephilim. A raça nephilim é uma maligna e anormal e nunca deveria habitar a Terra. Apesar de muitos acreditarem que o Dilúvio no tempo de Noé teve a intenção de limpar a Terra dos nephilim, não temos jeito de saber se essa raça híbrida morreu e se os anjos caídos continuaram ou não a se reproduzir com humanos desde então. Parece lógico que eles continuassem, o que quer dizer que a raça nephilim provavelmente está na Terra hoje.
Eu me empurrei da mesa. Eu comprimi tudo que tinha lido em uma pasta mental e a arquivei. E carimbei ASSUSTADOR no lado de fora da pasta. Eu não queria pensar nisso agora. Eu analisaria isso depois. Talvez.
Meu celular tocou no meu bolso e eu pulei.
“Nós decidimos que abacates são verdes ou amarelos?” perguntou. “Eu já preenchi toda a quota de frutas verdes de hoje, mas se você me disser que abacates são amarelos, estou dentro.”
“Você acredita em super-heróis?”
“Depois de ver o Tobey Maguire em Homem-Aranha, sim. E então tem o Christian Bale. Mais velhos, mas gostoso pra caramba. Eu o deixaria me resgatar de ninjas empunhando espadas.”
“Estou falando sério.”
“Eu também.”
“Quando foi a última vez que você foi na Igreja?” eu perguntei.
Eu a escutei estourar um chiclete. “Domingo.”
“Você acha que a Bíblia é precisa? Quero dizer, você acha que é real?"
“Eu acho que o Pastor Calvin é gostoso. Num jeito de quarentão. Isso basicamente sintetiza a minha convicção religiosa.”
Após eu ter desligado, eu fui para o meu quarto e deslizei para debaixo das cobertas. Eu peguei um cobertor extra para repelir o frio repentino. Eu não tinha certeza se o quarto estava frio, ou se a sensação gelada originava-se de dentro de mim. Palavras assombradas como "anjo caído," “possessão humana,” e “Nephilim” dançaram até eu dormir. 

Capítulo Vinte
Eu me virei a noite inteira. O vento soprava pelos campos abertos que margeavam a casa da fazenda, espalhando detritos pelas janelas. Eu acordei várias vezes, escutando as telhas serem arrancadas do telhado e jogadas nas bordas. Cada pequeno barulho desde o barulho das vidraças até o rangido das molas da minha cama me faziam acordar.
Perto das seis eu desisti, saí da cama, me arrastei pelo corredor em direção a um banho quente. Depois eu limpei meu quarto – meu closet estava parecendo escasso e com certeza, eu enchi a cesta três vezes com roupas para lavar. Eu estava subindo as escadas com um carregamento novo quando ouvi um bater na porta de frente. Eu a abri e encontrei Elliot parado no degrau da porta.
Ele estava de jeans, uma camisa xadrez vintage42 com a manga dobrada até os cotovelos, óculos de sol e um boné do Red Sox43. Por um lado ele parecia um típico americano. Mas eu o conhecia melhor, e um choque de adrenalina e nervoso confirmaram isso.
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42 Moda vintage é uma moda retrógrada, uma recuperação de estilos dos anos 20, 30, 40, 50 e 60.
43 Time profissional americano de basebol.
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,” Elliot disse em uma voz condescendente. Ele inclinou e sorriu, eu peguei um tom amargo de álcool em seu hálito. “Ultimamente você tem me causado muitos problemas.”
“O que você está fazendo aqui?”
Ele espiou atrás de mim para dentro da casa. “O que parece que estou fazendo? Eu quero conversar. Não vai me deixar entrar?”
“Minha mãe está dormindo. Eu não quero acordá-la.”
“Eu nunca conheci sua mãe.” Alguma coisa no jeito que ele disse isso fez com que os pelos da minha nuca se arrepiassem.
“Sinto muito, você precisa de alguma coisa?”
Seu sorriso era meio desleixado, meio zombeteiro. “Você não gosta de mim, gosta ?”
Como resposta eu cruzei meus braços no peito.
Ele voltou um degrau com sua mão no coração. “Ouch. Estou aqui, , como uma última oferta para te convencer que eu sou um cara comum e você pode confiar em mim. Não me desaponte.”
“Escuta, Elliot, eu tenho algumas coisas que preciso –”
Ele bateu com o punho na casa, batendo os dedos na madeira com força suficiente para agitar a tinta lascada. “Eu não terminei!” ele repreendeu com a voz quente. De repente ele jogou a cabeça para trás e riu baixinho. Ele voltou e colocou sua mão sangrando entre os joelhos e gemeu. “Aposto dez dólares que vou me arrepender disso mais tarde.”
A presença de Elliot fazia minha pele formigar. Lembrei-me de alguns dias atrás, quando eu realmente achei que ele era bonito e charmoso. Perguntei-me porque eu tinha sido tão idiota.
Eu estava cogitando fechar a porta e trancá-la, quando Elliot tirou os óculos de sol, revelando seus olhos vermelhos. Ele limpou a garganta, sua voz saiu franca. “Eu vim aqui porque quero dizer que o Jules está sob muito estresse na escola. Exames, conselho estudantil, candidatura às bolsas, blá, blá, blá. Ele não está sendo ele mesmo. Ele precisa sair um pouco por uns dias. Nós quatro – Jules, eu, você e a – deveríamos ir acampar para dar um tempo. Saindo amanhã para o Powder Horn44 e voltando na quinta a tarde. Isso dará a chance para o Jules relaxar.” Cada palavra que saía de sua boca parecia assustadoramente e cuidadosamente ensaiada.

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44 Nome do hotel.
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“Sinto muito, eu já tenho planos.”
“Deixe-me mudar sua mente. Eu vou planejar toda a viagem. Eu vou pegar as barracas, a comida. Vou te mostrar o cara legal que sou. Vou te mostrar ótimos momentos.”
“Eu acho que você deve ir.”
Elliot encostou a mão no batente da porta inclinando-se para mim. “Resposta errada.” Por um rápido instante, o estupor vidrado em seus olhos desapareceu, algo sinistro e retorcido tomou seu lugar. Involuntariamente eu dei um passo para trás. Eu tinha quase certeza que o Elliot tinha nele aquilo necessário para matar. Eu tinha quase certeza que a morte da Kjirsten estava em suas mãos.
“Saia ou eu vou chamar um táxi,” eu disse.
Elliot arremessou a porta de tela tão forte que ela bateu contra a casa. Ele agarrou a frente do meu roupão e me puxou para fora. Então ele me jogou de costas nas tábuas e me segurou lá com seu corpo. “Você vai vir acampar querendo ou não.”
“Me solta!” eu disse, me sacudindo para longe dele.
“Ou o que? O que você vai fazer?” Ele estava me segurando pelos ombros agora, ele me jogou contra a casa novamente, batendo meus dentes.
“Eu vou ligar para polícia.” Eu não tenho ideia de como eu disse isso tão bravamente. Minha respiração estava rápida e superficial, minhas mãos frias.
“Você vai gritar por eles? Eles não podem te ouvir. O único jeito de eu te deixar ir é você prometer ir acampar.”
?”
Elliot e eu olhamos para a porta da frente, de onde vinha a voz da minha mãe. Elliot manteve suas mãos em mim por mais um tempo, então fez um som de desgosto e me soltou. A meio caminho da escada, ele olhou por cima dos seus ombros. “Isso ainda não acabou.”
Eu corri para dentro e tranquei a porta. Meus olhos começaram a queimar. Eu encostei minhas costas na porta e sentei no tapete da entrada, lutando com a urgência de soluçar.
Minha mãe apareceu no topo da escada, apertou seu roupão no peito. “? O que há de errado? Quem estava na porta?”
Eu pisquei meus olhos para secar rapidamente. “Um cara da escola.” Eu não pude tirar o vacilo da minha voz. “Ele – ele –” Eu já estava com problemas suficientes por causa do meu encontro com o Patch. Eu sabia que minha mãe estava planejando cuidar da recepção de um casamento hoje a noite da filha de um colega do trabalho, mas se eu dissesse a ela que Elliot tinha me coagido, ela não iria de jeito nenhum. E isso era a última coisa que eu queria, porque eu precisava ir a Portland investigar o Elliot. Mesmo uma pequena prova incriminatória poderia ser o suficiente para colocá-lo atrás das grades e até que isso acontecesse, eu não me sentiria segura. Eu senti uma certa violência crescendo nele e eu não queria ver o que aconteceria se ele perdesse o controle. “Ele queria minhas anotações do Hamlet,” eu disse. “Semana passada ele copiou minhas questões e aparentemente ele está tentando fazer disso um hábito.”
“Oh, querida.” Ela desceu para ficar ao meu lado, acariciando meu cabelo úmido, que estava frio desde meu banho. “Eu entendo porque você está chateada. Eu posso ligar para os pais dele se você quiser.”
Eu balancei a cabeça.
“Então vou fazer seu café da manhã,” mamãe disse. “Vá terminar de se vestir. Eu terei tudo pronto quando você descer.”
Eu estava na frente do meu armário quando meu celular tocou.
“Você está ouvindo? Nós quatro vamos a-c-a-m-p-a-r para dar uma relaxada!” a disse, soando bizarramente alegre.
,” eu disse, com a voz tremendo. “Elliot está planejando alguma coisa. Alguma coisa assustadora. A única razão para ele querer ir acampar é para que ele nos tenha sozinhas. Nós não vamos.”
“O que você quer dizer connosco não vamos? Isso é uma piada, certo? Quero dizer, finalmente vamos fazer uma coisa excitante para relaxar e você está dizendo não? Você sabe que minha mãe nunca vai me deixar ir sozinha. Faço qualquer coisa. Sério. Faço sua lição de casa por uma semana. Vamos, . Uma pequena palavra. Diga. Começa com a letra S…”
A mão que estava segurando o celular tremeu e eu o segurei com a outra. “Elliot apareceu na minha casa quinze minutos atrás, bêbado. Ele – ele me ameaçou fisicamente.”
Ela ficou quieta por um momento. “O que você quer dizer com ‘ameaçou fisicamente’?”
“Ele me puxou para fora da porta da frente e me jogou contra a casa.”
“Mas ele estava bêbado, certo?”
“Isso importa?” eu bati.
“Bem, ele tem muita coisa na cabeça. Quero dizer, ele foi erradamente acusado de estar envolvido com o suicídio de uma garota e ele foi forçado a trocar de escola. Se ele te machucou – eu não estou justificando o que ele fez – talvez ele apenas precise de... aconselhamento, você sabe?”
Se ele me machucou?”
“Ele estava perdido. Talvez – talvez ele não soubesse o que estava fazendo. Amanhã ele vai sentir-se horrível.”
Eu abri minha boca e fechei. Eu na podia acreditar que a estava do lado do Elliot. “Eu tenho que ir,” eu disse brevemente. “Falo com você mais tarde.”
“Posso ser bem honesta, querida? Eu sei que você está preocupada com esse cara com máscara de esqui. Não me odeie, mas eu acho que a única razão para você estar tentando tanto colocar a culpa no Elliot é porque você não quer que seja o Patch. Você racionaliza tudo e isso me assusta.”
Eu estava sem palavras. “Racionalizando? Patch não apareceu na minha porta essa manhã e me jogou contra minha casa.”
“Quer saber? Eu não devia ter dito isso. Vamos apenas esquecer, tudo bem?”
“Tudo bem,” eu disse duramente.
“Então... o que você vai fazer hoje?”
Eu coloquei a cabeça pra fora da porta, escutando minha mãe. O som de alguma coisa raspando em uma tigela vinha da cozinha. Parte de mim não via uma razão para dividir qualquer coisa com a , mas outra parte sentia-se
ressentida e confrontada. Ela queria saber meus planos? Por mim tudo bem. Não era meu problema se ela não gostasse deles. “Eu vou para Portland assim que minha mãe sair para o casamento na Praia Old Orchard.” O casamento começava às 4 da tarde e em seguida com a recepção, minha mãe não chegaria em casa antes das 9 da noite. O que me dava tempo suficiente para passar a tarde em Portland, e chegar em casa.
“Na verdade, eu estava me perguntando se talvez eu pudesse pegar emprestado o Neon. Eu não quero que minha mãe veja os quilômetros a mais no meu carro.”
“Oh, cara. Você vai espionar o Elliot não vai? Você vai bisbilhotar em Kinghorn.”
“Eu vou fazer um pouco de compras e pegar um jantar,” eu disse, pegando uns cabides e deslizei para fora do armário. Eu puxei uma blusa de manga comprida, jeans, um gorro listrado rosa e branco que eu reservava para os dias de cabelo ruim e fins-de-semana.
“E você pegar um jantar inclui parar em uma certa lanchonete que fica a algumas quadras da Kinghorn Prep? Um jantar onde Kjirsten que é-o-nome-dela costumava trabalhar?”
“Isso não é uma má ideia,” eu disse. “Talvez eu vá.”
“E você vai realmente comer, ou apenas interrogar os trabalhadores?”
“Talvez eu faça algumas perguntas. Posso pegar o Neon ou não?”
“Claro que pode,” ela disse. “Para que servem as melhores amigas? Eu até vou com você nessa pequena viagem condenada. Mas primeiro você tem que prometer que vamos acampar.”
“Esqueça. Vou de ônibus.”
“Nós vamos falar sobre a viajem depois!” falou pelo telefone antes que eu pudesse desligar.
Eu estive em Portland em várias ocasiões, mas eu não conhecia muito bem a cidade. Eu desci do ônibus armada com meu celular, um mapa e minha própria bússola interna. Os prédios eram altos, de tijolos vermelhos e esguios, bloqueando o pôr-do-sol, que brilhava abaixo de um trecho de nuvens pesadas de tempestade, deixando as ruas sob um dossel de sombras. Todas as fachadas das lojas tinham varandas e placas excêntricas do lado de fora das portas. As ruas estavam cheias com lâmpadas com chapéu-de-bruxa45 preto. Depois de vários quarteirões, as ruas congestionadas se abriram para uma área com árvores, e eu tive a vista do Kinghorn Prep. Uma catedral, uma torre de campanário e uma torre com relógio que ia além do topo das árvores.

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45 Tipo de lustre nos postes da rua.
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Eu fiquei na calçada e virei a esquina em direção à rua 32nd. O porto era apenas a algumas quadras adiante e eu tive uns vislumbres de barcos passando atrás das lojas enquanto eles vinham para as docas. No meio da rua 32nd, eu vi uma placa do Café-Restaurante Blind Joe’s. Eu puxei minhas perguntas para fora e as li pela última vez. O plano era para que não parecesse que eu estava fazendo uma entrevista oficial. Eu esperava que se eu casualmente puxasse o assunto sobre a Kjirsten com os empregados do lugar, eu poderia destrinchar alguma coisa que vários repórteres antes de mim tivessem de alguma forma perdido. Esperando que as questões permanecessem na minha memória, eu disfarçadamente joguei a lista na lixeira mais próxima.
A porta fez tocar um sininho quando eu entrei.
O chão tinha piso amarelo e branco, e as mesas foram estofadas com um azul-marinho. Fotos do porto estavam penduradas na parede. Eu me sentei em uma mesa perto da porta e tirei meu casaco.
Uma garçonete com um avental branco manchado. “Chamo-me Whitney,” ela me disse com uma voz azeda. “Bem-vinda ao Blind Joe’s. O especial de hoje é o sanduíche de atum. A sopa do dia é de lagosta.” Sua caneta estava posicionada para anotar meu pedido.
“Blid Joe’s?” eu fiz uma careta e coloquei a mão no queixo. “Por que esse nome me soa tão familiar?”
“Você lê jornais? Nós estivemos nas notícias por uma semana inteira mês passado. Quinze minutos e tudo.”
“Oh!” Eu disse de repente. “Agora me lembro. Houve um assassinato, certo? A garota não trabalhava aqui?”
“Era a Kjirsten Halverson.” Ela clicava sua caneta impacientemente.
“Você pode me trazer uma tigela daquela sopa para começar?” Eu não queria sopa de lagosta. Na verdade eu não estava nem remotamente com fome. “Isso deve ter sido difícil. Vocês duas eram amigas?”
“Droga, não. Você vai fazer o pedido ou o quê? Eu vou te contar um pequeno segredo. Se eu não trabalho, não ganho dinheiro. Se eu não ganho dinheiro, eu não pago o aluguel.”
De repente eu desejei que o garçom do outro lado da lanchonete viesse anotar meu pedido. Ele era baixo, careca até as orelhas e seu corpo tinha a forma dos paliteiros que ficavam na ponta da mesa. Seus olhos nunca chegavam a mais de um metro acima do chão. Patética como me sentiria após este fato, um sorriso amigável meu talvez fosse o suficiente para que ele derramasse toda
a história de vida da Kijirsten. “Desculpe,” eu disse para a Whitney. “Não consigo parar de pensar no assassinato. Claro que para você provavelmente seja uma novidade ultrapassada. Você deve ter repórteres por aqui o tempo todo fazendo perguntas.”
Ela me deu um olhar afiado. “Precisa de mais um tempo para olhar o menu?”
“Eu, pessoalmente, acho repórteres irritantes.”
Ela se inclinou, dobrando os braços sobre a mesa. “Eu acho clientes que demoram muito, irritantes.”
Eu dei um suspiro silencioso e abri o cardápio. “O que você recomenda?”
“Tudo aí é bom. Pergunte para o meu namorado.” Ela deu um sorriso. “Ele é o cozinheiro.”
“Falando em namorados... a Kjirsten tinha um?” Boa mudança de tema, eu disse para mim mesma.
“Corta essa,” Whitney pediu. “Você é policial? Uma advogada? Uma repórter?”
“Apenas uma cidadã preocupada.” Isso soou como uma pergunta.
“Yeah, tá bom. Seguinte. Peça um milk-shake, batatas fritas, um hambúrguer Angus, um prato de sopa, me dê vinte e cinco por cento de gorjeta e eu digo para você o que eu disse para todos os outros.”
Eu pesei minhas opções: minha mesada ou respostas. “Feito.”
“Kjirsten tava saindo com aquele garoto, o Elliot Saunders. O que saiu nos jornais. Ele estava aqui o tempo todo. Voltava com ela caminhando para o apartamento dela no final do turno.”
“Você falou alguma vez com o Elliot?”
“Eu não.”
“Você acha que a Kjirsten cometeu suicídio?”
“Como eu saberia?”
“Eu li nos jornais que um bilhete de suicídio foi encontrado no apartamento da Kjirsten, mas também havia evidências de arrombamento.”
“E?”
“Você não acha isso um pouco... estranho?”
“Se você está perguntando se eu acho que o Elliot poderia ter colocado o bilhete no apartamento dela, claro que acho. Garoto rico como ele pode conseguir qualquer coisa. Provavelmente contratou alguém para plantar o bilhete. É assim que funciona quando se tem dinheiro.”
“Eu não acho que o Elliot tem muito dinheiro.” Minha impressão sempre foi a de que o Jules é que era o endinheirado. nunca parava de divagar sobre a
casa dele. “Eu acho que ele estava na Kinghorn Prep com uma bolsa de estudos.”
“Bolsa de estudos?” ela repetiu bufando. “O que tem na água que você anda bebendo? Se o Elliot não tem tanto dinheiro, como ele comprou para a Kjirsten o apartamento? Me explica.”
Eu lutei para segurar minha surpresa. “Ele comprou um apartamento para ela?”
“Kjirsten nunca parava de falar nisso. Quase me deixou maluca.”
“Por que ele compraria um apartamento para ela?”
Whitney baixou seu olhar e me encarou, com as mãos no quadril. “Não vai me dizer que você é realmente tão boba.”
Oh. Privacidade. Intimidade. Entendi.
Eu disse, “Você sabe por que o Elliot foi transferido para fora da Kinghorn?”
“Não sabia que ele tinha sido.”
Eu driblei suas respostas com perguntas que eu ainda queria fazer, tentando retirar eles da sua memória. “Alguma vez ele encontrou com amigos aqui? Alguém além da Kjirsten?”
“Como eu me lembraria disso?” Ela rolou os olhos. “Eu pareço ter memória fotográfica?”
“Que tal um cara alto? Bem alto. Cabelo loiro e longo, bonito, roupas sob medida.”
Ela arrancou um pedaço de unha com seus dentes da frente e o colocou dentro do bolso do seu avental. “Yeah, eu me lembro desse cara. Difícil não lembrar. Todo mal-humorado e quieto. Ele veio uma ou duas vezes. Não faz muito tempo. Talvez próximo de quando a Kjirsten morreu. Eu me lembro porque nós íamos servir sanduíches de carne enlatada para o dia de St. Patrick e não consegui que ele pedisse um. Apenas me olhou como se ele fosse voar pela mesa e cortar minha garganta se eu continuasse a ler o especial do dia por ali. Mas eu acho que eu me lembro de alguma coisa. Não que eu sou intrometida, mas eu tenho ouvidos. As vezes não posso evitar ouvir algumas coisas. A última vez que o cara alto e o Elliot vieram, eles estavam debruçados na mesa falando sobre um teste.”
“Um teste de escola?”
“Como eu saberia? Pelo que pareceu, o cara alto falhou em um teste e Elliot não estava muito feliz com isso. Ele jogou sua cadeira para trás e saiu. Nem mesmo comeu seu sanduíche.”
“Eles mencionaram a Kjirsten?”
“O cara alto veio primeiro, perguntou se a Kjirsten estava trabalhando. Eu disse a ele que não, ela não estava e ele pegou seu celular. Dez minutos depois, Elliot entrou. Kjirsten sempre servia a mesa do Elliot, mas como eu disse, ela não estava trabalhando, então eu servi. Se eles falaram sobre a Kjirsten, eu não ouvi. Mas para mim, pareceu que o cara alto não queria a Kjirsten por perto.”
“Você se lembra de mais alguma coisa?”
“Depende. Você vai pedir uma sobremesa?”
“Eu acho que quero um pedaço de torta.”
“Torta? Eu te dou cinco minutos do meu precioso tempo e tudo o que você pede é uma torta? Eu pareço não ter mais nada para fazer do que bater papo com você?”
Eu olhei para a lanchonete. Estava morta. Sem contar o cara debruçado sobre o jornal no balcão, eu era a única cliente.
“Okay...” Eu olhei o cardápio.
“Você vai querer um suco de framboesa para empurrar a torta para baixo.” Ela escreveu no bloquinho. “E um cafezinho.” Mais escrita. “Estou esperando mais um adicional de vinte e cinco por cento de gorjeta com isso.”
Ela me deu um sorriso presunçoso, colocou o bloquinho no avental e gingou de volta para a cozinha. 

Capítulo Vinte e Um

Do lado de fora, o tempo tinha ficado frio. E estava garoando. Os postes de luz queimavam uma cor lúgubre e lívida que não adiantava muito contra a espessa névoa fermentando pelas ruas. Eu saí apressadamente do Blind Joe’s, grata por ter olhado a previsão do tempo mais cedo e trazido o meu guarda-chuva. Enquanto eu passava por janelas de fachada, eu vi multidões de reunindo nos bares.
Eu estava a algumas quadras do ponto de ônibus quando a sensação gelada agora-familiar beijou a minha nuca. Eu sentira na noite em que tive certeza de que alguém olhava pela janela do meu quarto, no Delphic, e novamente logo antes da sair do Victoria’s Secret usando a minha jaqueta. Eu me curvei, fingi amarrar meu cadarço, e lancei um olhar clandestino ao redor. As calçadas em ambos os lados da rua estavam vazias.
A luz do semáforo de pedestres mudou, e eu sai do meio fio. Me movendo mais rápido, eu enfiei minha bolsa de mão sob meu braço e esperei que o ônibus estivesse no horário. Eu cortei caminho por um beco atrás de um bar, passei deslizando por um amontoado de fumantes, e saí na próxima rua. Correndo devagar por uma quadra, eu desviei-me em outro beco e circulei de volta o quarteirão. A cada poucos segundos eu checava atrás de mim.
Eu escutei o ruído do ônibus, e um instante depois ele circulou a esquina se materializando da névoa. Ele diminuiu a velocidade contra o meio-fio e eu entrei nele, me dirigindo para casa. Eu era a única passageira.
Tomando um assento a diversas fileiras atrás do motorista, eu deslizei para ficar fora de vista. Ele sacudiu a manivela para fechar as portas, e o ônibus rugiu pela rua. Eu estava prestes a dar um suspiro de alivio quando recebi uma mensagem de texto da .
‘onde vc tá? ‘
‘PORTLAND, eu mandei de volta, VOCÊ? ‘
‘eu tb. numa festa com jules e o elliott vamos nos encontrar. ‘
´por que você está em portland?! ‘
Eu não esperei por sua resposta; eu liguei diretamente para ela. Falar era mais rápido. E isso era urgente.
“Bem? O que diz?” perguntou. “Está em clima para festejar?”
“A sua mãe sabe que você está numa festa em Portland com dois caras?”
“Você está começando a soar neurótica, querida.”
“Eu não acredito que você veio para Portland com o Elliot!” eu tive um pensamento submerso. “Ele sabe que você está no telefone comigo?”
“Para que ele possa ir te matar? Não, desculpa. Ele e Jules correram para Kinghorn para pegar algo, e eu estou passando o tempo sozinha. Eu podia contar com uma parceira. Ei!” gritou de fundo. “Tire as mãos, está bem? T-I-R-E. ? Não estou exatamente na melhor das áreas. Quanto mais rápido, melhor.”
“Onde você está?”
“Espera aí... está bem, o prédio do outro lado da rua diz um-sete-dois-sete. É a rua Highsmith, tenho bastante certeza.”
“Estarei aí assim que puder. Mas não vou ficar. Eu vou para casa, e você vem comigo. Pare o ônibus!” eu gritei para o motorista.
Ele pisou nos freios, e eu fui jogada contra o assento na minha frente.
“Pode me dizer onde fica Highsmith?” eu perguntei a ele assim que cheguei no começo do corredor.
Ele apontou para as janelas nos lambris do lado direito do ônibus. “O oeste daqui. Está planejando ir a pé?” Ele me observou de alto abaixo. “Porque devo avisá-la, é uma vizinhança pesada.”
Ótimo.
Eu tive que andar por apenas algumas quadras antes que soubesse que o motorista do ônibus estivera certo em me alertar. O cenário mudou drasticamente. As antiquadas fachadas foram substituídas por prédios pichados com grafite de gangues. As janelas eram negras, trancadas com barras de ferro. As calçadas eram caminhos sombrios esticando-se até a névoa.
Um som lento e retumbante era trazido pela névoa, e uma mulher empurrando uma carroça com sacos de lixo entrou à vista. Seus olhos eram passas, pequenos e redondos como contas e negros, e eles contorciam-se na minha direção numa avaliação quase predatória.
“O que temos aqui?” ela disse por um buraco onde faltava um dente.
Eu dei um passo discreto para trás e apertei a minha bolsa de mão contra mim.
“Parece um casaco, mitenes, e um bonito chapéu de lã,” ela disse. “Sempre quis pra mim um bonito chapéu de lã.” Ela pronunciava a palavra como *i+bu-ni-to.[/i]
“Olá,” eu disse, limpando minha garganta e tentando soar amigável. “Você pode por favor me dizer quanto falta para a rua Highsmith?”
Ela cacarejou.
“Um motorista de ônibus, me apontou nessa direção,” eu disse com menos confiança.
“Ele te disse que Highsmith é por aqui?” ela disse, soando irritada. “Eu sei o caminho até Highsmith, e não é por aqui.”
Eu esperei, mas ela não elaborou. “Você acha que podia me dar as direções?” eu perguntei.
“Eu tenho as direções.” Ela bateu em sua cabeça com um dedo que se assemelhava fortemente a um graveto retorcido e nodoso. “Guardo tudo aqui em cima, eu guardo.”
“Para que lado é Highsmith?” eu encorajei.
“Mas não posso te contar de graça,” ela disse em um tom censurador. “Isso vai te custar. Ninguém nunca te disse que não há nada de graça na vida?”
“Eu não tenho dinheiro algum.” Não muito, de qualquer jeito. Somente o bastante para uma passagem de ônibus para casa.
“Você tem um belo casaco quente.”
Eu olhei para baixo para o meu casaco acolchoado. Um vento gelado desordenou o meu cabelo, e pensar em tirar meu casaco mandou um fluxo de arrepios pelos meus braços. “Eu acabei de ganhar esse casaco de Natal.”
“Eu estou congelando a minha derrière aqui,” ela retrucou. “Você quer direções ou não?”
Eu não conseguia acreditar que eu estava parada aqui. Eu não conseguia acreditar que estava trocando meu casaco com uma sem-teto. tinha tantas dividas comigo que talvez ela nunca as quitasse.
Eu tirei meu casaco e observei ela coloca-lo e fechar o zíper.
Minha respiração saia como fumaça. Eu me abracei e bati meu pé, conservando a temperatura corporal. “Você pode por favor me dizer agora para que lado é Highsmith?”
“Você quer o caminho longo, ou o curto?”
“Cu-curto,” eu bati os dentes.
“Isso vai te custar também. O caminho curto tem uma taxa adicional anexada. Como eu disse, sempre quis para mim um bonito chapéu de lã.”
Eu tirei o gorro rosa e branco da minha cabeça.
“Highsmith?” eu perguntei tentando manter o tom amigável enquanto eu o passava.
“Viu aquele beco?” ela disse, apontando para trás de mim. Eu me virei. O beco estava a uma quadra e meia de distancia. “Entre nele, você sairá em Highsmith do outro lado.”
“É isso?” eu disse incredulamente. “Uma quadra?”
“A boa noticia, é que você tem uma caminhada curta. A má noticia é que não tem uma caminhada que pareça curta nesse tempo. Claro, estou bem quente agora que eu tenho um casaco e um bonito chapéu. Me dê essas mitenes, e eu mesma andarei com você até lá.
Eu olhei para baixo para as mitenes. Pelo menos as minhas mãos estavam quentes. “Eu me viro.”
O beco era escuro e entulhado com latas de lixo, caixas de papelão manchadas de água, e um calombo irreconhecível que poderia ter sido um aquecedor de água. Mas também, podia tão facilmente ser um tapete com um corpo enrolado dentro. Uma cerca alta de elo de correntes espalhava-se pela metade de baixo do beco. Eu mal conseguia escalar uma cerca de um metro e vinte num dia normal, muito menos uma de três metros. Construções de tijolo me ilhavam de ambos os lados. Todas as janelas estavam engorduradas e embarriladas.
Pisando em cima de engradados e sacos de lixo, eu fui caminhando pelo beco. Vidro quebrado era esmigalhado sob meus sapatos. Um relampejo de branco passou entre as minhas pernas, me deixando sem fôlego. Um gato. Só um gato, desaparecendo na escuridão à frente.
Eu estiquei a mão para o meu bolso para mandar uma mensagem para , com a intenção de dizer a ela que eu estava perto e para me procurar, quando eu lembrei que deixei meu celular no bolso do meu casaco. Muito bem, eu pensei. Quais as chances da mulher dos sacos te devolver seu telefone? Precisamente – de mínimas a zero.
Eu decidi que valia a pena, e enquanto eu me virava, um Sedan preto polido passou correndo pela abertura do beco. Com um brilho repentino de vermelho, as luzes do freio se acenderam.
Por razões que eu não conseguia explicar além da intuição, eu fui atraída para as sombras.
Uma porta de carro abriu e o estralar de tiros escapou. Dois tiros. A porta do carro bateu e o Sedan preto foi embora com um som agudo. Eu conseguia ouvir o meu coração martelando no meu peito, e ele se misturou com o som de pés correndo. Eu percebi um instante mais tarde de que eram os meus pés, e eu estava correndo para a boca do beco. Eu circulei a esquina e parei abruptamente.
O corpo da mulher dos sacos estava numa pilha na calçada.
Eu me apressei até lá e caí de joelhos ao lado dela. “Você está bem?” eu disse freneticamente, girando-a. Sua boca estava aberta, seus olhos de passa
ocos. Líquido negro fluía pelo casaco acolchoado que eu estivera usando há três minutos.
Eu senti vontade de pular para trás, mas me forcei a esticar a mão para dentro dos bolsos do casaco. Eu precisava ligar chamando por ajuda, mas meu telefone não estava ali.
Havia uma cabine telefônica na esquina do outro lado da rua. Eu corri até ela e disquei 192. Enquanto eu esperava pelo operador atender, eu olhei para trás para o corpo da mulher dos sacos, e foi quando eu senti a adrenalina fria me percorrer. O corpo tinha sumido.
Com uma mão tremendo, eu desliguei. O som de passos se aproximando soaram nos meus ouvidos, mas se eles estavam perto ou longe, eu não conseguia afirmar.
Clip, clip, clip.
Ele está aqui, eu pensei. O homem de máscara de esqui.
Eu enfiei algumas moedas no telefone e agarrei o receptor com ambas as mãos. Eu tentei me lembrar do número do celular do Patch. Espremendo meus olhos fechados, eu visualizei os sete números que ele tinha escrito em tinta vermelha na minha mão no dia que nos conhecemos. Antes que eu pudesse duvidar da minha memória, eu disquei os números.
“E aí?” Patch disse.
Eu quase solucei ao som da voz dele. Eu conseguia ouvir o crepitar de bolas de bilhar colidindo numa mesa de sinuca nos fundos, e eu sabia que ele estava na Bo's Arcade. Ele podia chegar aqui em quinze, talvez vinte minutos.
“Sou eu.” Eu não ousei forçar a minha voz mais que um sussurro.
?”
“Estou em P-Portland. Na esquina da Hempshire com Nantucket. Pode me pegar? É urgente.”
Eu estava amontoada no fundo da cabine telefônica, contando silenciosamente até cem, tentando permanecer calma, quando um Jipe Commander preto deslizou para o meio-fio. Patch abriu a porta da cabine telefônica e se agachou na entrada.
Ele retirou sua camada de cima – uma camiseta preta de manga longa – deixando-o com uma camiseta preta. Ele encaixou o decote da camiseta sobre a minha cabeça e um instante mais tarde empurrou meus braços pelas mangas. A camiseta me diminuía, as mangas penduradas para baixo das pontas dos meus dedos. Misturava os cheiros de fumaça, água salgada, e sabonete de menta. Algo nela enchia os lugares ocos dentro de mim com tranquilidade.
“Vamos para o carro,” Patch disse. Ele me puxou para cima, e eu enlacei meus braços ao redor do seu pescoço e enterrei meu rosto nele.
“Acho que vou passar mal,” eu disse. O mundo inclinou-se, incluindo Patch.
“Eu preciso das minhas pílulas de ferro.”
“Shh,” ele disse, me segurando contra ele. “Vai ficar tudo bem. Estou aqui agora.”
Eu consegui assentir um pouquinho.
“Vamos sair daqui.”
Outro assentimento. “Precisamos pegar a ,” eu disse. “Ela está numa festa há uma quadra.”
Enquanto Patch dirigia o Jipe pela esquina, eu escutei o eco do rangido dos meus dentes dentro da minha cabeça. Eu nunca estive tão assustada na minha vida. Vendo a mulher sem-teto morta invocou pensamentos sobre o meu pai.
Minha visão estava manchada com vermelho, e por mais que eu tentasse, eu não conseguia apagar a imagem de sangue.
“Você estava no meio de um jogo de sinuca?” eu perguntei, me lembrando do som das bolhas de bilhar colidindo nos fundos durante nossa breve conversa telefônica.
“Eu estava ganhando um condomínio.”
“Um condomínio?”
“Um daqueles presunçosos no lago. Eu teria odiado o lugar. Aqui é Hughsmith. Você tem o endereço?”
“Eu não consigo lembrar,” eu disse, sentando-me mais alta para dar uma olhada melhor pelas janelas. Todos os prédios pareciam abandonados. Não havia traço de uma festa. Não havia traço de vida, ponto.
“Está com seu celular?” eu perguntei a Patch.
Ele deslizou um Blackberry para fora de seu bolso. “A bateria está fraca. Eu não sei se aguenta uma ligação.”
Eu mandei uma mensagem de texto para a . ONDE VOCÊ ESTÁ?!
MUDANÇA DE PLANOS, ela mandou de volta. ACHO QUE O J E O E NÃO CONSEGUIRAM ACHAR O Q ELES TAVAM PROCURANDO. ESTAMOS INDO PRA CASA.
A tela ficou preta.
“Acabou,” eu disse a Patch. “Está com o carregador?”
“Comigo não.”
vai voltar para Coldwater. Você acha que pode me deixar na casa dela?”
Minutos mais tarde nós estávamos na estrada costeira, dirigindo bem junto de um penhasco logo acima do oceano. Eu já tinha passado por esse caminho antes, e quando o sol se punha, a água ficava um azul ardósia com remendos de verde-escuro onde a água refletia as sempre-vivas. Estava de noite, e o oceano era um veneno preto suave.
“Você vai me dizer o que aconteceu?” Patch perguntou.
O júri ainda não tinha decidido se eu devia ou não contar algo ao Patch. Eu podia contar a ele como, depois da mulher dos sacos ter me enganado para pegar meu casaco, atiraram nela. Eu podia contar a ele que eu achei que a bala era para mim. Então eu podia tentar explicar como o corpo da mulher dos sacos tinha desaparecido magicamente no ar.
Eu me lembrava do olhar louco que o Detetive Basso tinha me dirigido quando eu disse a ele que alguém tinha invadido meu quarto. Eu não estava com humor para revirarem os olhos e rirem de mim novamente. Não pelo Patch. Não agora.
“Eu me perdi, e a mulher dos sacos me encurralou,” eu disse. “Ela me persuadiu a tirar o meu casaco...” Eu limpei meu nariz com as costas da minha mão e funguei.
“Ela pegou o meu gorro, também.”
“O que você estava fazendo por aqui?” perguntou Patch.
“Me encontrando com a numa festa.”
Nós estávamos na metade entre Portland e Coldwater, num pedaço de estrada sumarenta e deserta, quando vapor foi lançado do capô do Jipe. Patch freiou, levando o Jipe para a beira da estrada.
“Espera aí,” ele disse, virando-se. Levantando o capô do Jipe, ele desapareceu de vista.
Um minuto mais tarde ele deixou o capô cair de volta no lugar. Roçando suas mãos na sua calça, ele veio até a minha janela, gesticulando para que eu a abaixasse.
“Más notícias,” ele disse. “É o motor.”
Eu tentei parecer informada e inteligente, mas eu tinha uma sensação de que a minha expressão parecia simplesmente vazia.
Patch levantou uma sobrancelha e disse, “Descanse em paz.”
“Não vai se mover?”
“Não a não ser que a empurremos.”
De todos os carros, ele tinha que escolher justo esse.
“Onde está o seu celular?” Patch perguntou.
“Eu perdi.”
Ele sorriu. “Deixe-me adivinhar. No bolso do seu casaco. A mulher dos sacos realmente lucrou, não foi?”
Ele explorou o horizonte. “Duas escolhas. Nós podemos pedir uma carona, ou podemos andar até a próxima saída e achar um telefone.”
Eu saí, fechando a porta com força atrás de mim. Eu chutei o pneu direito dianteiro do Jipe. Eu sabia que estava usando a raiva para mascarar o meu medo pelo que eu tinha passado hoje. Assim que eu estivesse totalmente sozinha, eu me acabaria de chorar.
“Eu acho que tem um motel46 na próxima saída. Eu c-c-chamarei um táxi,” eu disse, meus dentes rangendo ainda mais. “V-v-você espera aqui com o Jipe.”

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46 Só pra deixar claro: os móteis nos EUA não são os que a gente conhece por aqui, eles são uns hoteizinhos de estrada meio vagabundos.
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Ele deu um sorriso ligeiro, mas não pareceu divertido. “Eu não vou te deixar sair da minha vista. Você está parecendo um pouco transtornada, Anjo. Nós iremos juntos.”
Cruzando meus braços, eu enfrentei-o. De tênis, meus olhos ficavam no nível dos ombros dele. Eu fui forçada a inclinar meu pescoço para trás para encontrar os olhos dele. “Eu não vou chegar nem perto de um motel com você.” Melhor soar firme, para que eu tivesse menos chance de mudar de ideia.
“Você acha que nós dois num motel pobretão é uma combinação perigosa?”
Na verdade, sim.
Patch se reclinou contra o Jipe. “Nós podemos sentar aqui e discutir isso.” Ele espremeu seus olhos para o céu revoltoso. “Mas essa tempestade está prestes a ter sua energia renovada.”
Como se a Mãe Natureza quisesse dar seu palpite no veredicto, o céu se abriu e uma mistura espessa de chuva e granizo chegou.
Eu lancei a Patch meu olhar mais frio, então soltei um suspiro de raiva.
Como sempre, ele tinha razão. 

Capítulo Vinte e Dois

Vinte minutos depois eu e Patch chegamos encharcados na entrada de um hotel barato de beira de estrada. Eu não tinha falado nenhuma palavra para ele enquanto nós andamos rapidamente pela chuva com neve e agora eu não estava apenas ensopada, mas completamente... Enervada. A chuva caía em cascata e eu não achava que nós fossemos voltar ao Jeep em breve. O que deixava eu, Patch e um hotelzinho na mesma equação por uma indeterminada quantidade de tempo.
A porta tocou um sino quando entramos e o recepcionista ficou em pé abruptamente, espalhando migalhas de Cheetos para fora de seu colo. “O que vai ser?” ele disse, lambendo os dedos para limpar o lodo laranja. “Apenas vocês dois essa noite?”
“Nós p-p-precisamos do seu telefone emprestado,” eu disse batendo os dentes, esperando que ele entendesse meu pedido.
“Não podemos. As linhas estão fora do ar. Culpe a tempestade.”
“O que v-você quer dizer com as l-linhas estão f-fora do ar? Você tem um celular?”
O recepcionista olhou para o Patch.
“Ela quer um quarto para não fumantes,” Patch disse.
Eu virei meu rosto para o Patch. Você pirou? Eu murmurei.
O recepcionista digitou algumas teclas em seu computador. “Parece que nós temos... espere... Bingo! Um quarto king para não fumantes.”
“Vamos ficar com esse,” Patch disse. Ele olhou de lado para mim e os cantos dos seus lábios subiram. Eu estreitei os olhos.
Bem nessa hora as luzes acima de nossas cabeças piscaram e apagaram, deixando a recepção no escuro. Nós todos ficamos em silêncio por um momento antes de o recepcionista dar a volta e acender uma lanterna grande.
“Eu era escoteiro,” ele disse. “Antigamente. ‘Esteja preparado’.”
“Então você d-d-deve ter um celular?” eu disse.
“Eu tinha. Até que eu não pude mais pagar a conta.” Ele ergueu os ombros.
“O que posso dizer, minha mãe é econômica.”
A mãe dele? Ele deveria ter quarenta anos. Não que isso fosse da minha conta. Eu estava muito mais preocupada com o que minha mãe faria quando ela chegasse em casa do casamento e não me encontrasse lá.
“Como você quer pagar?” o recepcionista perguntou.
“Dinheiro,” Patch disse.
O recepcionista riu, balançando sua cabeça para cima e para baixo. “É uma forma popular de pagamento por aqui.” Ele se inclinou mais perto e disse em um tom confidencial. “Temos muitos habitantes que não querem suas atividades extracurriculares rastreadas, se é que você entende o que digo.”
A metade lógica do meu cérebro estava me dizendo que eu não podia considerar realmente passar a noite em um hotelzinho com o Patch.
“Isso é loucura,” eu disse para o Patch numa voz baixa.
“Eu sou louco.” Ele estava quase sorrindo novamente. “Por você. Quanto pela lanterna?” ele perguntou para o recepcionista.
O recepcionista procurou embaixo da mesa. “Eu tenho uma coisa ainda melhor: vela do tamanho-sobrevivência,” ele disse, colocando duas a nossa frente. Pegou um fósforo e acendeu. “São por conta da casa, sem custar nada a mais. Coloque uma no banheiro, a outra na área de dormir e vocês nunca perceberão a diferença. Eu mesmo vou jogar na caixa de fósforos. Se não houver mais nada, isso vai ser uma boa lembrança.”
“Obrigada,” Patch disse, pegando meu cotovelo e caminhou comigo pelo corredor.
No quarto 106, Patch fechou a porta atrás de nós. Ele colocou a vela na cabeceira da cama, em seguida a usou para espalhar luz. Tirando seu boné de basebol, ele chacoalhou seus cabelos como um cachorro molhado.
“Você precisa de um banho quente,” ele disse. Dando alguns passos para trás, ele enfiou a cabeça dentro do banheiro. “Parece ter um sabonete e duas toalhas.”
Ergui um pouquinho meu queixo. “Você não pode me f-forçar a ficar aqui.” Eu tinha apenas concordado em vir tão longe porque primeiro: eu não queria ficar lá fora naquele aguaceiro e segundo: eu tinha muita esperança de encontrar um telefone.
“Isso parece mais uma pergunta que uma afirmação,” Patch disse.
“Então res-responda.”
Seu sorriso maroto apareceu. “É difícil concentrar em respostas com você assim.”
Eu olhei para baixo, para a camiseta preta do Patch, molhada e agarrada ao meu corpo. Eu rocei nele ao passar e fechei a porta do banheiro entre nós.
Virando a torneira para o quente, eu tirei a camiseta do Patch e minhas roupas. Um longo fio de cabelo preto estava grudado na parede do chuveiro, eu o peguei com um pedaço de papel higiênico antes de enxaguar a parede. Então eu entrei atrás da cortina do chuveiro, vendo minha pele brilhar com o calor.
Massageando com o sabonete meus músculos ao longo do meu pescoço e descendo pelos meus ombros, eu disse a mim mesma que eu podia lidar com dormir no mesmo quarto que o Patch. Não era o arranjo mais seguro ou esperto, mas eu tinha pessoalmente visto que nada aconteceu. Além do mais, que escolha eu tinha... certo?
A metade imprudente do meu cérebro riu para mim. Eu sabia o que eu estava pensando. No começo eu tinha me sentido atraída pelo Patch por um campo de força misterioso. Agora eu estava atraída por ele por alguma coisa inteiramente diferente.
Alguma coisa com muito calor envolvido. A conexão esta noite era inevitável. Em uma escala de um a dez, isso me assustava perto dos oito. E me excitava perto dos nove.
Eu desliguei a água, saí do chuveiro e sequei minha pele. Com um olhar para minhas roupas ensopadas foi tudo que precisei para saber que eu não desejava colocá-las novamente. Talvez haja uma secadora que funcione com moedas por perto... Uma que não necessite de eletricidade. Eu suspirei, coloquei minha segunda pele regata e minha calcinha, que tinham sobrevivido à chuva.
“Patch?” eu sussurrei pela porta.
“Feito?”
“Apague a vela.”
“Feito,” ele sussurrou pela porta. Sua risada soou tão suave que poderia ter sido um sussurro.
Apagando a vela do banheiro, eu saí, encontrando uma escuridão total.
Eu podia ouvir a respiração do Patch diretamente a minha frente. Eu não queria pensar no que ele estava – ou não estava – vestindo, e eu chacoalhei minha cabeça para quebrar a imagem que estava se formando em minha mente. “Minhas roupas estão ensopadas. Eu não tenho nada para vestir.”
Eu ouvi o som de um tecido deslizando como um rodo por sua pele.
“Sorte minha.” Sua camiseta aterrisou em uma pilha molhada aos nossos pés.
“Isso é realmente embaraçoso,” eu disse a ele.
Eu podia sentir seu sorriso. Ele ficou assim, muito perto.
“Você deveria tomar banho,” eu disse. “Agora.”
“Estou cheirando tão mal assim?”
Na verdade, ele cheirava muito bem. A fumaça tinha sumido, o cheiro de menta era mais forte.
Patch desapareceu dentro do banheiro. Ele reacendeu a vela e deixou a porta entreaberta, uma luz prateada se espalhava pelo chão e subia por uma parede.
Eu escorreguei minhas costas pela parede até que eu estava sentada no chão, então encostei minha cabeça na parede. Com toda honestidade, eu não podia ficar aqui esta noite. Eu tinha que voltar para casa. Eu tinha que reportar o corpo da mulher no saco. Eu devia? Como eu deveria reportar um corpo desaparecido? Fale sobre insano – que era a direção assustadora que meus pensamentos estavam começando a tomar.
Sem querer insistir na ideia de insanidade, eu me concentrei no meu argumento original. Eu não podia ficar aqui sabendo que a estava com o Elliot, em perigo, quando eu estava salva.
Depois de um momento de consideração, eu decidi que precisava reformular aquele pensamento. Salva era um termo relativo. Enquanto o Patch estivesse por perto, eu não estava em perigo, mas isso não quer dizer que eu achava que ele agiria como meu anjo da guarda.
Imediatamente, eu desejei poder tirar o pensamento do anjo da guarda.
Invocando meu poder de persuasão, eu bani todos os pensamentos de anjos – guardiões, caídos ou de outro tipo – da minha cabeça. Eu disse a mim mesma que provavelmente eu estava ficando louca. Por tudo que eu sabia, eu tinha alucinado vendo a mulher da bolsa morrer. E eu tinha alucinado vendo as cicatrizes do Patch.
A água parou, um momento depois o Patch saiu vestindo apenas seu jeans molhado abaixo de sua cintura. Ele deixou a vela do banheiro acesa e a porta aberta. Uma cor suave brilhava pelo quarto.
Uma rápida olhada e eu podia dizer que o Patch passava várias horas da semana correndo e levantando pesos. Um corpo definido desse jeito não vinha sem suor e trabalho. De repente eu me senti embaraçada. Para não mencionar mole.
“Qual lado da cama você quer?” ele perguntou.
“Uh...”
Um sorriso matreiro. “Nervosa?”
“Não,” eu disse tão confiante quanto pude diante das circunstâncias. E as circunstâncias eram que eu estava mentindo através dos meus dentes.
“Você é uma péssima mentirosa,” ele disse, ainda sorrindo. “A pior que já vi.”
Eu coloquei minhas mãos no quadril e comuniquei um silencioso Como é?
“Venha aqui,” ele disse, me colocando em pé. Eu senti minha promessa de mais cedo sobre resistir, se derreter. Mais dez segundos ficando assim tão perto do Patch e minha defesa poderia explodir em mil pedaços.
Tinha um espelho pendurado na parede atrás dele e por cima do seu ombro eu vi as cicatrizes em ‘V’ invertido brilhando escuras em sua pele.
O meu corpo inteiro ficou rígido. Eu tentei piscar para afastar as cicatrizes, mas elas estavam lá.
Sem pensar, seu deslizei minhas mão para cima do seu peito e desci por suas costas. A ponta de um dedo roçou em sua cicatriz do lado direito.
Patch ficou tenso sob meu toque. Eu congelei, a ponta do meu dedo tremia na sua cicatriz. Eu levei um tempo para perceber que na verdade não era meu dedo que estava se mexendo, mas era eu. Eu inteira.
Eu fui sugada em uma correnteza suave e escura e tudo ficou preto. 

Capítulo Vinte e Três

Eu estava de pé no andar inferior da BO’S ARCADE com as minhas costas para a parede, encarando diversos jogos de sinuca. As janelas estavam cobertas por tábuas, e eu não conseguia afirmar se era noite ou dia. Stevie Nicks saia dos auto-falantes; a música sobre a pomba branca ferida na asa e estar à beira dos dezassete anos. Ninguém parecia surpreso pela minha aparência repentina do nada.
E então eu me lembrei que não estava usando nada além de uma camisola e calcinha. Não sou tão vaidosa assim, mas parada numa multidão contendo inteiramente o sexo oposto, minhas partes mal cobertas, e ninguém nem ao menos olhou para mim? Algo estava... estranho.
Eu me belisquei. Perfeitamente viva, pelo que eu podia afirmar.
Acenando uma mão para afastar a nuvem enevoada de fumaça de cigarro, eu avistei Patch do outro lado do cômodo. Ele estava sentado em uma mesa de pôquer, recuado, segurando uma mão de cartas perto de seu peito.
Eu andei descalça pelo cômodo, cruzando meus braços sobre meu peito, me certificando de me manter coberta. “Podemos conversar?” eu sibilei em seu ouvido. Havia uma característica enevoada a minha voz. Entendível, já que eu não fazia ideia como eu fora parar no Bo’s. Um instante eu estava no motel, e a seguir eu estava aqui.
Patch empurrou uma pilha pequena de fichas de pôquer na pilha no centro da mesa.
“Tipo talvez agora?” eu disse. “É meio urgente...” Eu dissipei quando o calendário na parede capturou meu olhar. Era oito meses atrás, mostrando Agosto do ano passado. Logo antes de eu começar meu primeiro ano. Meses antes de eu conhecer o Patch. Eu disse a mim mesma que era um erro, que quem quer que estivesse comandando a arrancação dos meses velhos tinha se atrasado, mas ao mesmo tempo eu considerei breve e relutantemente onde devia estar. E eu não estava.
Eu arrastei uma cadeira da próxima cadeira e a coloquei ao lado de Patch. “Ele está segurando um cinco de espadas, um nove de espadas, o ás de copas...” Eu parei quando percebi que ninguém estava prestando atenção. Não, não era isso. Ninguém podia me ver.
Passos avançaram com dificuldade escada abaixo pelo cômodo, e o mesmo caixa que tinha ameaçado me jogar para fora na primeira vez que eu fora na arcada apareceu no fim da escadaria.
“Alguém lá em cima quer dar uma palavrinha com vocês,” ele disse ao Patch.
Patch levantou suas sobrancelhas, transmitindo uma pergunta silenciosa.
“Ela dava seu nome,” o caixa disse apologeticamente. “Eu perguntei algumas vezes. Eu disse à ela que você estava num jogo particular, mas ela não ia embora. Eu posso mandá-la embora se quiser.”
“Não. Mande ela descer.”
Patch jogou sua mão, reuniu suas fichas, e empurrou sua cadeira. “Estou fora.” Ele andou para a mesa de sinuca mais perto da escada, descansou contra ela, e deslizou suas mãos para dentro de seus bolsos.
Eu o segui pelo cômodo. Eu estalei meus dedos na frente do rosto dele. Eu chutei suas botas. Eu bati minha palma contra seu peito. Ele não recuou, não se moveu.
Passos leves soaram na escada, ficando mais perto, e quando a Senhorita Greene saiu da escada escurecida, eu experimentei um instante de confusão. Seu cabelo loiro estava caído até sua cintura e lambido. Ela estava usando uma calça jeans pintada e uma regata rosa, e ela estava descalça. Vestida dessa maneira, ela parecia ainda mais perto da minha idade. Ela estava chupando um pirulito.
O rosto de Patch é sempre uma máscara, e em qualquer instante eu não faço ideia do que ele está pensando. Mas assim que travou os olhos na Senhorita Greene, eu soube que ele estava surpreso. Ele se recuperou rapidamente, todas as emoções se funilando à medida que seus olhos ficavam protetores e prudentes. “Dabria?”
Meu coração bateu numa cadência mais rápida. Eu tentei juntar meus pensamentos, mas tudo em que conseguia pensar era, se realmente era oito meses atrás, como a Senhorita Greene e o Patch se conheciam? Ela não tinha um trabalho na escola ainda. E por que ele estava chamando-a por seu nome?
“Como tem passado?” A Senhorita Greene – Dabria – perguntou com um sorriso recatado, jogando o pirulito no lixo.
“O que você está fazendo aqui?” Os olhos de Patch ficaram ainda mais observadores, como se ele não achasse que “é pegar ou largar” se aplicava à Dabria.
“Eu escapuli.” Seu sorriso se contorceu de um lado. “Eu tinha que vê-lo novamente. Eu estive tentando por muito tempo, mas a segurança – bem, você
sabe. Não é exatamente relaxada. O seu povo e o meu – nós não devíamos nos misturar. Mas você sabe disso.”
“Vir aqui foi uma má ideia.”
“Eu sei que faz um tempo, mas eu estava esperando por uma reação ligeiramente mais amigável,” ela disse, empurrando seus lábios em um beicinho.
Patch não respondeu.
“Eu não parei de pensar em você.” Dabria esmaeceu sua voz para um tom baixo e sexy e deu um passo para mais perto de Patch. “Não foi fácil descer aqui. Lucianna está inventando motivos pela minha ausência. Estou arriscando o futuro dela, assim como o meu. Você não quer pelo menos ouvir o que tenho a dizer?”
“Fala.” as palavras de Patch não tinham nenhum fragmento de verdade.
“Eu não desisti de você. Esse tempo todo –“ Ela dissipou e pestanejou uma amostra repentina de lágrimas. Quando ela falou novamente, sua voz estava mais contida, mas ainda guardava uma nota vacilante. “Eu sei como você pode conseguir suas asas de volta.”
Ela sorriu para Patch, mas ele não retornou o sorriso.
“Assim que conseguir suas asas de volta, você pode voltar pra casa,” ela disse, falando mais confiantemente. “Tudo será como era antes.
“Nada mudou. Não mesmo.”
“Qual a pegadinha?”
“Não tem pegadinha. Você tem que salvar uma vida humana. Muito criterioso, considerando o crime que o baniu para cá em primeiro lugar.”
“Que nível eu serei?”
Toda confiança dispersou-se dos olhos de Dabria, e eu tive a sensação que ele fizera a única questão que ela esperava evitar. “Eu acabei de te contar como conseguir as suas asas de volta,” ela disse, soando um tanto condescendente. “Eu acho que mereço um obrigado –”
“Responda a pergunta.” Mas seu sorriso carrancudo me dizia que ele já sabia. Ou tinha um belo palpite. Qualquer que fosse a resposta de Dabria, ele não iria gostar.
“Tudo bem. Você será um anjo da guarda, está bom?”
Patch inclinou sua cabeça para trás e riu suavemente.
“Qual o problema de ser um anjo da guarda?” Dabria exigiu. “Por que não é bom o bastante?”
“Eu tenho algo melhor em progresso.”
“Me escuta, Patch. Não há nada melhor. Você está se enganando. Qualquer outro anjo caído iria se jogar na chance de conseguir suas asas de volta e se tornar um anjo da guarda. Por que não você?” Sua voz estava abafada com estupefação, irritação, rejeição.
Patch levantou-se da mesa de sinuca. “Foi bom te ver novamente, Dabria. Tenha uma boa viagem de volta.”
Sem aviso, ela curvou seus punhos na camiseta dele, puxou-o para perto, e esmagou um beijo em sua boca. Muito lentamente o corpo de Patch se virou na direção dela, sua posição suavizando. Suas mãos subiram e roçaram os braços dela.
Eu engoli secamente, tentando igr a facada de ciúmes e confusão no meu coração. Parte de mim queria se virar e chorar, parte de mim queria marchar até lá e começar a gritar. Não que fosse fazer algum bem. Eu estava invisível. Obviamente a Senhorita Greene... Dabria... quem quer que ela fosse... e Patch tinham um passado romântico juntos. Eles ainda estavam juntos agora – no futuro? Ela tinha se candidatado a um emprego na Escola Coldwater para ficar mais perto do Patch? Era por isso que ela estava tão determinada a me assustar para ficar longe dele?
“Eu devia ir,” disse Dabria, se desenvencilhando. “Eu já fiquei tempo demais. Eu prometi a Lucianna que eu me apressaria.” Ela abaixou sua cabeça contra o peito dele. “Sinto saudade,” ela sussurrou. “Salve uma vida humana, e você terá suas asas novamente. Volte para mim,” ela implorou. “Venha para casa.” Ela se desenvencilhou repentinamente. “Eu tenho que ir. Nenhum dos outros pode descobrir que eu desci aqui. Eu te amo.”
Enquanto Dabria se virava, a ansiedade sumiu de seu rosto. Uma expressão de confiança astuta a substituiu. Era o rosto de alguém que tinha blefado inteiramente em uma mão de cartas difícil.
Sem aviso, Patch a capturou pelo punho.
“Agora me diga por que realmente você está aqui,” ele disse.
Eu estremeci pela influência oculta e sombria no tom de Patch. Para um forasteiro, ele parecia perfeitamente calmo. Mas para qualquer um que o conhecia a algum tempo, era óbvio. Ele estava mandando um olhar para Dabria que dizia que ela tinha cruzado uma linha e era melhor para ela saltitar para trás dela – agora.
Patch a dirigiu em direção ao bar. Ele a plantou numa banqueta de bar e deslizou para a do lado. Eu tomei a próxima de Patch, inclinando-me para ouvi-lo sobre a música.
“O que você quer dizer, por que estou aqui?” Dabria gaguejou. “Eu te disse –”
“Você está mentindo.”
Sua boca abriu. “Eu não acredito – você acha –”
“Me conte a verdade, agora mesmo,” disse Patch.
Dabria hesitou antes de responder. Ela lançou-lhe um olhar poderoso, então disse, "Tudo bem. Eu sei o que está planejando fazer.”
Patch riu. Era uma risada que dizia, eu tenho muitos planos. A qual você está se referindo?
“Eu sei que você ouviu rumores sobre O Livro de Enoque. Eu também sei que você acha que pode fazer a mesma coisa, mas não pode.”
Patch dobrou seus braços no bar. “Eles te mandaram aqui para me persuadir a escolher um curso diferente, não mandaram?” Um sorriso apareceu nos olhos dele. “Se eu sou uma ameaça, os rumores devem ser verdade.”
“Não, não são. São rumores.”
“Se aconteceu uma vez, pode acontecer novamente.”
“Nunca aconteceu, Você ao menos se deu ao trabalho de ler O Livro de Enoque antes de cair?” ela desafiou. “Você sabe exatamente o que diz, palavra sagrada por palavra?”
“Talvez você possa me emprestar a sua cópia.”
“Isso é blasfêmia! Você está proibido de lê-lo,” ela gritou. “Você traiu todos os anjos no paraíso quando caiu.”
“Quantos deles sabem do que estou atrás?” ele perguntou. “Sou muita ameaça?”
Ela jogou sua cabeça de lado a lado. “Não posso te dizer isso. Eu já te disse mais do que deveria.”
“Eles vão tentar me impedir?”
“Os anjos vingadores vão.”
Ele olhou para ela com propósito. “A não ser que eles achem que você me persuadiu.”
“Não me olhe desse jeito.” Ela soava como se estivesse colocando toda sua coragem em soar firme. “Eu não mentirei para protegê-lo. O que você está tentando fazer é errado. Não é natural.”
“Dabria.” Patch falou o nome dela como uma ameaça suave. Tanto faz se ele a tivesse pego pelo braço, torcendo-o atrás de suas costas.
“Não posso te ajudar,” ela disse com uma convicção silenciosa. “Não desse jeito. Tire isso da sua cabeça. Torne-se um anjo da guarda. Foque-se nisso e esqueça O Livro de Enoque.”
Patch plantou seus cotovelos no bar, radiando pensamentos. Após um momento ele disse, “Diga a eles que conversamos, e eu mostrei um interesse em me tornar um anjo da guarda.”
“Interesse?” ela disse, um tantinho incredulamente.
“Interesse,” ele repetiu. “Diga a eles que eu pedi um nome. Se eu vou salvar uma vida, eu preciso saber quem está no topo da sua lista de partida. Eu sei que você tem privilégios a essa informação como anjo da morte.”
“Essa informação é sagrada e particular, e não previsível. Os eventos nesse mundo mudam de instante para instante dependendo das escolhas humanas –“
“Um nome, Dabria.”
“Prometa-me que esquecerá O Livro de Enoque primeiro. Me dê sua palavra.”
“Você confiaria na minha palavra?”
“Não,” ela disse, “eu não confiaria.”
Patch riu friamente e, pegando um palito de dentes do ministrador, andou na direção da escada.
“Patch, espera –” ela começou. Ela pulou da banqueta do bar. “Patch, por favor espere!”
Ele olhou sobre seu ombro.
,” ela disse, então imediatamente prendeu suas mãos sobre sua boca.
Houve uma confusão fraca na expressão do Patch – um franzir de testa de descrença misturado com irritação. O que não fazia sentido, já que, se o calendário na parede estava correto, nós ainda não tínhamos nos conhecido. Meu nome não devia ter estimulado familiaridade. “Como ela vai morrer?” ele perguntou.
“Alguém quer matá-la.”
“Quem?”
“Eu não sei,” ela disse, cobrindo suas orelhas e chocalhando sua cabeça. "Há tanto barulho e comoção aqui embaixo. Todas as imagens ficam borradas juntas, elas vêm rápidas demais, eu não consigo ver claramente. Eu preciso ir para casa. Eu preciso de paz e calma.”
Patch enfiou uma mecha do cabelo de Dabria atrás de sua orelha e olhou para ela persuasivamente. Ela estremeceu ao toque dele, então assentiu e fechou seus olhos. “Eu não consigo ver... eu não vejo nada… é inútil.”
“Quem quer matar ?” Patch encorajou.
“Espere, eu a vejo,” disse Dabria. Sua voz ficou ansiosa. “Há uma sombra atrás dela. É ele. Ele está seguindo-a. Ela não o vê... mas ele está bem ali. Por
que ela não o vê? Por que ela não está correndo? Não consigo ver o rosto dele, está nas sombras...”
Os olhos de Dabria se abriram de supetão. Ela inspirou rápida e distintamente.
“Quem?” Patch disse.
Dabria curvou suas mãos contra sua boca. Ela tremia enquanto levantava seus olhos até os de Patch.
“Você,” ela sussurrou.
Meu dedo se deslocou da cicatriz de Patch e a conexão foi quebrada. Eu levei um tempo para me reorientar, então eu não estava pronta para o Patch, que me arrastou até a cama num instante. Ele prendeu meus punhos sobre a minha cabeça.
“Você não devia ter feito isso.” Havia uma raiva controlada em seu rosto, escura e em fogo brando. “O que você viu?”
Eu levantei meu joelho e o perfurei nas costelas. “Sai–de–cima–de–mim!”
Ele deslizou até os meus quadris, sentando de pernas abertas em cima deles, eliminando o uso das minhas pernas.
Com meus braços ainda esticados sobre a minha cabeça, eu não podia fazer mais do que me contorcer sobre seu peso.
"Saia–de–cima–de–mim–ou–eu–vou–gritar!”
“Você já está gritando. E não vai causar tumulto algum nesse lugar. Está mais para um puteiro do que para um motel.” Ele lançou um sorriso duro que era pura letalidade nos cantos. “Última chance, . O que você viu?”
Eu estava lutando contra as lágrimas. Meu corpo humano zumbiu com uma emoção tão forasteira que eu não conseguia nem nomeá-la. “Você me enoja!” eu disse. “Quem é você? Quem realmente é você?”
Sua boca ficou ainda mais carrancuda. “Estamos chegando perto.”
“Você quer me matar!”
O rosto de Patch não expressava nada, mas seus olhos estavam frios.
“O Jipe não morreu novamente hoje à noite, morreu?” eu disse. “Você mentiu. Você me trouxe aqui para que pudesse me matar. Foi o que a Dabria disse que você queria fazer. Bem, o que está esperando?” Eu não fazia ideia de onde estava indo com isso, e eu não ligava. Eu estava cuspindo palavras numa tentativa de manter o meu horror à margem. “Você esteve tentando me matar o tempo todo. Desde o começo. Você vai me matar agora?” Eu o encarei, firme e sem piscar, tentando impedir as minhas lágrimas de se derramarem enquanto eu me lembrava do dia fatídico em que ele tinha entrado na minha vida.
“É tentador.”
Eu me contorci debaixo dele. Eu tentei rolar para a minha direita, então para a minha esquerda. Eu finalmente percebi que estava desperdiçando um monte de energia e parei. Patch assentou seus olhos em mim. Eles estavam mais pretos do que eu já os tinha visto.
“Aposto que gosta disso,” eu disse.
“Seria uma aposta certeira.”
Eu senti meu coração martelando claramente até os meus dedões do pé. “Simplesmente faça isso,” eu disse em uma voz desafiadora.
“Te matar?”
Eu assenti. “Mas primeiro eu quero saber por que. De todos os bilhões de pessoas por aí, por que eu?"
“Genes ruins.”
“É isso? Essa é a única explicação que eu recebo?”
“Por ora.”
“O que isso quer dizer?” Minha voz subiu novamente. “Eu consigo o restante da história quando você finalmente surtar e me matar?”
“Eu não tenho que surtar para te matar. Se eu a quisesse morta há cinco minutos, você estaria morta há cinco minutos.”
Eu engoli seco com o pensamento não-tanto-animador.
Ele roçou seu dedão sobre a minha marca de nascença. O toque dele era enganosamente macio, o que tornava isso ainda mais doloroso de aguentar.
“E quanto à Dabria?” eu perguntei, ainda respirando arduamente. “Ela é a mesma coisa que você é, não é? Ambos são – anjos.” Minha voz rachou na palavra.
Patch girou ligeiramente para longe dos meus quadris, mas manteve suas mãos nos meus punhos. “Se eu soltar, você vai me escutar?”
Se ele soltasse, eu ia correr a toda até a porta. “Por que você liga se eu fugir? Você simplesmente me arrastará de volta para cá.”
“É, mas isso iria causar uma baderna.”
“A Dabria é sua namorada?” Eu conseguia sentir cada levantamento e caída irregulares do meu peito. Eu não tinha certeza se queria ouvir sua resposta. Não que importasse.
Agora que eu sabia que Patch queria me matar, era ridículos eu ao menos ligar.
“Foi. Foi há muito tempo, antes de eu sucumbir ao lado negro.” Ele deu um sorriso duro, tentando debochar. “Foi um erro também.” Ele balançou-se para trás em seus calcanhares, lentamente me soltando, testando para ver se eu
lutaria. Eu fiquei deitada no colchão, respirando arduamente, meus cotovelos me propulsionando. Três contagens passaram, e eu me arremessei contra ele com toda a força que eu tinha.
Eu me empurrei contra seu peito, mas fora cambalear ligeiramente para trás, ele não se moveu. Eu me arrastei para fora de debaixo dele e levei meus punhos até ele. Eu martelei em seu peito até que os fundos dos meus punhos começassem a latejar.
“Acabou?” ele perguntou.
“Não!” Eu desloquei meu cotovelo até sua coxa. “Qual o seu problema? Você não sente nada?”
Eu fiquei de pé, encontrei meu equilíbrio no colchão, e chutei-o o mais forte que pude no estômago.
“Você tem mais um minuto,” ele disse. “Tire sua raiva do seu sistema. Então eu assumirei.”
Eu não sabia o que ele queria dizer com “assumir”, e eu não queria descobrir. Eu dei um salto e corri para fora da cama, com a porta em vista. Patch me agarrou no ar e me empurrou contra a parede. Suas pernas estavam niveladas com as minhas, de frente a frente pelo comprimento das nossas coxas.
“Eu quero a verdade,” eu disse, lutando para não chorar. “Você foi para a escola para me matar? Esse foi o seu objetivo desde o início?”
Um músculo na mandíbula de Patch pulou. “Sim.”
Eu enxuguei uma lágrima que ousou escapar. “Você está se vangloriando por dentro? É sobre o que isso é, não é? Me fazer confiar em você para que você possa jogar isso na minha cara!” Eu sabia que estava sendo irracionalmente irada. Eu deveria estar aterrorizada e frenética. Eu devia estar fazendo tudo em meu poder para escapar. A parte mais irracional de tudo era que eu ainda não queria acreditar que ele me mataria, e não importava quanto eu tentasse, eu não conseguia sufocar aquela mancha ilógica de verdade.
“Eu entendo que você esteja brava –” disse Patch.
“Eu estou devastada!” eu gritei.
Suas mãos deslizaram para o meu pescoço, pelando quente. Pressionando seus dedões gentilmente na minha garganta, ele inclinou minha cabeça para trás. Eu senti seus lábios virem contra os meus tão duramente que ele impediu de sair qualquer nome que eu estivera prestes a chamá-lo. Suas mãos caíram para os meus ombros, roçaram pelos meus braços, e foram descansar na parte debaixo das minhas costas. Pequenos tremores de pânico e prazer me atravessaram. Ele tentou me puxar contra ele, e eu o mordi no lábio.
Ele lambeu seu lábio com a ponta de sua língua. “Você acabou de me morder?”
“Tudo é uma piada para você?” eu perguntei.
Ele tocou levemente sua língua em seu lábio novamente. “Não tudo.”
“Como o quê?”
“Você.”
A noite toda parecia desequilibrada. Era difícil ter um confronto com alguém tão indiferente quanto Patch. Não, não indiferente. Perfeitamente controlado. Até a última célula de seu corpo.
Eu ouvi uma voz na minha mente. Relaxe. Confie em mim.
“Aimeudeus,” eu disse com uma explosão de claridade. “Você está fazendo isso novamente, não está? Mexendo com a minha mente.” Eu me lembrava do artigo que eu tinha pegado quando pesquisei no Google anjos caídos. “Você pode colocar mais do que palavras na minha cabeça, não pode? Você pode colocar imagens – imagens realmente reais – nela.”
Ele não negou.
“O Arcanjo,” eu disse, finalmente entendendo. “Você tentou me matar naquela noite, não foi? Mas algo deu errado. Então você me fez achar que meu celular estava sem bateria, para que eu não pudesse ligar para a . Você planejou me matar na viagem para casa? Eu quero saber como você está fazendo eu ver o que você quer!”
Seu rosto estava cuidadosamente sem expressão. “Eu coloco as palavras e imagens aí, mas depende de você se acredita nelas. É um enigma. As imagens sobrepõem a realidade, e você tem que descobrir qual é real.”
“Esse é um poder especial de anjo?”
Ele balançou sua cabeça. “Poder de anjo caído. Qualquer outro tipo de anjo não invadiria a sua privacidade, mesmo eles podendo.”
Porque os outros anjos eram bons. E Patch não era.
Patch rodeou suas mãos contra a parede atrás de mim, uma de cada lado da minha cabeça. “Eu coloquei um pensamento na mente do Treinador para refazer o mapa de assentos porque eu precisava me aproximar de você. Eu fiz você pensar que caiu do Arcanjo porque queria te matar, mas não consegui prosseguir com isso. Eu quase te matei, mas eu parei. Eu me contentei em te assustar, ao invés. Então eu te fiz pensar que seu celular estava sem bateria porque eu queria te dar uma carona para casa. Quando entrei na sua casa, eu peguei uma faca. Eu ia te matar então.” Sua voz suavizou-se. “Você me fez mudar de ideia.”
Eu suguei uma respiração profunda. “Eu não te entendo. Quando eu te disse que meu pai foi assassinado, você soou genuinamente desgostoso. Quando você conheceu a minha mãe, você foi bonzinho.”
“Bonzinho,” Patch repetiu. “Vamos manter isso entre você e eu.”
Minha cabeça girou mais rápido, e eu consegui sentir a minha pulsação batendo nas minha têmporas.
Eu tinha sentido essa pânico golpeando o meu coração antes. Eu precisava das minhas pílulas de ferro. Ou isso, ou o Patch estava me fazendo pensar que eu precisava.
Eu inclinei meu queixo para cima e espremi meus olhos. “Cai fora da minha mente. Agora mesmo!”
“Não estou na sua mente, .”
Eu me inclinei para frente, abraçando os meus joelhos, sugando ar. “Sim, você está. Eu te sinto. Então é assim que você vai fazer? Me sufocar?”
Suaves sons de disparo ecoaram nos meus ouvidos, e um preto embaçado enquadrou a minha visão. Eu tentei encher meus pulmões, mas era como se o ar tivesse desaparecido.
O mundo inclinou-se, e Patch deslizou para a lateral na minha visão. Eu espalmei minha mão na parede para firmar o meu equilíbrio. Quanto mais eu tentava inalar, mais apertada a minha garganta contraia-se.
Patch moveu-se em direção a mim, mas eu estiquei a minha mão. “Saia!”
Ele inclinou um ombro na parede e me encarou, sua boca firme com preocupação.
“Saia–de–perto–de–mim,” eu arfei.
Ele não saiu.
“Eu–não–consigo–respirar!” eu sufoquei, arranhando a parede com uma mão, agarrando com força a minha garganta com a outra.
De repente Patch me levantou e carregou até a cadeira do outro lado do quarto. “Coloque sua cabeça entre seus joelhos,” ele disse, guiando a minha cabeça para baixo.
Eu estava com a minha cabeça abaixada, respirando rapidamente, tentando forçar ar para dentro dos meus pulmões. Muito lentamente eu senti o oxigênio se arrastar para dentro do meu corpo.
“Melhor?” Patch perguntou após um minuto.
Eu assenti, uma vez.
“Você tem pílulas de ferro com você?”
Eu balancei minha cabeça.
“Mantenha sua cabeça abaixada e tome respirações longas e profundas.”
Eu segui suas instruções, sentindo um grampo afrouxar ao redor do meu peito.
“Obrigada,” eu disse silenciosamente.
“Ainda não confia nos meus motivos?”
“Se quiser que eu confie em você, me deixe tocar nas suas cicatrizes novamente.”
Patch me estudou silenciosamente por um longo momento. “Essa não é uma boa ideia.”
“Por que não?”
“Não posso controlar o que você vê.”
“Essa é meio que a razão.”
Ele esperou um pouco antes de responder. Sua voz estava baixa, as emoções não rastreáveis. “Você sabe que estou escondendo coisas.” Havia uma pergunta anexada a isso.
Eu sabia que Patch vivia uma vida de portas fechadas e segredos guardados. Eu não era presunçosa o bastante para achar que até mesmo metade deles girava ao meu redor.
Patch vivia uma vida diferente fora da qual ele dividia comigo. Mais de uma vez eu especulara qual sua outra vida poderia ser. Eu sempre tive a impressão que quanto menos eu soubesse sobre ela, melhor.
Meu lábio tremeu. “Me dê uma razão para confiar em você.”
Patch sentou no canto da cama, o colchão afundando sob seu peso.
Ele se inclinou para frente, descansando seus antebraços nos joelhos. Suas cicatrizes estavam em plena visão, a luz de velas dançando sombras misteriosas sobre a superfície delas. Os músculos em suas costas se acentuaram, então relaxaram. “Vá em frente,” ele disse silenciosamente. “Tenha em mente que as pessoas mudam, mas o passado não.”
De repente eu não estava tão certa de que queria isso. Em quase todos os níveis, Patch me aterrorizava. Mas no fundo, eu não achava que ele ia me matar. Se fosse isso que ele quisesse, ele já teria feito isso. Eu espiei suas cicatrizes ameaçadoras. Confiar no Patch parecia muito mais confortável do que deslizar para o seu passado novamente e não ter ideia do que eu poderia achar.
Mas se eu recuasse agora, Patch saberia que eu morria de medo dele. Ele estava abrindo uma das portas fechadas só para mim e só porque eu tinha pedido isso. Eu não podia fazer um pedido tão pesado assim, então mudar de ideia.
“Eu não ficarei presa lá para sempre, ficarei?” eu perguntei.
Patch deu uma risada curta. “Não.”
Convocando a minha coragem, eu sentei na cama ao lado dele. Pela segunda vez hoje à noite, meu dedo roçou no sulco aguçado da cicatriz dele. Um cinza brumoso lotou a minha visão, indo das beiradas para dentro. As luzes se apagaram. 

Capítulo Vinte e Quatro

Eu estava de costas, minha camisola secando a umidade embaixo de mim, espadas de grama pinicando a pele do meu braço. A lua acima não era nada mais que prateada, um sorriso inclinado para o lado. Tirando o estrondo de um trovão distante, tudo estava quieto.
Eu pisquei diversas vezes seguida, ajudando meus olhos se acostumarem rapidamente à luz escassa. Quando virei minha cabeça para o lado, um arranjo simétrico de galhos curvos saindo da grama se solidificou na minha visão. Vagarosamente eu fiquei em pé. Eu não podia tirar os olhos de duas órbitas negras que me encaravam um pouco acima dos galhos.
Minha mente trabalhou para formar uma imagem familiar. Então, com um horrível lampejo de reconhecimento, eu soube. Eu estava deitada próxima a um esqueleto. Eu rastejei para trás até dar um encontrão com uma cerca de ferro. Eu empurrei o momento confuso e recapitulei minha última memória. Eu tinha tocado as cicatrizes do Patch. Onde quer que eu esteja, era algum lugar dentro da sua memória.
Uma voz, masculina e vagamente familiar, carregada através da escuridão, cantava uma melodia baixinho. Virando-me em sua direção, eu vi um labirinto de lápides alinhadas como dominós no meio da neblina. Patch estava agachado em cima de uma. Ele usava uma Levi’s e uma camiseta, mesmo a noite não estando quente.
“No luar com os mortos?” falou a voz familiar. Era rouca, cheia e Irlandesa. Rixon. Ele encostou-se a uma lápide oposta ao Patch, observando-o. Ele acariciou seu lábio superior com o dedo. “Deixe-me adivinhar. Você tem em mente possuir os mortos? Eu não sei,” ele disse, abanando a cabeça. “Vermes se contorcendo nas suas órbitas... e em seus outros orifícios, poderia estar levando as coisas um pouco longe demais.”
“É por isso que eu o mantenho por perto, Rixon. Sempre vendo o lado bom das coisas.”
“Cheshvan começa essa noite,” Rixon disse. “O que você está fazendo vagando pelo cemitério?”
“Pensando.”
“Pensando?”
“Um processo onde eu uso meu cérebro para tomar uma decisão racional.” Os cantos da boca do Rixon se inclinaram para baixo. “Estou começando a me
preocupar com você. Venha. Já é hora de ir. Chaucey Langeais e Barnabas esperam. A lua vai mudar a meia-noite. Eu confesso que estou de olho em umas apostas na cidade.”
Ele deu um ronronado de gato. “Eu sei que você gosta deles vermelhos, mas eu gosto delas justas, e depois que eu estiver em um corpo, eu pretendo cuidar de uns assuntos mal resolvidos com uma loira que estava de olho em mim mais cedo.”
Quando Patch não se mexeu, Rixon disse, “Você está louco? Nós temos que ir. Chauncey jurou fidelidade. Não te lembra nada? Que tal isso. Você é um anjo caído. Você não pode sentir nada. Até esta noite. As próximas duas semanas são um presente do Chauncey para você. Dado a contragosto, você mente,” ele adicionou um sorriso conspirador.
Patch deu um olhar de soslaio para Rixon. “O que você sabe sobre O Livro de Enoch?”
“Tanto quanto qualquer anjo caído: quase nada.”
“Disseram-me que tem uma história no O Livro de Enoch. Sobre um anjo caído que virou humano.”
Rixon se dobrou com uma risada. “Você pirou de vez?” Ele juntou as bordas das mãos, fazendo um livro com elas. “O Livro de Enoch é uma história para criança dormir. E uma das boas, pela aparência dela. Manda você direto para a terra dos sonhos.”
“Eu quero um corpo humano.”
“É melhor você ficar feliz com duas semanas e um corpo Nephil. Meio-humano é melhor que nada. Chauncey não pode desfazer o que já foi feito. Ele fez um juramento e tem que viver com isso. Assim como o ano passado. E o ano antes desse –”
“Duas semanas não são suficientes. Eu quero ser humano. Permanentemente.” Os olhos de Patch cortaram para Rixon, desafiando-o a rir novamente.
Rixon passou suas mãos no cabelo. “O Livro de Enoch é um conto de fadas. Nós somos anjos caídos, não humanos. Nunca fomos humanos e nunca vamos ser. Fim da história. Agora, chega de vagar por aí e me ajude a descobrir como chegar em Portland.” Ele esticou o pescoço para trás e olhou para o céu escuro.
Patch desceu da lápide. “Eu vou virar humano.”
“Claro, camarada, claro que você pode.”
O Livro de Enoch diz que eu tenho que matar meu servo Nephil. Eu tenho que matar o Chauncey.”
“Não, você não tem,” Rixon disse com um pouco de impaciência. “Você tem que possuí-lo. Um processo no qual você pega seu corpo e usa como se fosse seu. Sem querer cortar seu barato, mas você não pode matar o Chauncey. Nephilim não podem morrer. Você pensou nisso? Se você pudesse matá-lo, você não o possuiria.”
“Se eu o matar, eu viro humano e não vou precisar possuí-lo.”
Rixon apertou o canto de dentro dos olhos como se ele soubesse que seu argumento estava caindo em orelhas surdas e isso estava lhe dando dor de cabeça. “Se nós pudéssemos matar um Nephilim, nós já teríamos achado um jeito a essa altura. Sinto muito em ter que te dizer, mas se eu não chegar logo nos braços da loira, meu cérebro vai cozinhar. E algumas outras partes do meu –“
“Duas escolhas,” Patch disse.
“E?”
“Salvar uma vida humana e se tornar um anjo da guarda, ou matar seu vassalo Nephil e se transformar em humano. Faça sua escolha.”
“Isso é mais uma porcaria do Livro de Enoch?”
“Dabria me fez uma visita.”
Os olhos de Rixon ficaram arregalados e ele soltou uma risada. “Sua psicótica ex? O que ela está fazendo aqui embaixo? Ela caiu? Ela perdeu suas asas?”
“Ela desceu para me dizer que eu posso ter minhas asas de volta se eu salvar a vida de um humano.”
Os olhos do Rixon se abriram mais. “Se você confia nela, eu digo para ir fundo. Não há nada de errado em ser um guardião. Passar seus dias mantendo os mortais longe do perigo... pode ser divertido, dependendo do mortal ao qual você foi designado.”
“Mas e se você tivesse uma escolha?” Patch perguntou.
“Sim, bem, minha resposta depende de uma grande diferença. Eu sou um bêbado... ou perdi completamente a cabeça?” Quando o Patch não riu, Rixon disse sobriamente, “Não há escolha. E aqui está o porquê. Eu não acredito no Livro de Enoch. Se eu fosse você, eu ficaria com ser guardião. Até estou pensando nesse acordo para mim. É uma pena que eu não conheça nenhum ser humano a beira da morte.”
“Jogando cartas ou boxe?”
“Cartas.”
Os olhos de Rixon cintilaram. “O que temos aqui? Um bonitão? Venha até aqui e me deixe te dar uns tapas apropriadamente.” Ele agarrou o Patch em
volta do pescoço, imobilizando-o na dobra do cotovelo, Mas Patch o pegou pelo pulso e arrastou o Rixon pela grama, onde eles se revezaram numa troca de socos.
“Tudo bem, tudo bem!” Rixon berrou, jogando suas mãos para cima em rendição. “Só porque eu não posso sentir um lábio sangrando não quer dizer que eu quero passar o resto da noite andando por aí com um.” Ele piscou. “Não vai melhorar minhas chances com as senhoritas.”
“E um olho roxo?”
Rixon passou seus dedos nos olhos, sondando. “Você não fez isso!” ele disse, balançando o punho para o Patch.
Eu tirei os dedos das cicatrizes do Patch. A pele da minha nuca formigou e meu coração batia muito mais rápido. Patch olhou para mim e nos seus olhos, tinha uma sombra de incerteza.
Eu fui forçada a aceitar que talvez, agora não era hora para contar com a parte lógica do meu cérebro. Talvez essa fosse uma daquelas horas onde eu precisava sair dos limites. Parar de jogar de acordo com as regras. Aceitar o impossível.
“Então, definitivamente você não é humano,” eu disse. “Você é realmente um anjo caído. Um cara mau.”
Isso arrancou um sorriso do Patch. “Você acha que sou um cara mau?”
“Você possui os corpos... das pessoas.”
Ele aceitou a sentença com um aceno.
“Você quer possuir meu corpo?”
“Eu quero fazer muitas coisas com o seu corpo, mas isso não é uma delas.”
“O que há de errado com o corpo que você tem?”
“Meu corpo é parecido com vidro. Real, mas o externo refletindo o mundo ao meu redor. Você me vê e ouve, e eu vejo e a ouço. Quando você me toca, você sente. Eu não te sinto da mesma forma. Eu não posso te sentir. Eu sinto tudo através de uma placa de vidro e o único jeito de eu cortar essa folha é possuindo um corpo humano.”
“Ou parte humano.”
A boca do Patch ficou apertada nos cantos. “Quando você tocou minhas cicatrizes, você viu o Chauncey?” ele perguntou.
“Eu ouvi você falando com o Rixon. Ele disse que você possuía o corpo do Chauncey por duas semanas todo ano durante o Cheshvan. Ele disse que Chauncey também não é humano. Ele é Nephilim.” A palavra rolou da minha língua em um sussurro.
“Chauncey é um cruzamento entre um anjo caído e um humano. Ele é imortal como um anjo, mas com todos os sentidos humanos. Um anjo caído que queira ter as sensações humanas pode fazer isso no corpo de um Nephil.”
“Se você não pode sentir, por que você me beijou?”
Patch passou um dedo pelo meu colo, em seguida rumou para o sul, parando no meu coração. Eu o sentia batendo através da minha pele. “Porque eu sinto aqui, no meu coração,” ele disse baixinho. “Deixe-me colocar dessa forma. Nossa conexão emocional não é deficiente.”
Não entre em pânico, eu pensei. Mas minha respiração já estava mais rápida, superficial.
“Você quer dizer que você pode sentir felicidade, tristeza ou –”
“Desejo.” Um quase sorriso.
Continue avançando, eu disse para mim mesma. Não dê as suas emoções tempo para se recuperarem. Lide com elas mais tarde, depois que você obtiver respostas. “Por que você caiu?”
Os olhos do Patch seguraram os meus por alguns instantes. “Cobiça.”
Eu engoli. “Cobiça por dinheiro?”
Patch acariciou o queixo. Ele só fazia isso quando queria ocultar o que ele estava pensando, a doação dos seus pensamentos sendo sua boca. Ele estava lutando com um sorriso. “E por outras coisas. Eu achava que se eu caísse, eu viraria humano. Os anjos que tinham tentado Eva tinham sido banido para a Terra e houve rumores que eles tinham perdido suas asas e se transformados em humanos. Quando eles deixaram o paraíso, não foi uma cerimônia para qual todos nós fomos convidados. Foi privado. Eu não sabia que as asas deles tinham sido arrancadas, ou que eles tinham sido amaldiçoados a vagar pela Terra com o desejo ardente de possuir corpos humanos. Naquela época, ninguém tinha ouvido falar de anjos caídos. Então na minha mente isso fazia sentido, que se eu caísse, se eu perderia minhas asas e me transformaria em humano. Na época, eu estava louco por uma garota humana e o risco parecia valer a pena.”
“Dabria disse que você podia ter suas asas de volta salvando uma vida humana. Ela disse que você seria um anjo da guarda. Você quer isso?” Eu estava confusa no porquê ele era tão contra isso.
“Isso não é para mim. Eu quero ser humano. Eu quero isso mais do que eu jamais quis qualquer coisa.”
“Mas e a Dabria? Se vocês não estão mais juntos, por que ela ainda está aqui? Eu achei que ela era um anjo normal. Ela também quer ser humana?”
Patch ficou mortalmente quieto, todos os músculos do seu braço ficaram rígidos.
“Dabria ainda está na Terra?”
“Ela tem um emprego na escola. Ela é a nova psicóloga, Srta. Greene. Eu já a encontrei algumas vezes.” Meu estômago deu uma torcida forte. “Depois do que eu vi na sua memória, eu acho que ela pegou o emprego para ficar perto de você.”
“O que exatamente ela disse para você quando você se encontrou com ela?”
“Para ficar longe de você. Ela deu uma pista sobre seu passado obscuro e perigoso.” Eu pausei. “Alguma coisa está fora, não está?” Eu perguntei, sentindo um arrepio sinistro na minha coluna.
“Eu preciso te levar para casa. Depois eu vou para a escola procurar nos arquivos dela e ver se posso encontrar alguma coisa útil. Vou me sentir melhor depois de descobrir o que ela está planejando.” Patch deixou a cama despida. “Se enrole nisso,” ele disse, me dando uma trouxa de lençóis secos.
Minha mente estava trabalhando duro para que os fragmentos de informação fizessem sentido. De repente, minha boca ficou seca e pegajosa. “Ela ainda tem sentimentos por você. Talvez ela me queira fora de cena.”
Nossos olhares se encontraram. “Isso passou pela minha cabeça,” Patch disse.
Um pensamento gelado e perturbador ficava batendo dentro da minha cabeça nos últimos minutos, tentando ter minha atenção. Agora ele praticamente se atirou em mim, me dizendo que a Dabria poderia ser o cara da máscara de esqui. Todo o tempo eu achei que a pessoa que bateu no Neon era um cara, assim como a achou que seu atacante era um cara. Nesse ponto, eu não podia deixar de pensar que Dabria queria enganar nós duas.
Depois de uma rápida ida ao banheiro, Patch saiu vestindo sua camiseta molhada.
“Eu vou buscar o Jeep,” ele disse. Eu vou parar na porta dos fundos em vinte minutos. Fique no motel até lá.” 

Capítulo Vinte e Cinco

Após Patch ter ido embora, eu coloquei a corrente na porta. Eu arrastei a cadeira pelo quarto e a coloquei sob a maçaneta da porta. Eu chequei para ter certeza que as trancas da janela estavam funcionando. Eu não sabia se as trancas funcionariam contra a Dabria – eu nem sabia se ela estava atrás de mim – mas eu imaginei que era melhor não arriscar. Após vagar pelo quarto por alguns minutos, eu tentei o telefone no criado-mudo. Ainda nada de sinal.
Minha mãe ia me matar.
Eu tinha saído escondido dela e ido até Portland. E como eu devia explicar toda a situação de “ter feito check-in num motel com o Patch”? Eu teria sorte se ela não me botasse de castigo até o fim do ano. Não. Eu teria sorte se ela não saísse de seu emprego e se candidata-se a professora substituta até achar um trabalho em horário integral local. Nós teríamos que vender a casa da fazenda, e eu perderia a única conexão com o meu pai que me restava.
Aproximadamente quinze minutos mais tarde eu espiei pelo olho mágico.
Nada além de escuridão. Eu destranquei a porta, e bem quando estava prestes a dar um empurrão nela, luzes tremeluziram atrás de mim. Eu girei ao redor, meio esperando ver Dabria. O quarto estava parado e vazio, mas a eletricidade tinha voltado.
A porta se abriu com um ruído alto e eu fui para o corredor. O carpete era vermelho-sangue, usado simplesmente no centro do corredor, e manchado com marcas escuros não-identificáveis. As paredes estavam pintadas de neutro, mas a pintura era porca e estava descascando.
Acima de mim, um sinal de verde néon soletrava o caminho para a saída. Eu segui a seta corredor abaixo e até a esquina. O Jipe parou no outro lado da porta traseira, e eu me lancei e pulei no lado do passageiro.
Nenhuma luz estava acesa quando Patch parou na casa da fazenda. Eu experimentei um apertão de culpa no meu estômago e me perguntei se a minha mãe estava dirigindo por aí, me procurando. A chuva tinha parado, e a névoa se pressionava contra a lateral e pairava nos arbustos como um enfeite escandaloso de Natal. As árvores pontilhando a entrada estavam retorcidas e desfiguradas permanentemente pelos constantes ventos do norte. Todas as casas parecem não-convidativas com as luzes apagadas depois de escuro, mas a casa da fazenda com suas fendas pequenas fazendo de janelas, telhado curvado, varanda cavada, e arbustos selvagens parecia assombrada.
“Vou andar até lá,” Patch disse, saindo.
“Você acha que a Dabria está dentro?”
Ele balançou sua cabeça. “Mas não custa checar.”
Eu esperei no Jipe, e alguns minutos mais tarde Patch saiu da porta da frente, “Tudo limpo,” ele me disse. “Eu irei até a escola e voltarei aqui assim que varrer o escritório dela. Talvez ela tenha deixado algo útil para trás.” Ele não soava como se contasse com isso.
Eu retirei meu cinto de segurança e ordenei que minhas pernas me carregassem rapidamente pela caminhada. Enquanto eu virava a maçaneta, eu ouvi Patch recuar pela entrada.
As tábuas da varanda rangeram sob meu pé e eu me senti muito sozinha de repente.
Deixando as luzes apagadas, eu me arrastei pela casa, cômodo por cômodo, começando pelo primeiro andar, então indo escada acima. Patch já tinha liberado a casa, mas eu não achava que um par extra de olhos machucaria.
Depois de eu me certificar que ninguém estava se escondendo sob a mobília, atrás de cortinas do banheiro, ou em armários, eu coloquei uma calça Levi e um suéter preto de gola V. Eu encontrei o celular de emergência que minha mãe mantinha em um kit de primeiros socorros sob a pia do banheiro e liguei para seu celular.
Ela atendeu no primeiro toque. “Alô? ? É você? Onde você está? Eu estou morta de preocupação!”
Eu inspirei um longo fôlego, rezando para que as palavras certas saíssem de mim e me ajudassem a sair dessa.
“O negócio é que –”, eu começo em minha voz mais sincera e apologética.
“A Estrada Cascade inundou e eles a fecharam. Eu tive que voltar e conseguir um quarto no Milliken Mills – é onde estou agora. Eu tentei ligar para casa, mas aparentemente as linhas caíram. Eu tentei seu celular, mas você não atendeu.”
“Espera. Você esteve em Milliken Mills esse tempo todo?”
“Onde você achava que eu estava?”
Eu dei um suspiro inaudível de alívio e me abaixei na beira da banheira. “Eu não sabia,” eu disse. “Eu não conseguia entrar em contato com você, tampouco.”
“De que número está ligando?” minha mãe pergunta. “Não reconheço esse número.”
“O celular de emergência.”
“Onde está o seu celular?”
“Eu perdi.”
“O quê! Onde?”
Eu cheguei a uma conclusão instável de que uma mentira por omissão era a única maneira. Eu não queria alarmá-la. Eu também não queria ficar de castigo por uma quantidade interminável de tempo. “Na verdade eu meio que não o acho. Tenho certeza que ele aparecerá em algum lugar.” No corpo de uma mulher morta.
“Eu te ligo assim que eles abrirem as estradas,” ela disse.
A seguir eu liguei para o celular da , Após cinco toques eu fui enviada ao correio de voz.
“Onde você está?” eu disse. “Ligue de volta para esse número o mais rápido possível.” Eu fechei o celular com força e o coloquei no meu bolso, tentando me convencer que a estava bem. Mas eu sabia que era uma mentira. A ameaça invisível nos juntando estivera me alertando por horas agora que ela estava em perigo.
Na verdade, a sensação estava aumentando com cada minuto que passava.
Na cozinha eu vi meu vidro de pílulas de ferro na bancada, e eu imediatamente fui até elas, abrindo a tampa e engolindo duas com um copo de leite achocolatado. Eu fiquei parada um momento, deixando que o ferro entrasse no meu sistema, sentindo minha respiração aprofundar-se e diminuir a velocidade. Eu estava andando para devolver a caixa de leite para a geladeira quando eu a vi de pé na entrada entre a cozinha e a lavandaria.
Uma substância fria e gelada inundou meus pés, e eu percebi que tinha derrubado o leite. “Dabria?” eu disse.
Ela inclinou sua cabeça para um lado, mostrando uma surpresa mediana. “Sabe o meu nome?” Ela fez uma pausa. “Ah, Patch.”
Eu recuei para a pia, colocando mais distância entre nós. Dabria não parecia como quando ela estava na escola como Senhorita Greene. Hoje à noite seu cabelo estava emaranhado, não macio, e seus lábios tinham uma fome mais brilhante e certeira refletidos nele. Seus olhos eram um borrão aguçado de preto circulando-os.
“O que quer?” eu perguntei.
Ela riu, e soou como cubos de gelo tilintando num copo. “Eu quero o Patch.”
“O Patch não está aqui.”
Ela assentiu. “Eu sei. Eu esperei na rua para que ele fosse embora antes de eu entrar. Mas não foi isso que eu quis dizer quando disse que queria o Patch.”
O sangue martelando pelas minhas pernas circulou de volta até o meu coração com um efeito vertiginoso. Eu coloquei uma mão na bancada para me
firmar. “Eu sei que você estava me espionando durante as nossas sessões de aconselhamento.”
“Isso é tudo que sabe sobre mim?” ela perguntou, seus olhos procurando os meus.
Eu me lembrei da noite em que tive certeza que alguém tinha olhado pela janela do meu quarto. “Você esteve me espiando aqui também,” eu disse.
“Essa é a primeira vez eu estive na sua casa.” Ela arrastou um dedo pela beirada da ilha da cozinha e se empoleirou numa banqueta.
“Belo lugar.”
“Deixe-me refrescar sua memória,” eu disse, esperando soar corajosa. “Você olhou pela janela do meu quarto enquanto eu dormia.”
Seu sorriso curvou mais alto. “Não, mas eu te segui ao fazer compras. Eu ataquei sua amiga e plantei pequenas pistas em sua mente, fazendo-a pensar que Patch a havia machucado. Não foi muito difícil. Ele não é exatamente inofensivo, para começar. Estava no meu melhor interesse fazê-la ficar o mais assustada dele possível.”
“Para que ficasse longe dele.”
“Mas você não ficou. Você ainda está no nosso caminho.”
“No seu caminho do quê?”
“Vamos, . Se você sabe quem eu sou, então você sabe como isso funciona. Eu quero que ele consiga suas asas de volta. Ele não pertence na Terra. Ele pertence a mim. Ele cometeu um erro, e eu vou corrigi-lo.” Não havia absolutamente compromisso algum em sua voz. Ela saiu da banqueta e andou ao redor da ilha na minha direção.
Eu recuei pela beirada da bancada exterior, mantendo espaço entre nós.
Torturando meu cérebro, eu tentei pensar numa maneira de distraí-la. Ou escapar. Eu vivera na casa por dezasseis anos. Eu conhecia a planta baixa. Eu conhecia cada fenda secreta e os melhores esconderijos. Eu comandei que meu cérebro bolasse um plano: algo de improviso e brilhante. Minhas costas encontraram o aparador.
“Enquanto você estiver por aí, Patch não retornará para mim,” Dabria disse.
“Eu acho que você está sobrestimando seus sentimentos por mim.” Parecia uma boa ideia subestimar o nosso relacionamento. A possessão de Dabria parecia ser a força principal forçando-a a agir.
Um sorriso incrédulo apareceu em seu rosto. “Você acha que ele tem esses sentimentos por você? Todo esse tempo você achou –” Ela cortou, rindo. “Ele não fica porque te ama. Ele quer te matar.”
Eu balancei minha cabeça. “Ele não vai me matar.”
O sorriso de Dabria endureceu nas pontas. “Se é isso em que acredita, você é apenas outra garota que ele seduziu para conseguir o que quer. Ele tem um talento pra isso,” ela acrescentou sagazmente. “Ele me seduziu para conseguir seu nome, afinal. Um toque suave do Patch foi tudo que precisou. Eu caí em seu feitiço e disse a ele que a morte estava chegando para você.”
Eu sabia do que ela estava falando. Eu tinha testemunhado o momento exato ao qual ela se referia de dentro da memória de Patch.
“E agora ele está fazendo a mesma coisa com você,” ela disse. “Traição dói, não é?”
Eu balancei minha cabeça lentamente. “Não –”
“Ele está planejando te usar como sacrifício!” ela irrompeu. “Vê está marcada?”
Ela estendeu seu dedo ao meu pulso. “Quer dizer que você é uma descendente feminina de um Nephil. E não apenas qualquer Nephil, mas Chauncey Langeais, o vassalo de Patch.”
Eu olhei para a minha cicatriz, e por um instante de parar o coração, eu realmente acreditei nela. Mas eu sabia que ela não era de confiança.
“Há um livro sagrado, O Livro de Enoque,” ela disse. “Nele, um anjo caído mata seu vassalo Nephil ao sacrificar uma de suas descendentes femininas Nephil. Você não acha que Patch quer te matar? Qual a coisa que ele mais quer? Uma vez que ele te sacrificar, ele se tornará humano. Ele terá tudo que quiser. E ele não voltará para casa comigo.”
Ela desembainhou uma faca enorme do bloco de madeira da bancada. “E é por isso que eu tenho que me livrar de você. Parece que, de um jeito ou outro, as minhas premonições estavam certas. A morte está vindo para você.”
“Patch está voltando,” eu disse, minhas entranhas nauseando. “Você não quer falar sobre isso com ele?”
“Eu farei isso rápido,” ela continuou. “Eu sou um anjo da morte. Eu levo as almas até a pós-vida. Assim que eu terminar, eu levarei sua alma pelo véu. Você não tem nada a temer.”
Eu queria gritar, mas a minha voz ficou presa no fundo da minha garganta. Eu circulei o aparador, colocando a mesa da cozinha entre nós. “Se você é um anjo, onde estão as suas asas?”
“Nada mais de perguntas.” Sua voz tinha ficado impaciente, e ela começou a fechar a distância entre nós seriamente.
“Quanto tempo faz desde que deixou o céu?” eu perguntei, protelando. “Você está aqui embaixo há vários meses, certo? Você não acha que os outros anjos notaram que você sumiu?”
“Nem mais outro passo,” ela retrucou, levantando a faca, dispersando a luz da lâmina.
“Você está se encrencando muito por causa do Patch,” eu disse, minha voz não tão desprovida de pânico quanto eu queria. “Fico surpresa que você não se ressinta dele por te usar quando satisfaz os propósitos dele. Fico surpresa por você querer que ele consiga as asas de volta afinal. Depois do que ele fez com você, você não está feliz por ele ter sido banido para cá?”
“Ele me deixou por uma humana sem valor!” ela cuspiu, seus olhos um azul feroz.
“Ele não te deixou. Não mesmo. Ele caiu –”
“Ele caiu porque queria ser humano, como ela! Ele me tinha – ele me tinha!” Ela deu uma risada zombeteira, mas não mascarou a raiva ou a mágoa.
“Primeiramente eu fiquei magoada e brava, e eu fiz tudo em meu poder para esquecê-lo. Então, quando os arcanjos descobriram que ele está tentando seriamente se tornar humano, eles me mandaram aqui para fazê-lo mudar de ideia. Eu disse a mim mesma que eu não ia me apaixonar por ele de novo, mas que bem isso fez?”
“Dabria...,” eu comecei suavemente.
“Ele nem ligava que a garota fosse feita da poeira da terra! Você – todos vocês – são egoístas e desmazelados! Seus corpos são selvagens e indisciplinados. Em um momento vocês estão no pico da alegria, no seguinte estão a beira do desespero. É deplorável! Nenhum anjo sonhará com isso!” Ela lançou seu braço em um arco selvagem pelo seu rosto, enxugando lágrimas. “Olhe pra mim! Eu mal consigo me controlar! Eu estive aqui embaixo tempo demais, submersa em sujeira humana!”
Eu me virei e corri da cozinha, derrubando uma cadeira e deixando-a para trás de mim no caminho da Dabria. Eu corri pelo corredor, sabendo que estava me prendendo. A casa tinha duas saídas: a porta da frente, que Dabria poderia alcançar antes de mim ao cortar caminho pela sala de estar, e a porta de trás depois da sala de jantar, que ela tinha bloqueado.
Eu fui empurrada duramente por trás, e eu me arremessei para frente. Eu derrapei pelo corredor, parando sobre meu estômago. Eu rolei. Dabria pairava a alguns metros acima de mim – no ar – sua pele e cabelo incandescentes em um branco cegante, a faca apontada para mim.
Eu não pensei. Eu dei um chute para cima com toda a minha força. Eu arqueei com o chute, abraçando minha perna que não tinha chutado, e mirei no braço dela. A faca foi nocauteada de sua mão. Enquanto ficava de pé, Dabria apontou para o abajur numa mesinha de entrada, e com arremesso abrupto de
seu dedo, mandou-o voando até mim. Eu rolei, sentindo cacos de vidro deslizaram sob mim enquanto o abajur espatifava no chão.
“Mova-se!” Dabria comandou, e o banco da entrada deslizou para barrar a porta dianteira, bloqueando a minha saída.
Me arrastando para frente, eu fui para a escada indo de dois em dois, usando o corrimão para me propelir para frente. Eu escutei Dabria rir atrás de mim, e no instante seguinte o corrimão quebrou, caindo no corredor abaixo. Eu joguei meu peso para trás para me impedir de cair sobre a beirada desprotegida. Recuperando meu equilíbrio, eu corri até o final da escada. No topo eu me arremessei para o quarto da minha mãe e bati as portas de batente.
Correndo para uma das janelas flanqueando a lareira, eu olhei para baixo por dois andares até o chão. Havia três arbustos em uma cama de pedras diretamente abaixo, toda a folhagem desaparecera já que era Outono. Eu não sabia se eu sobreviveria ao pulo.
“Abra!” Dabria ordenou do outro lado das portas de batente. Uma fenda rasgou a madeira enquanto a porta deformava-se contra a fechadura. Eu estava sem tempo.
Eu corri até a lareira e mergulhei sob a abóbada. Eu tinha acabado de puxar os meus pés, abraçando-os contra o interior do cano, quando as portas se abriram, batendo contra a parede. Eu escutei Dabria marchar até a janela.
!” ela chamou em sua voz delicada e arrepiante. “Sei que você está perto! Eu te sinto. Você não pode correr e não pode se esconder – eu queimarei essa casa cômodo por cômodo se é isso que custa para te achar! E então eu queimarei o caminho pelos campos atrás. Não vou te deixar viva!”
Um brilho de luz dourada clara chiou do lado de fora da lareira, junto com o sopro barulhento de fogo inflamando. As chamas mandaram sombras dançantes no buraco abaixo. Eu escutei o estalo e o crepitar de fogo consumindo combustível – mais provável a mobília ou os soalhos de madeira.
Eu permaneci apertada no cano. Meu coração martelou, suor pingando da minha pele. Eu respirei diversas vezes, exalando lentamente para aguentar a queimação nos meus músculos das pernas firmemente contraídos. Patch tinha dito que ele ia para escola. Quanto faltava para ele voltar?
Não sabendo se a Dabria ainda estava no quarto, mas temendo que se eu não fosse embora agora o fogo fosse me prender aqui dentro, eu abaixei uma perna no buraco, então a outra. Eu saí de debaixo da abóbada. Dabria não está à vista, mas as chamas estavam lambendo as paredes, a fumaça sufocando todo o ar do quarto.
Eu me apressei corredor abaixo, não ousando descer, achando que Dabria esperaria que eu tentasse escapar por uma das portas. No meu quarto eu abri a janela. A árvore do lado de fora era perto e vigorosa o bastante para escalar. Talvez eu conseguisse despistar Dabria na névoa atrás da casa. Os vizinhos mais próximos estavam a pouco menos de um quilômetro e meio de distância, e correndo arduamente, eu poderia estar lá em sete minutos. Eu estava prestes a passar minha perna pela janela quando um crepitar soou corredor abaixo.
Fechando-me silenciosamente dentro do armário, eu disquei para 192.
“Há alguém na minha casa tentando me matar,” eu sussurrei para o operador. Eu tinha acabado de dar o meu endereço quando a porta para o meu quarto se abriu. Eu fiquei perfeitamente imóvel.
Pelas ripas na porta do armário, eu observei uma figura indistinta entrar no quarto. A luz estava fraca, meu ângulo errado, e eu não conseguia ver um único detalhe diferenciador. A figura abriu as persianas da janela, espiando. Ela tocou as meias e as roupas íntimas na minha gaveta aberta. Ela pegou o pente prata na minha escrivaninha, estudou-o, então o devolveu.
Quando a figura virou na direção do armário, eu sabia que estava encrencada.
Deslizando minha mão para o chão, eu tateei procurando por algo que eu poderia usar em minha defesa. Meu cotovelo bateu numa pilha de caixas de sapato, fazendo-as tombarem. Eu balbuciei uma maldição. Os passos andaram para mais perto.
As portas do armário abriram, e eu atirei um sapato. Eu agarrei outro e o joguei.
Patch xingou baixinho, arrancou um terceiro sapato das minhas mãos, e o jogou para trás dele. Me arrancando com força do armário, ele me colocou de pé. Antes que eu conseguisse registar o alívio por descobrir que ele, e não Dabria, estava na minha frente, ele me puxou contra si e entrelaçou seus braços ao meu redor.
“Você está bem?” ele murmurou no meu ouvido.
“Dabria está aqui,” eu disse, meus olhos enchendo de lágrimas. Meus joelhos tremeram, e o aperto de Patch era a única coisa me mantendo de pé. “Ela está queimando a casa.”
Patch me deu um conjunto de chaves e eu curvei meus dedos ao redor delas. “Meu Jipe está estacionado na rua. Entre, tranque as portas, dirija até Delphic, e espere por mim.” Ele inclinou meu queixo para encará-lo. Ele deu um beijo de leve nos meus lábios e mandou um relampejo de calor por mim.
“O que você vai fazer?” eu perguntei.
“Lidar com a Dabria.”
“Como?”
Ele deslizou um olhar para mim que dizia, Você realmente quer os detalhes?
O som de sirenes lamentou à distância.
Patch olhou para a janela. “Você chamou a polícia?”
“Achei que você fosse a Dabria.”
Ele já estava saindo pela porta. “Eu irei atrás da Dabria. Dirija o Jipe até Delphic e espere por mim.”
“E quanto ao incêndio?”
“A polícia vai lidar com isso.”
Eu forcei meu aperto nas chaves. A parte de tomar decisões do meu cérebro estava dividida, correndo em direções opostas. Eu queria sair da casa e ficar longe da Dabria, e me encontrar com Patch mais tarde, mas havia um pensamento perturbante do qual eu não conseguia me livrar. Dabria dissera que Patch precisava me sacrificar para se tornar humano.
Ela não tinha dito isso levianamente, ou para me irritar. Ou nem mesmo para me colocar contra ele. Suas palavras tinham saído frias e sérias. Sérias o bastante que ela tinha tentado me matar para impedir o Patch de chegar até mim antes.
Eu encontrei o Jipe estacionado na rua, exatamente como Patch dissera. Eu coloquei a chave na ignição e levei o Jipe por Hawthorne.
Me dando conta de que era inútil tentar o celular da novamente, eu liguei para o número da casa dela ao invés.
“Oi, Sra. ,” eu disse, tentando soar como se nada estivesse fora do normal. “A está aí?”
“Oi, ! Ela saiu há algumas horas. Algo sobre uma festa em Portland. Eu achei que ela estava com você.”
“Hm, nós nos separamos,” eu menti. “Ela disse para onde ia depois da festa?”
“Ela estava pensando em ver um filme. E ela não está atendendo seu celular, então eu assumo que ela o desligou por causa de uma exibição. Tudo está bem?”
Eu não queria assustá-la, mas ao mesmo tempo, eu não ia dizer que estava tudo bem. Nenhum pouquinho disso parecia bem para mim. Da última vez que eu falara com a , ela estava com o Elliot. E agora ela não estava atendendo seu celular.
“Eu acho que não,” eu disse. “Eu vou dar uma volta e procurar por ela. Começarei pelo cinema. Você procura na alameda?” 

Capítulo Vinte e Seis

Era domingo a noite antes de começar o feriado da primavera e o cinema estava lotado. Eu fui para a fila comprar ingressos, olhando continuamente em volta a procura de sinais de que eu estava sendo seguida. Até agora, nada alarmante e a multidão de corpos me dava uma boa cobertura. Eu disse a mim mesma que Patch tomaria conta da Dabria e isso não era nada que eu devesse me preocupar, mas não faria mal ficar alerta.
Claro, que bem lá no fundo, eu sabia que a Dabria não era minha maior preocupação. Cedo ou tarde o Patch iria descobrir que eu não estava no Delphic. Baseada em experiências passadas eu não tinha nenhuma ilusão de que conseguiria esconder-me dele por muito tempo. Ele me encontraria. E então eu seria forçada a confrontá-lo com a pergunta que eu temia. Mais especificamente, eu temia sua resposta. Porque havia uma sombra de dúvida no fundo da minha mente, sussurrando que aquela Dabria tinha falado a verdade sobre Patch precisaria para ter um corpo humano.
Eu dei um passo me aproximando da cabine de compra do ingresso. O filme das nove e meia estava começando.
“Um para O Sacrifício47”, eu disse sem pensar. Imediatamente eu achei o título estranhamente irônico. Sem querer refletir mais sobre isso, eu pesquei no meu bolso um punhado de notas pequenas e algumas moedas e passei debaixo da janela, rezando para que fosse o suficiente.

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47 Em inglês: The Sacrifice.
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Afe,” a moça disse, olhando para as moedas girando debaixo da janela. Eu a reconheci da escola. Ela era do último ano e eu tinha quase certeza que seu nome era Kaylie ou Kylie. “Muito obrigada,” ela disse. “Como se não tivesse uma fila ou nada assim.”
Todo mundo atrás de mim murmurou um palavrão coletivo.
“Eu limpei meu cofrinho,” eu disse quase sarcástica.
“Não brinca? Está tudo aqui?” ela perguntou, dando um suspiro alto e pegando as moedas e separando em grupos de vinte cinco, dez, cinco e um centavo.
“Com certeza.”
“Que seja. Não ganho o suficiente para isso.” Ela jogou o dinheiro na gaveta do caixa e passou meu ingresso debaixo da janela. “Existe uma coisa que se chama cartão de crédito…”
Eu agarrei o ingresso. “Por acaso você viu a por aqui hoje?”
“Bee quem?”
. Ela é do segundo ano. Ela está com o Elliot Saunders.”
Os olhos da Kaylie ou Kylie estavam arregalados. “Parece uma noite tranquila? Parece que eu estou apenas sentada aqui memorizando todos os rostos que passam?”
“Esqueça,” eu disse baixinho, indo em direção das portas que me levariam para dentro do cinema.
O cinema Coldeater tinha duas salas, uma de cada lado no corredor de entrada por detrás daquelas portas. Assim que o cara que verificava o ingresso rasgou o meu, eu fui em direção à porta da sala número dois e entrei na escuridão. O filme já tinha começado.
A sala estava quase cheia, exceto por alguns assentos isolados. Andei pelo corredor procurando a . No final do corredor eu me virei e atravessei a parte da frente do cinema. Era difícil distinguir os rostos na escuridão, mas eu tinha quase certeza que ela não estava aqui.
Eu saí da sala e fui em direção à outra porta. Não estava tão cheio como o outro. Eu fiz outra caminhada procurando, mas novamente, eu não vi a . Sentei numa poltrona perto dos fundos, tentei colocar minha mente em ordem.
Toda essa noite parecia um conto de fadas obscuro que eu entrei e não conseguia achar o caminho de volta. Um conto de fadas com anjos caídos, humanos híbridos e sacrifícios com morte. Eu passei meu dedo em cima da minha marca de nascença. Eu não queria pensar, especialmente, na possibilidade de eu ser uma descendente de um Nephilim.
Eu peguei o celular de emergência e chequei se tinha chamadas perdidas.
Nenhuma.
Eu estava colocando o celular no meu bolso quando um pacote de pipoca se materializou ao meu lado.
“Faminta?” a voz que perguntou vinha de cima do meu ombro. A voz estava seca, não especificamente feliz. Eu tentei manter minha respiração calma. “Fique em pé e saia da sala,” Patch disse. “Estarei bem atrás de você.”
Eu não me mexi.
“Saia da sala,” ele repetiu. “Nós precisamos conversar.”
“Que tal sobre você precisar me sacrificar para conseguir um corpo humano?” eu perguntei, meu tom foi leve, mas por dentro meus sentimentos eram pesados.
“Isso seria bonitinho se você achasse que é verdade.”
“Eu não acho que é verdade!” Mais ou menos. Mas o mesmo pensamento continuava voltando – se o Patch quisesse me matar, por que ele ainda não matou?
Shh,” falou um cara perto de mim.
Patch disse, “Vá para fora ou vou te carregar.”
Eu me virei. “Como é?”
Shh!” o cara ao meu lado fez novamente.
“O culpe,” eu disse para o cara e apontei para o Patch.
O cara esticou o pescoço para trás. “Escuta,” ele disse, me olhando novamente. “Se você não se acalmar eu vou chamar os seguranças.”
“Ótimo, vá buscar os seguranças. E diga para eles tirarem ele daqui,” eu disse, novamente sinalizando para o Patch. “Diga para eles que ele quer me matar.”
Eu quero te matar,” a namorada do cara disse, inclinando sobre ele para me ver.
“Quem quer te matar?” o cara perguntou. Ele ainda estava olhando por sobre seu ombro, mas sua expressão era confusa.
“Não tem ninguém ali,” a namorada me disse.
“Você está fazendo com que eles achem que não podem te ver, não está?” eu disse para o Patch, admirada pelo seu poder, mesmo desprezando seu uso.
Patch sorriu, mas os cantos estavam mais apertados.
“Oh, merda!” a namorada disse, jogando suas mãos para o alto. Ela rolou seus olhos furiosamente para seu namorado e disse, “Faça alguma coisa!”
“Eu preciso que você pare de falar,” o cara me disse. Ele fez um gesto para a tela. “Assista ao filme. Aqui – fique com meu refrigerante.”
Fui para o corredor. Senti Patch se movendo ao meu lado, perturbadoramente próximo, mas sem me tocar. Ele continuou desse jeito até que saímos do cinema.
Do outro lado da porta, Patch segurou meu braço me guiou através do hall até o banheiro feminino.
“O que você tem com banheiros femininos?” Eu disse.
Ele me conduziu pela porta, trancando-a e recostou-se contra ela.
Seus olhos estavam em cada centímetro meu. E eles me davam sinais de que queriam me chocalhar até a morte.
Eu estava encostada no balcão, minhas palmas agarradas à borda. “Você está bravo porque eu não fui para o Delphic.” Eu levantei um ombro trêmulo. “Patch, por que o Delphic? É domingo à noite. O Delphic vai fechar em breve. Alguma razão especial para você querer que eu dirigisse para um parque de diversões escuro e quase abandonado?”
Ele andou até mim até que ele ficou tão próximo que eu podia ver seus olhos negros por debaixo do seu boné.
“Dabria me disse que você tem que sacrificar um corpo humano,” eu disse.
Patch ficou quieto por um momento. “E você acha que eu vou fazer isso?”
Eu engoli. “Então isso é verdade?”
Nossos olhos se encontraram. “Teria que ser um sacrifício intencional. Simplesmente te matar não resolveria.”
“Você é a única pessoa que pode fazer isso comigo?”
“Não, mas sou provavelmente a única pessoa que sabe do resultado final e a única pessoa que tentaria isso. Esta é a razão de eu ter vindo para a escola. Eu tinha que chegar perto de você. Eu precisava de você. Essa é a razão pela qual entrei em sua vida.”
“Dabria me disse que você caiu por causa de uma garota.” Eu me odiava por experimentar as dores do ciúme irracional. Isso não era para ser sobre mim. Isso era para ser um interrogatório. “O que aconteceu.”
Eu queria desesperadamente que o Patch me desse alguma pista de seus pensamentos, mas seus olhos eram escuros e gelados, as emoções estavam trancadas longe da superfície. “Ela envelheceu e morreu.”
“Isso deve ter sido difícil para você,” eu disse.
Ele esperou um pouco antes de responder. Seu tom era tão baixo, que eu estremeci. “Você quer que eu jogue limpo, eu vou jogar. Vou te contar tudo. Quem eu sou e o que eu fiz. Cada detalhe. Vou trazer tudo à tona, mas você tem que pedir. Você tem que querer isso. Você pode ver quem eu fui, ou você pode ver quem eu sou agora. Eu não sou bom.” Ele me disse, com seus olhos que absorviam toda a luz, mas não refletia nada, “mas eu fui pior.”
Eu ignorei o aperto no estômago e disse, “Conte-me.”
“A primeira vez que a vi, eu ainda era um anjo. Foi um instante de desejo possessivo. Me deixou louco. Eu não sabia nada sobre ela, exceto que eu faria qualquer coisa para ficar perto dela. Eu a observei por um tempo, então eu pensava que se eu descesse para a Terra e possuísse um corpo humano, eu seria expulso do céu e me transformaria em humano. O detalhe é que eu não sabia sobre o Cheshvan. Eu desci em uma noite de Agosto, mas eu não pude possuir o corpo. Na minha volta para o Paraíso, uma série de anjos vingadores me
pararam e arrancaram minhas asas. Eles me atiraram pelo céu. Imediatamente eles soube que havia alguma coisa errada. Quando eu olhei para os humanos, tudo o que eu podia sentir foi um desejo insaciável de estar dentro dos seus corpos. Todos os meus poderes foram retirados e eu era essa coisa fraca e patética. Eu não era humano. Eu tinha caído. Eu percebi que tinha desistido de tudo, num piscar de olhos. Todo esse tempo eu me odiei por isso. Eu achava que tinha desistido por nada.” Seus olhos focaram em mim singularmente, fazendo com que eu me sentisse transparente. “Mas se eu não tivesse caído, eu não teria te conhecido.”
Minhas emoções conflituantes pesaram tão forte dentro do meu peito, que achei que elas iriam me sufocar. Segurando as lágrimas, eu continuei. “Dabria disse que minha marca de nascença está relacionada com o Chauncey. Isso é verdade?”
“Você quer que eu responda isso?”
Eu não sabia o que queria. Todo meu mundo parecia uma piada e eu era a última a ficar sabendo. Eu não era , uma garota mediana. Eu era descendente de alguém que nem era humano. E meu coração estava se desfazendo em pedaços por outro que não era humano. Um anjo negro. “Qual lado da minha família?” eu disse afinal.
“Do seu pai.”
“Onde está o Chauncey agora?” Mesmo sabendo que estávamos relacionados, eu gostava da ideia de ele estar bem longe. Muito longe. Tão longe que o que nosso laço não pareça real.
“Eu não vou te matar . Eu não mato pessoas que são importantes para mim. E você está no topo da lista.”
Meu coração deu uma batida nervosa. Minhas mãos estavam em sua barriga, que eram tão firmes que nem mesmo sua pele cedia. Eu estava mantendo uma distância segura entre nós, já que nem mesmo uma cerca elétrica me faria sentir segura com relação a ele.
“Você está invadindo meu espaço privado,” eu disse, afastando um pouco.
Patch me deu um quase sorriso. “Invadindo? Isso não é um teste de atitude da escola, .”
Eu coloquei alguns fios de cabelos atrás da orelha e dei um passo considerável para o lado, encostando na borda da pia. “Você está me cercando. Eu preciso de – espaço.” O que eu precisava era de limites. Eu precisava de força de vontade. Eu precisava ser enjaulada, já que, mais uma vez, eu estava provando que não era confiável na presença do Patch. Eu deveria estar indo em direção à porta, mas mesmo assim... Eu não estava. Eu tentei me convencer que
eu ainda estava aqui porque eu precisava de respostas, mas isso era apenas uma parte da verdade. Havia outra parte que eu não queria pensar nela. A parte emocional. A parte que era inútil lutar.
“Você está escondendo mais alguma coisa de mim?” eu quis saber.
“Estou escondendo várias coisas de você.”
Senti um frio na barriga. “Como o que?”
“Por exemplo, como eu me sinto estando trancado aqui com você.” Patch ergueu o braço e apoiou a mão no espelho atrás de mim, colocando o peso do seu corpo em mim. “Você não tem ideia do que faz comigo.”
Eu chacoalhei a cabeça. “Eu acho que não. Isso não é uma boa ideia. Isso não é certo.”
“Existem vários tipos de coisas certas,” ele murmurou. “No espectro, ainda estamos em uma zona segura.”
Eu sabia que a metade do meu cérebro responsável pela auto preservação estava gritando, Corra por sua vida!. Infelizmente, o sangue subiu até minhas orelhas e eu não estava ouvindo direito. Obviamente, eu também não estava pensando direito.
“Definitivamente certo. Normalmente certo,” Patch continuou. “Quase sempre certo. Talvez seja certo.”
“Talvez não agora.” Eu respirei um pouco. Pelo canto do olho eu vi um alarme de incêndio na parede. Estava a dez ou quinze passos de distância. Se eu fosse rápida, eu podia atravessar o banheiro e apertar o botão antes do Patch me impedir. A segurança viria correndo. Eu estaria salva. E era isso que eu queria… não era?
“Não é uma boa ideia,” Patch disse com um balanço suave de cabeça.
De qualquer maneira eu corri para o alarme de incêndio. Meus dedos agarraram a alavanca e eu a puxei para baixo. Só que a alavanca não se moveu. Por mais forte que eu tentasse, eu não conseguia a fazer se mover. Então eu reconheci a presença familiar do Patch na minha cabeça e eu soube que era um jogo mental.
Virei para encará-lo. “Saia da minha cabeça.” Eu o ataquei dando um empurrão forte em seu peito.
“Para que isso?” ele perguntou.
“Por causa dessa noite.” Por me deixar louca por ele quando eu sabia que era errado. Ele era o pior tipo de errado. Ele era tão errado que parecia certo e isso me fazia sentir completamente fora de controle.
Eu poderia ter tentado bater em seu queixo se ele não tivesse me pegado pelos ombros e me encostado contra a parede. Não havia quase nenhum
espaço entre nós, apenas uma fina camada de ar, mas o Patch conseguiu eliminá-la.
“Vamos ser honestos . Você está apaixonada por mim.” Seus olhos eram profundos. “E eu estou apaixonado por você.” Ele se inclinou em mim e colocou sua boca na minha. Na verdade muita coisa dele estava em mim. Nós tocamos várias partes estratégicas da parte debaixo dos nossos corpos e isso acabou com a minha força de vontade.
Eu me afastei. “Eu não terminei. O que aconteceu com a Dabria?”
“Todos os cuidados foram tomados.”
“O que exatamente isso quer dizer?”
“Ela não iria manter suas asas depois de conspirar para te matar. No momento que ela tentasse voltar para o Paraíso, os anjos vingadores arrancariam suas asas. Ela teria isso mais cedo ou mais tarde. Eu apenas apressei as coisas.”
“Então você – as arrancou?”
“Elas estavam deteriorando; as penas estavam quebradas e finas. Se ela ficasse mais tempo na Terra, isso seria um sinal para todos os outros anjos caídos que a vissem, que ela tinha caído. Se eu não fizesse isso, um deles faria.”
Eu evitei outro de seus avanços. “Ela vai fazer outra aparição não desejada na minha vida?”
“Difícil dizer.”
Rápido como um relâmpago, Patch pegou a barra da minha blusa. Ele me puxou em sua direção. Seus dedos roçaram na pele perto do meu umbigo. Calor e frio me atingiram simultaneamente. “Você daria conta dela, Anjo,” ele disse. “Já vi vocês duas em ação, e minha aposta é em você. Você não precisa de mim para isso.”
“Para o que eu preciso de você?”
Ele riu. Não abruptamente, mas com certo desejo. Seus olhos tinham perdido aquele frio e ficaram focados totalmente em mim. Seu sorriso era sedutor... Mas suave. Alguma coisa atrás do meu umbigo dançou e então, se enrolou mais para baixo.
“A porta está trancada,” ele disse. “E nós temos negócios interminados.”
Meu corpo parecia ter varrido a parte lógica do meu cérebro. Sufocado, na verdade. Eu deslizei minhas mãos para cima no peito dele e passei meus braços ao redor do seu pescoço. Patch ergueu meus quadris e eu enrosquei as pernas na sua cintura. Meu pulso disparou, mas eu não me importei nem um pouco. Eu
esmaguei minha boca contra a sua, absorvendo o êxtase da sua boca na minha, suas mãos em mim, o sentimento a beira de romper a minha pele –
O celular no meu bolso tocou. Eu me afastei do Patch, respirando forte e o telefone tocou uma segunda vez.
“Caixa postal,” o Patch disse.
Nas profundezas da minha consciência, eu sabia que atender meu telefone era importante. Eu não conseguia me lembrar do por que; ter beijado Patch fez com que cada preocupação evaporasse. Eu me desembaracei dele, virando-me para que ele não visse o que dez segundos de beijo dele tinham feito comigo. Internamente eu estava gritando de prazer.
“Alô?” eu respondi, resistindo ao impulso de limpar minha boca manchada de gloss.
“Querida!” disse. A conexão estava ruim, a estática cortava sua voz. “Onde você está?”
“Onde você está? Você ainda está com o Elliot e o Jules?” Eu coloquei minha mão na outra orelha para ouvir melhor.
“Estamos na escola. Nós invadimos,” ela disse em uma voz que era desobediente a perfeição. “Nós queremos brincar de esconde-esconde, mas não temos pessoas suficientes para dois times. Então... você sabe de uma quarta pessoa que poderia vir brincar connosco?”
Uma voz incoerente murmurou ao fundo.
“Elliot quer que eu te diga que se você não vier ser seu parceiro – espera aí – o que?” disse ao fundo.
A voz do Elliot apareceu no telefone. ? Venha brincar connosco. Caso contrário tem uma árvore na área comum com o nome da nela.”
Puro gelo fluiu em mim.
“Alô?” eu disse rouca. “Elliot? ? Você está aí?”
Mas a conexão tinha caído. 

Capítulo Vinte e Sete

“Quem era?” Patch perguntou.
Meu corpo todo retinia. Levei um momento para responder. " arrombou a escola com o Elliot e o Jules. Eles querem que eu os encontre. Acho que o Elliot vai machucar a se eu não for.” Eu olhei para o Patch. “Acho que ele vai machucá-la se eu for.”
Ele dobrou seus braços, franzindo. “Elliot?”
“Semana passada na biblioteca eu encontrei um artigo que dizia que ele foi interrogado numa investigação de assassinato em sua antiga escola, Kinghorn Prep. Ele entrou no laboratório de informática e me viu lendo-o. Desde aquela noite, eu sinto uma vibe ruim dele. Uma vibe muito ruim. Eu acho até que ele arrombou o meu quarto para roubar o artigo.”
“Algo mais que eu deva saber?”
“A garota que foi assassinada era namorada do Elliot. Ela foi enforcada em uma árvore. Bem agora no telefone ele disse, ‘Se você não vier, tem uma árvore na área comum com o nome da nela.’”
“Eu já vi o Elliot. Ele parece arrogante e um pouco agressivo, mas ele não me parece com um assassino.” Ele mergulhou sua mão em meu bolso dianteiro e extraiu as chaves do Jipe. “Eu dirigirei até lá e checarei as coisas. Não demoro.”
“Acho que deveríamos chamar a polícia.”
Ele balançou sua cabeça. “Vai mandar a para o reformatório por destruição de propriedade e por invasão. Mais uma coisa. Jules. Quem é esse cara?”
“Amigo do Elliot. Ele estava na arcada na noite em que te vimos.”
Seu franzido aprofundou-se. “Se houvesse outro cara, eu me lembraria.”
Ele abriu a porta e eu o segui para fora. Um zelador usando uma calça preta e uma camiseta vermelha-acastanhada do trabalho varria pipoca no saguão. Ele olhou duas vezes ao ver Patch saindo do banheiro feminino. Eu o reconheci da escola. Brandt Christensen. Tínhamos aula de inglês juntos. Semestre passado eu o tinha ajudado a escrever um artigo.
“Elliot está me esperando, não você,” eu disse ao Patch. “Se eu não aparecer, sabe lá o que vai acontecer com a . Esse é um risco que não vou tomar.”
“Se eu te deixar vir, você escutará as minhas instruções e vai segui-las cuidadosamente?”
“Sim.”
“Se eu te disser para pular?”
“Eu pulo.”
“Se eu te disser para ficar no carro?”
“Eu ficarei no carro.” Era quase tudo verdade.
No estacionamento do cinema, Patch apontou sua chave de segurança para o Jipe, e os faróis piscaram. De repente ele parou abruptamente e xingou baixinho.
“Qual o problema?” eu disse.
“Pneus.”
Eu deixei meu olhar cair e, certamente, ambos os pneus no lado do motorista estavam murchos. “Não acredito!” eu disse. “Eu passei por cima de dois pregos?”
Patch se agachou no pneu dianteiro, correndo sua mão pela circunferência. “Chave de fenda. Esse foi um ataque intencional.”
Por um momento eu pensei que talvez esse fosse outro truque mental. Talvez Patch tivesse suas razões para não querer que eu fosse para a escola. Seus sentimentos por não eram secretos, afinal. Mas algo estava faltando.
Eu não conseguia sentir o Patch em lugar algum dentro da minha cabeça. Se ele estava alterando os meus pensamentos, ele tinha encontrado uma maneira nova de fazê-lo, porque pelo que eu sei, o que eu estava vendo era real.
“Quem faria isso?”
Ele ficou totalmente de pé. “A lista é longa.”
“Está tentando me dizer que tem um monte de inimigos?”
“Eu chateei algumas pessoas. Um monte de gente faz apostas que não podem vencer. Então eles me culpam por sair com seus carros, ou mais.”
Patch deu um passo até um coupé, abriu a porta do lado do motorista, e sentou atrás do volante. Esticando-se sob ele, sua mão desapareceu.
“O que está fazendo?” eu perguntei, ficando de pé na porta aberta. Era um desperdício de oxigênio já que eu estava bem ciente do que ele estava fazendo.
“Procurando pela chave reserva.” A mão do Patch reapareceu, segurando dois fios azuis. Com alguma habilidade, ele removeu as pontas dos fios e os uniu. O motor ligou, e Patch olhou para mim. “Cinto de segurança.”
“Não vou roubar um carro.”
Ele deu de ombros. “Nós precisamos dele agora. Eles não.”
“É roubo. É errado.”
Patch não parecia nem um pouquinho incomodado. De fato, ele parecia um tanto relaxado demais no assento do motorista. Essa não é a primeira vez que ele faz isso, eu pensei.
“Primeira regra do roubo de carros,” ele disse sorrindo. “Tente não ficar na cena do crime mais que o necessário.”
“Espere um minuto,” eu disse, levantando um dedo.
Eu corri de volta para o cinema. No caminho para dentro, as portas de vidro refletiram o estacionamento atrás de mim, e eu vi Patch sair do coupé.
“Oi, Brandt,” eu disse para o garoto ainda empurrando pipoca para uma pá de lixo com cabo alto.
Brandt olhou para mim, mas sua atenção foi rapidamente atraída para cima do meu ombro. Eu escutei as portas do cinema se abrirem e senti Patch se mover para trás de mim. Sua chegada não fora tão diferente de uma nuvem eclipsando o sol, repentinamente obscurecendo a paisagem, dedurando uma tempestade.
“Como vai?” Brandt disse duvidosamente.
“Estou tendo problemas com o carro,” eu disse, mordendo meu lábio e testando uma cara simpática. “Sei que estou te colocando numa posição delicada, mas já que eu te ajudei com aquele artigo sobre Shakespeare semestre passado...”
“Você quer emprestar o meu carro.”
“Na verdade... sim.”
“É uma porcaria. Não é nenhum Jipe Commander.” Ele olhou diretamente para Patch como se estivesse se desculpando.
“Corre?” eu perguntei.
“Se por correr você quer saber se as rodas giram, é, corre. Mas não está disponível para empréstimo.”
Patch abriu sua carteira e deu-lhe o que parecia ser três notas novinhas de cem dólares. Controlando a minha surpresa, eu decidi que a melhor coisa a se fazer era continuar nessa brincadeira.
“Eu mudei de ideia,” Brandt disse, os olhos arregalados, embolsando o dinheiro. Ele pescou em seus bolsos e entregou clandestinamente a Patch um par de chaves.
“Qual a marca e cor?” Patch perguntou, pegando as chaves.
“Difícil dizer. Parte Volkswagen, parte Chevette. Costumava ser azul. Isso foi antes de ser corroído para laranja. Enche o tanque antes de devolvê-lo?” Brandt disse, soando como se tivesse seus dedos cruzados em suas costas, forçando sua sorte.
Patch descartou outros vinte. “Só em caso de esquecermos,” ele disse, enfiando-o no bolso dianteiro do uniforme de Brandt.
Do lado de fora, eu disse ao Patch, “Eu podia tê-lo convencido a me dar suas chaves. Eu só precisava de um pouco mais de tempo. E, a propósito, por que você limpa mesas no Borderline se é rico?”
“Não sou. Eu ganhei o dinheiro em um jogo de sinuca há algumas noites." Ele empurrou a chave de Brandt na fechadura e abriu a porta do lado do passageiro para mim. “O banco está oficialmente fechado.”
Patch dirigiu pela cidade em ruas escuras e silenciosas. Não levou muito tempo para chegar na escola. Ele parou o carro de Brandt no lado leste do prédio e desligou o motor. O campus era coberto de florestas, os galhos eram retorcidos e sombrios e não seguravam nada além de uma bruma úmida.
Atrás deles pairava a escola Coldwater.
A parte original do prédio fora construída no fim do século dezanove, e após o pôr-do-sol parecia muito com uma catedral.
Cinza e agourenta. Muito escura. Muito abandonada.
“Eu acabei de ter um mau pressentimento,” eu disse, olhando os vazios pretos que a escola tinha de janela.
“Fique no carro e fora de vista,” Patch me disse, me passando as chaves. “Se alguém sair do prédio, se mande.” Ele saiu. Ele estava usando uma camiseta preta justa de gola redonda, calça Levi escura, e botas. Com seu cabelo preto e pele escura, era difícil distingui-lo dos fundos. Ele cruzou a rua e, em questão de instantes, se uniu completamente à noite. 

Capítulo Vinte e Oito

Cinco minutos vieram e passaram. Dez minutos se transformaram em vinte. Eu lutei para ignorar o sentimento de arrepiar de que estava sob vigilância. Olhei para as sombras que circundavam da escola.
Por que o Patch estava demorando tanto? Eu misturei algumas teorias, sentindo mais desconfortável nesse momento. E se o Patch não conseguisse encontrar a ? O que aconteceria quando o Patch encontrasse o Eliot? Eu não acho que o Elliot é mais poderoso que o Patch, mas há sempre uma chance – se Elliot tivesse o elemento surpresa.
O telefone no meu bolso tocou e eu pulei de susto.
“Eu vejo você,” Elliot disse quando eu atendi. “Sentada aí no carro.”
“Onde você está?”
“Observando da janela do segundo andar. Estamos jogando aqui dentro.”
“Eu não quero jogar.”
Ele finalizou a chamada.
Com meu coração na garganta, eu saí do carro. Olhei para as janelas escuras da escola. Não achava que o Elliot soubesse que o Patch estava lá dentro. Sua voz estava impaciente, não raivosa ou irritada. Minha única esperança era que o Patch tivesse um plano e tivesse certeza que nada aconteceria comigo ou com a . A Lua estava mais nublada e com uma sombra de medo eu andei em direção à porta leste.
Eu dei um passo dentro da semi-escuridão. Meus olhos demoraram alguns segundos para fazer alguma coisa com a iluminação do poste que passava pela janela e terminava na metade de cima da porta. As tiras do assoalho refletiam um brilho seroso.
Armários estavam alinhados dos dois lados do corredor, parecendo soldados robôs dormindo. No lugar de um sentimento de paz e quietude, as salas radiavam uma ameaça escondida.
As luzes de fora iluminavam os primeiros passos no corredor, mas depois disso, eu não conseguia ver mais nada. Do lado de dentro da porta havia um painel de interruptores de luz, eu os liguei. Nada aconteceu.
Já que a energia estava funcionando lá fora, eu sabia que a eletricidade tinha sido cortada por uma mão. Eu me perguntei se isso era parte do plano do Elliot. Eu não conseguia vê-lo e nem a . Também não vi o Patch. Eu teria que
fazer meu caminho através de cada sala na escola, fazendo um jogo de eliminação até que eu o encontrasse. Juntos nós poderíamos achar a .
Usando as paredes como guia, eu rastejei para frente. Em qualquer dia da semana, eu passava nesse trecho de corredor várias vezes, mas na escuridão de repente pareceu estranho. E mais comprido. Muito comprido.
Na primeira interseção eu avaliei mentalmente meu ambiente. Virar a esquerda me levaria aos escritórios administrativos, bem como para a escada dupla. Eu continuei em frente, me aprofundando na escola, em direção as salas de aulas.
Meu pé ficou preso em alguma coisa e antes que eu pudesse reagir, eu me alastrei no chão. A luz cinza nebulosa filtrada por uma clarabóia diretamente acima enquanto a Lua saia por entre as nuvens, iluminou as características do corpo que eu tropecei. Jules estava de costas, sua expressão fixa em um olhar perdido. Seu cabelo longo e loiro estava emaranhado em seu rosto, suas mãos caídas ao seu lado.
Eu fiquei de joelhos e cobri minha boca, ofegante. Minhas pernas tremiam com a adrenalina. Muito devagar, eu coloquei a palma da minha mão no peito do Jules. Ele não estava respirando. Ele estava morto.
Eu fiquei em pé e engasguei com um grito. Eu queria chamar o Patch em voz alta, mas isso daria minha localização para o Elliot – isso se ele ainda não sabia. Eu percebi que ele poderia estar metros daqui, me observando enquanto seu jogo perverso se desdobrava.
A iluminação que vinha de cima enfraqueceu e eu fiz uma pesquisa frenética no corredor. Mais corredor sem fim se estendia a minha frente. A biblioteca era em cima, um pequeno lance de escadas a minha esquerda. As salas de aula começavam a direita. Num momento de decisão dividida, eu escolhi a biblioteca, tateando pelos corredores enegrecidos para me afastar do corpo do Jules. Meu nariz escorreu e eu percebi que estava chorando silenciosamente. Por que Jules está morto? Quem o matou? Se Jules está morto, a também está?
As portas da biblioteca estavam destrancadas e eu entrei. Passando pelas prateleiras de livros, no final da biblioteca, havia três pequenas salas de estudo. Eles eram a prova de som; se o Elliot quisesse isolar a , as salas eram o lugar ideal para colocá-la.
Eu estava começando a ir em direção às salas quando um gemido masculino ecoou pela biblioteca. Eu cheguei a um impasse.
As luzes do corredor se acenderam, iluminando a escuridão da biblioteca. O corpo do Elliot estava caído alguns metros a frente, sua boca estava repartida,
sua pele estava cinzenta. Seus olhos rolaram em minha direção e ele ergueu um braço para mim.
Um grito estridente escapou de mim. Girando, eu corri para as portas da biblioteca, jogando e chutando as cadeiras que estavam no caminho. Corra! Eu ordenei a mim mesma. Vá para a saída!
Eu cambaleei para fora das portas, foi quando as luzes do corredor se apagaram, mergulhando tudo novamente na escuridão.
“Patch!” eu tentei gritar. Mas minha voz chamou e eu fiquei engasgada no seu nome.
Jules estava morto. Elliot estava quase morto. Quem os tinha matado? Quem tinha sobrado? Eu tentei dar algum sentido ao que estava acontecendo, mas toda razão havia me escapado.
Um empurrão nas minhas costas me tirou o equilibro. Outro empurrão me fez voar para o lado. Minha cabeça bateu em um armário, me assombrando.
Um feixe de luz cruzou minha visão e um par de olhos negros atrás de uma máscara de esqui entrou em foco. A luz vinha de uma lanterna de mina presa acima da máscara.
Empurrei para cima e tentei correr. Um dos seus braços disparou, barrando minha escapada. Ele ergueu seu outro braço, me prendendo contra o armário.
“Você achou que eu estava morto?” Eu podia ouvir o sorriso triunfante e gelado em sua voz. “Eu não podia perder a última oportunidade de brincar com você. Diverte-me. Quem você achou que fosse o cara mau? Elliot? Ou passou pela sua mente que sua melhor amiga poderia ter feito isso? Estou ficando quente, não? Isso é o que acontece com o medo. Trás o que há de pior em nós.”
“É você.” Minha voz crepitou.
Jules arrancou a lanterna e a máscara de esqui. “Em carne e osso.”
“Como você fez isso?” eu perguntei com a voz ainda tremendo. “Eu vi você. Você não estava respirando. Você estava morto.”
“Você está me dando muito crédito. Foi tudo você . Se sua mente não fosse tão fraca, eu não conseguiria ter feito nada. Estou fazendo você se sentir mal? É desanimador saber que de todas as mentes que eu invadi, a sua está no topo da lista das mais fáceis? E mais divertida?”
Eu lambi os lábios. Minha boca tinha um gosto estranho, uma combinação de seca e pegajosa. Eu podia sentir o cheiro de medo na minha respiração. “Onde está a ?”
Ele bateu no meu rosto. “Não mude de assunto. Você deveria realmente aprender a controlar seu medo. Medo mina a lógica e abre várias oportunidades para pessoas como eu.”
Este era um lado do Jules que eu nunca tinha visto. Ele foi sempre tão quieto, tão taciturno, radiando uma completa falta de interesse em qualquer um a sua volta. Ele ficava ao fundo, demandando pouca atenção, pouca suspeita. Muito inteligente da parte dele, eu pensei.
Ele agarrou meu braço e empurrou-me atrás dele.
Eu o agarrei e torci o corpo e ele levou seu punho no meu estômago. Eu tropecei para trás, procurando por um ar que não vinha. Meu ombro arrastou para baixo um armário até que eu sentei e dobrei no chão. Uma faixa de ar desceu na minha garganta e eu engasguei com ele.
Jules tocou os arranhões que minhas unhas tinham deixado em seu antebraço. “Isso vai custar caro para você.”
“Por que você me trouxe aqui? O que você quer?” Eu não conseguia evitar a histeria na minha voz.
Ele me levantou pelo braço e me arrastou mais fundo no corredor. Chutando uma porta para abrir, ele me empurrou para dentro e eu caí, as palmas das minhas mãos colidiram contra o chão duro. A porta bateu atrás de mim. A única luz vinha da lanterna que o Jules segurava.
O ar tinha os odores familiares de produtos químicos e pó de giz. Pôsteres de corpo humano e seções transversais de células humanas decoravam a parede. Um grande balcão de granito com uma pia ficava a frente do cômodo. Estava de frente para várias mesas de granito parecidas. Nós estávamos dentro da ala de biologia do Treinador McConaughy.
Um lampejo de metal passou pelos meus olhos. Um bisturi estava no chão, enfiado na lixeira. Deve ter sido negligenciado pelo Treinador e pelo zelador. Enfiei-o na cintura da minha calça enquanto o Jules me colocava em pé.
“Eu tive que cortar a eletricidade,” ele disse, colocando a lanterna na mesa mais próxima. “Você não pode brincar de esconde-esconde na claridade.”
Raspando duas cadeiras pelo chão, ele as posicionou uma de frente para outra. “Sente-se.” Não parecia um convite.
Meus olhos dispararam para o painel de janelas que abrangia a parede mais distante. Eu me perguntei se eu conseguiria abrir uma e escapar antes do Jules me pegar.
Entre mil outros pensamentos de auto preservação, eu disse a mim mesma para não parecer assustada. Em algum lugar no fundo da minha mente eu me lembrei dos conselhos das aulas de autodefesa que eu fiz junto com a mamãe depois que meu pai morreu. Fazer contato visual... Parecer confiante... Usar o senso comum... Tudo mais fácil falar do que fazer.
Jules me empurrou pelo ombro, forçando-me a sentar na cadeira. O metal frio escoou pelo meu jeans.
“Dê-me seu celular,” ele ordenou, ergueu a mão para esperar por isso.
“Eu deixei no carro.”
Ele sorriu. “Você quer realmente fazer joguinho comigo? Eu tenho sua melhor amiga trancada em algum lugar no prédio. Se você fizer joguinhos comigo, ela vai se sentir excluída. Eu terei que pensar em um jogo extra especial para fazer com ela.”
Eu tirei meu telefone e passei para ele.
Com uma força sobre humana ele o partiu ao meio. “Agora somos apenas nós dois.” Ele deixou-se cair na cadeira que estava na minha frente e esticou suas pernas luxuosamente. Um dos braços pendia no encosto da cadeira. “Vamos conversar .”
Eu pulei da cadeira. Jules me enganchou pela cintura antes que eu pudesse dar quatro passos e me jogou de volta na cadeira.
“Eu costuma ter cavalos,” ele disse. “Há muito tempo atrás na França, eu tinha um estábulo com lindos cavalos. Os cavalos espanhóis eram meus favoritos. Eles eram capturados ainda selvagens e trazidos direto para mim. Em semanas eu os domava. Mas sempre havia um cavalo raro que se recusava a ser domado. Você sabe o que eu fazia com o cavalo que se recusava a ser domado?”
Eu estremeci em resposta.
“Coopere e você não terá nada a temer,” ele disse.
Em nenhum momento eu acreditei nele. O brilho em seus olhos não era de sinceridade.
“Eu vi o Elliot na biblioteca.” Eu estava surpresa pela hesitação na minha voz. Eu não gostava ou confiava no Elliot, mas ele não merecia morrer vagarosamente e com dor. “Você o machucou?”
Ele chegou mais perto, como se fosse dividir um segredo. “Se você for cometer um crime, nunca deixe evidência. Elliot tem sido uma parte integral de tudo. Ele sabia muito.”
“É por isso que estou aqui? Por causa da reportagem que eu achei sobre a Kjirsten Halverson?”
Jules sorriu. “Elliot deixou de mencionar que você sabe sobre a Kjirsten.”
“O Elliot a matou... ou foi você?” Perguntei com uma onda fria de inspiração.
“Eu tinha que testar a lealdade do Elliot. Eu tirei o que era mais importante. Elliot estava na Kinghorn com bolsa e ninguém o deixava esquecer sobre isso.
Até que eu cheguei. Eu fui seu benfeitor. No fim, ele tinha que escolher entre eu e a Kjirsten. Mais sucintamente, escolher entre dinheiro e amor. Aparentemente não há prazer em ser pobre entre os príncipes. Eu o comprei e foi quando eu soube que eu poderia contar com ele quando fosse hora de lidar com você.”
“Por que eu?”
“Você ainda não percebeu?” A luz destacava a crueldade em seu rosto, criando a ilusão de que seus olhos tinham mudado para a cor de prata derretida. “Eu tenho brincado com você. Fazendo de você uma marionete. Usando você como representante, porque a pessoa que eu quero realmente ferir não pode ser ferida. Você sabe quem é essa pessoa?”
Todos os nós do meu corpo pareciam desfeitos. Meus olhos perderam o foco. O rosto do Jules parecia uma pintura impressionista – borrada nos cantos, sem detalhes. O sangue foi drenado da minha cabeça e senti que eu começava a escorregar da cadeira. Eu já tinha me sentido assim vezes suficientes para saber do que eu precisava: ferro. E rápido.
Ele deu um tapa no meu rosto novamente. “Foco. De quem estou falando?”
“Eu não sei.” Eu não conseguia que minha voz fosse mais que um sussurro.
“Você sabe por que ele não pode ser ferido? Porque ele não tem um corpo humano. Seu corpo carece de sensação física. Se eu o trancasse e o torturasse, não valeria a pena. Ele não pode sentir. Nem um pouquinho de dor. Com certeza você tem um palpite agora? Você tem passado muito tempo com essa pessoa. Por que está tão silenciosa ? Você não consegue descobrir?”
Uma gota de suor desceu nas minhas costas.
“Todo ano no começo do mês Hebreu do Cheshvan, ele toma o controle do meu corpo. Duas semanas inteiras. Isso é quanto tempo eu perco o controle. Sem liberdade, sem escolha. Eu não posso ter o luxo de escapar durante essas duas semanas, emprestando meu corpo e voltar quando tiver tudo acabado. Então eu seria capaz de me convencer que aquilo não estava acontecendo realmente. Não. Ainda estou aqui, um prisioneiro dentro do meu próprio corpo, vivendo cada momento disso,” ele disse num tom monótono. “Você sabe como é sentir-se assim? Você sabe?” ele gritou.
Eu mantive minha boca fechada, sabendo que falar poderia ser perigoso. Jules riu, uma rajada de ar entre seus dentes. Soou mais sinistro do que qualquer coisa que eu já tinha ouvido.
Ele disse, “Fiz um juramento permitindo ele tomar posse do meu corpo durante o Cheshvan. Eu tinha dezasseis anos de idade.” Ele encolheu os ombros, mas foi um movimento rígido. “Ele enganou-me para jurar me
torturando. Depois, ele me disse que eu não era humano. Você acredita? Não humano. Ele me disse que minha mãe, uma humana, dormiu com um anjo caído.” Ele sorriu odiosamente, suor salpicava sua testa. “Eu mencionei que eu herdei algumas características do meu pai? Assim como ele, eu sou um enganador. Eu faço você ver mentiras. Eu faço você escutar vozes.”
Assim. Você pode me ouvir ? Você ainda está amedrontada?
Ele deu um tapinha na minha testa. “O que está acontecendo aí ? Terrivelmente quieto.”
Jules era Chauncey. Ele era Nephilim. Lembrei-me da minha marca de nascimento e o que a Dabria tinha me contado. Jules e eu dividimos o mesmo sangue. Nas minhas veias tinha o sangue de um monstro. Eu fechei meus olhos e uma lágrima escapou.
“Lembra-se da primeira noite que nos conhecemos? Eu pulei na frente do carro que você estava dirigindo. Estava escuro e tinha neblina. Você já estava no limite, o que ficou muito mais fácil para enganá-la. Eu gostei de te assustar. Foi a primeira noite que tive gosto para isso.”
“Eu deveria ter percebido que era você,” eu sussurrei. “Não existem tantas pessoas tão altas quanto você.”
“Você não está escutando. Eu posso fazer você ver qualquer coisa que eu queira. Você realmente acha que eu esqueceria um detalhe que me condenava como minha altura? Você viu o que eu quis que você visse. Você viu um homem indescritível em uma máscara de esqui preta.”
Fiquei sentada lá, sentindo uma pequena rachadura no meu terror. Eu não estava louca. Jules estava por trás de tudo isso. Ele pode criar jogos mentais porque seu pai era um anjo caído e ele herdou o poder. “Você não revistou meu quarto de verdade,” eu disse. “Você apenas fez com que eu pensasse que você o fez. É por isso que ele ainda estava em ordem quando a polícia chegou.”
Ele aplaudiu devagar e deliberadamente. “Você quer saber qual foi a melhor parte? Você poderia ter me bloqueado. Eu não poderia ter tocado sua mente sem sua permissão. Eu fui chegando e você nunca resistiu. Você foi fraca. Você foi fácil.”
Tudo isso fazia sentido e no lugar de sentir um breve momento de alívio, eu percebi o quão susceptível eu era. Eu fui despida. Não havia nada que impedisse Jules de me arrastar para seus jogos mentais, a menos que eu aprendesse a bloqueá-lo.
“Imagine-se em meu lugar,” Jules disse. “Seu corpo sendo violado ano após ano. Imagine um ótimo muito forte que nada além de vingança pode curá-lo. Imagine despender grandes somas de energia e recursos para ficar de olho no
seu objeto de vingança, esperando pacientemente pelo momento quando o destino lhe apresentou não apenas uma oportunidade, mas uma em que a balança está ao seu favor.” Seus olhos se prenderam aos meus. “Você é essa oportunidade. Se eu a ferir, eu vou ferir o Patch.”
“Você está sobrestimando meu valor com o Patch,” eu disse, com o suor frio descendo pela linha do meu cabelo.
“Eu estou de olho no Patch há séculos. No último verão ele fez sua primeira viajem para sua casa, porém, acho que você não percebeu. Ele a seguiu quando você foi fazer compras algumas vezes. De vez em quando ele fez uma viagem especial, saindo do seu caminho habitual, para te encontrar. Então ele se matriculou na sua escola. Eu não pude evitar a não ser me perguntar: o que você tem de tão especial? Fiz um esforço para descobrir. Tenho te observado há algum tempo já.”
Nenhum temor se apoderou de mim. Nesse momento eu soube que nunca foi a presença do meu pai que eu sentia, seguindo-me como um guardião fantasma. Era o Jules. Eu sentia a mesma presença sobrenatural gelada agora, só que amplificada umas cem vezes.
“Eu não queria despertar suspeitas no Patch para ele recuar,” ele continuou. “Foi quando o Elliot deu um passo a frente e não demorou muito para que ele me dissesse o que eu já tinha adivinhado. Patch está apaixonado por você.”
Tudo se encaixou. Jules não estava doente na noite que ele desapareceu no banheiro masculino no Delphic. E ele não ficou doente na noite que fomos ao Borderline. Tudo isso pelo simples fato de que ele precisava se manter invisível para o Patch. No momento que o Patch o visse, tudo estaria acabado. Patch saberia que Jules – Chauncey – estava tramando alguma coisa. Elliot era os olhos e ouvidos do Jules, levando as informações para ele.
“O plano é te matar na viagem para o acampamento, mas Elliot falhou ao te convencer a ir,” Jules disse. “Hoje mais cedo, eu te segui depois que você saiu do Blind Joe’s e atirei em você. Imagine minha surpresa quando eu descobri que matei uma mendiga vestida com seu casaco. Mas deu tudo certo.” Seu tom era relaxado. “Aqui estamos.”
Eu me mexi no assento e o bisturi escorregou mais para dentro do meu jeans. Se eu não fosse cuidadosa, ele escaparia do meu alcance. Se Jules me forçasse a ficar em pé, talvez ele deslizasse pelas minhas pernas. E aí seria o fim.
“Deixe-me adivinhar o que você está pensando,” Jules disse, ficando em pé e começou a passear na frente da sala. “Você está começando a desejar que você nunca tivesse conhecido o Patch. Você deseja que ele nunca tivesse se apaixonado por você. Vá em frente. Ria da posição em que ele te colocou. Ria da sua própria escolha ruim.”
Ouvir o Jules falar sobre o amor de Patch me encheu de esperança irracional.
Eu tirei o bisturi da calça e pulei da cadeira. “Não chegue perto de mim! Eu vou te esfaquear. Eu juro que vou!”
Jules fez um som gutural e arremessou seu braço para o balcão na frente da sala. Provetas de vidro se quebraram batendo contra o quadro negro, papéis caíam. Ele caminhou em minha direção. Em pânico, eu ergui o bisturi o mais forte que pude. O bisturi encontrou a palma de sua mão, cortando sua pele.
Jules sibilou e recuou.
Sem esperar, eu mergulhei o bisturi em sua coxa.
Jules ficou pasmo com o metal que saía de sua perna. Ele arrancou-o usando as duas mãos, seu rosto se contorcia de dor. Ele abriu suas mãos e o bisturi caiu e fez barulho.
Ele deu um passo hesitante em minha direção.
Eu gritei e me esquivei fugindo, mas meu quadril bateu na quina da mesa; eu perdi o equilíbrio e tombei. O bisturi estava a alguns metros de distância.
Jules me virou de barriga para baixo e montou nas minhas costas. Ele pressionou meu rosto no chão, batendo meu nariz e abafando meus gritos.
“Boa tentativa,” ele grunhiu. “Mas isso não vai me matar. Eu sou um Nephilim. Eu sou imortal.”
Eu tentei agarrar o bisturi, cavando meus dedos no chão para me esticar naqueles últimos centímetros vitais. Meus dedos se atrapalharam. Eu estava tão perto e então o Jules me puxou de volta.
Eu ergui meu calcanhar com muita força entre suas pernas; ele urrou e caiu de lado. Eu fiquei em pé meio cambaleando, mas Jules tinha rolado para a porta ficando ajoelhado entre mim e ela.
Seu cabelo caía em seus olhos. Gotas de suor escorriam em seu rosto. Sua boca estava torta, um lado curvado para cima pela dor.
Cada músculo do meu corpo estava pronto para entrar em ação.
“Boa sorte ao tentar escapar,” ele disse com um sorriso cínico que pareceu necessitar de muito esforço. “Você vai ver o que eu quiser.” Então ele caiu no chão. 

Capítulo Vinte e Nove

Eu não fazia ideia de onde a estava. O pensamento óbvio de pensar como Jules veio a mim – onde eu deixaria presa se eu fosse ele?
Ele quer fazer com que seja difícil de escapar e difícil de ser achado, eu considerei.
Eu convocara uma planta mental do prédio, espreitando minha atenção para os níveis superiores. A probabilidade era que estivesse no terceiro andar, o mais alto da escola – exceto por um pequeno quarto andar, que era mais um sótão do que qualquer outra coisa. Uma escada estreita acessível apenas do terceiro andar levava a ele. Havia duas salas de aula de estilo bangalô no alto: Espanhol avançado e o laboratório do eZine.
estava no laboratório do eZine. Bem assim, eu soubera.
Movendo-me tão rapidamente quanto podia na escuridão, eu fui sentindo o caminho por dois andares de escada. Após alguns erros e acertos, eu encontrei a escada estreita que dava para o laboratório do eZine. No alto, eu empurrei a porta.
?” eu chamei suavemente.
Ela soltou um gemido baixo.
“Sou eu,” eu disse, dando cada passo com cuidado enquanto eu manobrava por um corredor de carteiras, não querendo derrubar uma cadeira e alertar Jules da minha locação. “Está machucada? Precisamos cair fora daqui.” Eu a encontrei agachada na frente da sala, abraçando seus joelhos em seu peito.
“Jules me acertou na cabeça,” ela disse, sua voz aumentando. “Eu acho que desmaiei. Agora não consigo ver. Não consigo ver nada!”
“Me escuta. Jules cortou a eletricidade e as cortinas foram puxadas. É só a escuridão. Segure a minha mão. Temos que descer agora mesmo.”
“Eu acho que ele danificou algo. Minha cabeça está pulsando. Eu realmente acho que estou cega!”
“Não está cega,” eu sussurrei, dando-lhe um pequeno chocalhão. “Não consigo ver tampouco. Temos que ir sentindo o caminho escada abaixo. Vamos embora pela saída no escritório de atletismo."
“Ele colocou correntes em todas as portas.”
Um momento de silêncio rígido caiu entre nós. Eu me lembrei de Jules me desejando boa sorte em escapar, e agora eu sabia por que. Um tremor perceptível ondulou do meu coração para o resto do meu corpo. “Não pela
porta que eu entrei,” eu disse por fim. “A porta mais distante a leste está destrancada.”
“Deve ser a única. Eu estava com ele quando ele acorrentou as outras. Ele disse que dessa maneira ninguém ficaria tentado a ir para fora enquanto brincávamos de esconde-esconde. Ele disse que do lado de fora era fora de limites.”
“Se a porta do leste é a única destrancada, ele tentará bloqueá-la. Ele esperará nós irmos até ele. Mas não iremos. Nós sairemos por uma janela,” eu disse, inventando um plano de cabeça. “No lado oposto do prédio – deste lado. Você está com seu celular?”
“Jules o pegou.”
“Quando formos para fora, teremos que nos separar. Se Jules nos caçar, ele terá que escolher uma de nós para seguir. A outra buscará ajuda.” Eu já sabia quem ele escolheria. Jules não tinha uso algum para , exceto para me atrair para cá hoje à noite. “Corra o quanto puder e chegue até um telefone. Chame a polícia. Diga a eles que Elliot está na biblioteca.”
“Vivo?” perguntou, sua voz tremendo.
“Eu não sei.”
Nós ficamos agachadas juntas, e eu senti ela puxar sua camiseta para cima e enxugar seus olhos. “Isso tudo é minha culpa.”
“Isso é culpa do Jules.”
“Estou assustada.”
“Vamos ficar bem,” eu disse, tentando soar otimista. “Eu apunhalei Jules na perna com um bisturi. Ele está sangrando muito. Talvez ele desista de nos caçar e vá conseguir atenção médica.”
Um gemido escapou de . Ambas sabíamos que eu estava mentindo. O desejo de Jules por vingança superava seu ferimento. Superava tudo.
e eu nos arrastamos escada abaixo, ficando junto às paredes, até que estivéssemos de volta no andar principal.
“Por aqui,” eu sussurrei em seu ouvido, segurando sua mão enquanto passávamos correndo pelo corredor, nos dirigindo para mais longe ao oeste.
Não tínhamos andado muito quando um som gutural, não exatamente uma risada, saiu de um túnel de escuridão à frente.
“Ora, ora, o que temos aqui?” Jules disse. Não havia rosto anexado a sua voz.
“Corra,” eu disse a , apertando sua mão. “Ele me quer. Chame a polícia. Corra!”
deixou minha mão cair e correu. Seus passos dissiparam deprimentemente rápidos. Eu me perguntei brevemente se Patch ainda estava no prédio, mas foi mais um pensamento secundário. A maior parte da minha concentração estava em não desmaiar.
Porque mais uma vez, eu me encontrava totalmente sozinha com Jules.
“A polícia levará pelo menos vinte minutos para responder,” Jules me disse, o bater de seus sapatos se aproximando. “Eu não preciso de vinte minutos.”
Eu me virei e corri. Jules começou a correr atrás de mim.
Apalpando minhas mãos pelas paredes, eu virei à direita na primeira intersecção e corri por um corredor perpendicular. Forçada a depender das paredes para me guiar, minhas mãos bateram nas pontas afiadas dos armários e das ombreiras das portas, beliscando minha pele. Eu virei novamente à direita, correndo o mais rápido que pude para as portas duplas do ginásio.
O único pensamento martelando na minha cabeça era que se eu conseguisse chegar no meu armário do ginásio a tempo, eu poderia me trancar dentro. O vestiário feminino era de parede a parede e do chão ao teto com armários excessivamente grandes. Levaria tempo para que Jules arrombasse cada um individualmente. Se eu tivesse sorte, a polícia chegaria antes que ele me achasse.
Eu me lancei no ginásio e corri para o vestiário feminino anexado.
Assim que eu empurrei a maçaneta, eu senti um ferrão de horror frio. A porta estava trancada. Eu bati na maçaneta novamente, mas ela não cedeu. Girando ao redor, eu procurei freneticamente outra saída, mas eu estava presa no ginásio. Eu caí contra a porta, fechei meus olhos apertadamente para protelar o desmaio, e escutei minha respiração aumentar.
Quando eu reabri meus olhos, Jules estava andando na neblina da luz do luar escorrendo pela clarabóia. Ele prendera sua camiseta ao redor de sua coxa; uma mancha de sangue pingou do tecido. Ele estava com uma regata branca e calça de algodão cáqui. Uma arma estava enfiada no elástico de sua calça.
“Por favor me deixe ir,” eu sussurrei.
me contou algo interessante sobre você. Você tem medo de altura.”
Ele levantou seu olhar para as vigas no alto do ginásio. Um sorriso rompeu seu rosto.
O ar estagnado estava encharcado com os cheiros de suor e de verniz de madeira.
O aquecedor fora desligado no recesso da primavera e a temperatura estava gelada. Sombras se esticavam para frente e para trás pelo chão polido
enquanto a luz do luar irrompia pelas nuvens. Jules estava de pé com suas costas para as arquibancadas, e eu vi Patch se mover atrás dele.
“Você atacou Marcie Millar?” eu perguntei a Jules, me ordenando a não reagir e revelar o Patch.
“Elliot me disse que há uma rixa entre vocês duas. Eu não gostei da ideia de outra pessoa ter o prazer de atormentar a minha garota.”
“E a janela do meu quarto? Você me espionou enquanto eu dormia?”
“Nada pessoal.”
Jules endureceu. Ele deu um passo para frente repentinamente e deu uma sacudida no meu punho, me virando na frente dele. Eu senti o que temi ser a arma pressionado contra minha nuca. “Tire seu chapéu,” Jules ordenou a Patch. “Quero ver a expressão no seu rosto quando eu a matar. Você não pode ajudá-la. Tão impotente quanto eu estava para fazer algo quanto ao juramento que prestei para você.”
Patch deu alguns passos mais para perto. Ele se movia facilmente, mas eu senti sua preocupação firmemente controlada. A arma ficou mais próxima, e eu recuei.
“Dê outro passo e esse será o último suspiro dela,” Jules avisou.
Patch olhou a distância entre nós, calculando quão rapidamente ele podia cobri-la. Jules viu isso também.
“Não tente,” ele disse.
“Você não vai atirar nela, Chauncey.”
“Não?” Jules apertou o gatilho. A arma fez um clique, e eu abri minha boca para gritar, mas tudo que saiu foi um gemido trêmulo.
“Revólver,” Jules explicou. “As outros cinco câmaras estão carregadas.”
Pronta para usar os movimentos de boxe dos quais está sempre se gabando? Patch disse para a minha mente.
Minha pulsação estava descontrolada, minhas pernas mal me segurando. “O-o quê?" eu gaguejei.
Sem aviso, uma precipitação de poder fluiu por mim. A força estrangeira se expandiu para me preencher. Meu corpo estava completamente vulnerável para o Patch, toda a minha força e liberdade confiscadas enquanto ele tomava posse de mim. Antes de eu ter tempo de perceber exatamente o quanto essa perda de controle me aterrorizava, uma dor excruciante foi encravada pela minha mão, e eu percebi que Patch estava usando meu punho para socar Jules. A arma foi solta; ela derrapou pelo chão do ginásio para fora de alcance.
Patch comandou que minhas mãos batessem em Jules por trás contra as arquibancadas. Jules tropeçou, caindo nelas.
Quando me dei conta, minhas mãos estavam fechando na garganta de Jules, lançando sua cabeça novamente contra as arquibancadas com um estralar alto! Eu o segurei ali, pressionando meus dedos em seu pescoço. Seus olhos arregalaram-se, então inflaram-se. Ele estava tentando falar, movendo seus lábios ininteligivelmente, mas Patch não o soltou.
Eu não serei capaz de ficar dentro de você por muito mais tempo, Patch falou para os meus pensamentos. Não é Cheshvan e eu não tenho permissão. Assim que eu for expulso, corra. Entendeu? Corra o mais rápido que puder. Chauncey estará fraco e estupefato demais para entrar dentro da sua cabeça. Corra e não pare.
Um alto som de zumbido saiu de mim, e eu senti meu corpo se descascando do de Patch.
Os vasos sanguíneos no pescoço de Jules saltaram para fora e sua cabeça caiu para o lado.
Vamos, eu ouvi Patch o encorajar. Desmaie... desmaie…
Mas era tarde demais. Patch sumiu de dentro de mim. Ele se fora tão repentinamente, eu fiquei tonta.
Minhas mãos estavam em controle novamente, e elas se libertaram do pescoço de Jules impulsivamente. Ele arfou por ar e pestanejou para mim. Patch estava no chão há alguns metros, sem se mover.
Eu me lembrei do que Patch tinha dito e corri a toda velocidade pelo ginásio. Eu me lancei contra a porta, esperando velejar no corredor. Ao invés foi como atingir uma parede. Eu empurrei a barra da porta, sabendo que a porta estava destrancada.
Há cinco minutos eu tinha passado por ela. Eu arremessei todo meu peso contra a porta. Não abria.
Eu me virei, a descida da adrenalina fazendo com que meus joelhos tremessem. “Saia da minha mente!” Eu gritei para Jules.
Se levantando para sentar no menor degrau das arquibancadas, Jules massageou sua garganta. “Não,” ele disse.
Eu tentei a porta novamente. Eu levantei meu pé e chutei a barra da porta. Eu bati minhas palmas contra a fenda de janela da porta. “Socorro! Alguém consegue me ouvir? Socorro!”
Olhando sobre meu ombro, eu encontrei Jules mancando na minha direção, sua perna machucada fazendo um grande esforço a cada passo. Eu espremi meus olhos, tentando me focar. A porta se abriria assim que eu encontrasse sua voz e a varresse para fora. Eu procurei cada canto da minha mente, mas não conseguia encontrá-lo. Ele estava em algum lugar profundo, se escondendo de
mim. Eu abri meus olhos. Jules estava muito mais perto. Eu ia ter que encontrar outra saída.
Perfurada numa parede acima das arquibancadas estava uma escada de ferro. Ela alcançava a grade de vigas no alto do ginásio. Na ponta mais distante das vigas, na parede oposta, quase diretamente acima de onde eu estava, tinha um canal de ventilação. Se eu conseguisse chegar até ele, eu conseguiria escalar e achar outra saída.
Eu saí correndo a toda velocidade por Jules e até as arquibancadas. Meus sapatos bateram na madeira, ecoando pelo espaço vazio, tornando impossível escutar se Jules estava me seguindo. Eu coloquei meu pé no primeiro degrau da escada e me suspendi. Eu escalei um degrau, então outro. De canto de olho, eu vi o bebedouro de muito abaixo. Estava pequeno, o que queria dizer que eu estava no alto. Muito no alto.
Não olhe para baixo, eu me ordenei. Concentre-se no que está acima. Eu escalei tentativamente mais um degrau. A escada chacoalhou, não soldada propriamente à parede.
A risada de Jules chegou até a mim, e minha concentração escorregou. Imagens de despencação relampejaram na minha mente. Logicamente, eu sabia que ele as estava plantando.
Então meu cérebro inclinou-se, e eu não conseguia me lembrar que lado era para cima ou para baixo. Eu não conseguia decifrar quais pensamentos eram meus e quais pertenciam ao Jules.
Meu medo era tão grosso que borrava minha visão. Eu não sabia onde eu estava na escada. Meus pés estavam centrados? Eu estava perto de escorregar?
Apertando o degrau com ambas as mãos, eu pressionei minha testa contra meus nós dos dedos. Respire, eu disse a mim mesma. Respire!
E então eu ouvi.
O som vagaroso e agonizante de metal rangendo. Eu fechei meus olhos para suprimir um ataque de tontura.
Os suportes de metal segurando o alto da escada à parede se soltaram. O resmungo metálico mudou para um lamento agudo enquanto o próximo conjunto de suportes foi arrancado da parede. Eu observei com um grito preso na minha garganta enquanto toda a metade de cima da escada era solta. Prendendo meus braços e pernas ao redor da escada, eu me preparei para cair para trás.
A escada hesitou um momento no ar, pacientemente sucumbindo à gravidade.
E então tudo aconteceu rapidamente. As vigas e clarabóias dissiparam-se num borrão vertiginoso. Eu voei para baixo até que, repentinamente, a escada parou. Ela se balançou para cima e para baixo, perpendicular à parede, nove metros acima do chão. O impacto sacolejou as minhas pernas e as soltou, as minhas mãos sendo a minha única ligação com a escada.
“Socorro!” eu gritei, minhas pernas pedalando no ar.
A escada recuou para o lado, caindo mais vários metros. Um dos meus sapatos escorregou do meu pé, ficou preso pelo meu dedão, então caiu. Muito tempo mais tarde, atingiu o chão do ginásio.
Eu mordi minha língua enquanto a dor nos meus braços se aprofundava. Eles estavam sendo arrancados de seus encaixes.
E então, através do medo e do pânico, eu ouvi a voz do Patch. Bloqueie-o. Continue subindo. A escada está intacta.
“Não posso,” eu choraminguei. “Ela vai cair!”
Bloqueie-o. Feche seus olhos. Escute a minha voz.
Engolindo em seco, eu forcei meus olhos a fecharam. Eu me agarrei à voz de Patch e senti uma superfície vigorosa tomar forma abaixo de mim. Meus pés não estavam mais balançando no ar. Eu senti um dos degraus da escada escavando na planta dos meus pés.
Focando-me com resolução na voz de Patch, eu esperei até que o mundo se rastejasse de volta ao lugar. Patch estava certo. Eu estava na escada. Eu estava endireitada, presa à parede. Eu recuperei uma porção de determinação e continuei escalando.
No alto eu relaxei precariamente na viga mais próxima. Eu coloquei meus braços ao redor dela, então balancei minha perna direita para cima e sobre ela. Eu estava encarando a parede, com as minhas costas para o canal de ventilação, mas não havia nada que eu pudesse fazer agora. Muito cuidadosamente, eu me levantei de joelhos. Usando toda a minha concentração, eu comecei a avançar de costas pela expansão do ginásio.
Mas era tarde demais.
Jules tinha escalado rapidamente, e estava agora a menos de cinco metros de mim. Ele escalou a viga. Mão sobre mão, ele se arrastou na minha direção. Um corte escuro na parte interior de seu pulso capturou minha atenção. Ele cruzava suas veias num ângulo de noventa graus e era quase preto na cor. Para qualquer outra pessoa, podia ter parecido com uma cicatriz. Para mim, significava muito mais. A conexão familiar era óbvia. Nós dividíamos o mesmo sangue, e isso mostrava nas nossas marcas idênticas.
Ambos estávamos sentados de pernas aberta na viga, sentados cara a cara, três metros de distância.
“Alguma palavra final?” Jules disse.
Eu olhei para baixo, mesmo isso me deixando tonta. Patch estava muito abaixo no chão do ginásio, imóvel como um morto. Bem então, eu queria voltar no tempo e reviver cada momento com ele. Mais um sorriso secreto, mais uma risada compartilhada. Mais um beijo eletrizante. Achá-lo foi como achar alguém que eu não sabia que estava procurando. Ele tinha chego na minha vida tarde demais, e agora estava partindo cedo demais. Eu lembrei dele me dizendo que desistiria de tudo por mim. Ele já tinha. Ele já tinha desistido de um corpo próprio para que eu pudesse viver.
Eu vacilei acidentalmente, e instintivamente caí mais para me equilibrar.
A risada de Jules transmitiu um sussurro gelado. “Não faz diferença para mim se eu atiro em você ou se você cai para a sua morte.”
“Faz diferença,” eu disse, minha voz baixa, mas confiante. “Você e eu partilhamos o mesmo sangue.” Eu levantei minha mão precariamente, mostrando-lhe minha marca de nascença. “Sou sua descendente. Se eu sacrificar meu sangue, Patch se tornará humano e você morrerá. Está escrito n ’O Livro de Enoque.”
Os olhos de Jules estavam desprovidos de luz. Eles estavam treinados em mim, absorvendo cada palavra que eu falava. Eu podia afirmar pela expressão dele que ele estava pesando as minhas palavras. Um rubor cresceu em seu rosto, e eu soube que ele acreditava em mim. “Você –,” ele cuspiu.
Ele deslizou na minha direção com uma velocidade frenética, simultaneamente esticando a mão para seu cinto para tirar a arma.
Lágrimas surgiram nos meus olhos. Sem tempo para pensar duas vezes, eu me atirei da viga. 

Capítulo Trinta

A porta abriu e fechou. Eu esperei ouvir passos se aproximando, mas o único som que ouvi foi o tic-tac do relógio: uma batida rítmica e firme soando através do silêncio.
O som começou a desaparecer. Eu me perguntei se eu o ouviria parar completamente. De repente eu temi esse momento, incerta do que viria depois.
Um som mais vibrante se sobressaiu ao relógio. Foi um som etéreo, tranquilizante, como uma dança no ar. Asas, eu pensei. Vindo me buscar.
Eu segurei minha respiração, esperando, esperando, esperando. Então o relógio começou a ir ao sentido inverso. No lugar de um som lento, veio um mais certo. Um espiral como líquido se formou dentro de mim. Eu estava deslizando através de mim para um lugar escuro e quente.
Meus olhos abriram para painéis de carvalho familiares no teto acima de mim. Meu quarto. Uma sensação de reafirmação me inundou então me lembrei de onde estive. No ginásio com o Jules.
Um tremor percorreu minha pele.
“Patch?” eu disse, minha voz estava rouca de desuso. Eu tentei sentar-me, então dei um choro abafado. Alguma coisa estava errada com meu corpo. Cada osso, músculo, célula estava ferida. Eu me sentia como um hematoma gigante.
Houve um movimento perto da porta. Patch encostou no batente da porta. Sua boca estava pressionada firmemente sem sua pontada de humor usual. Seus olhos estavam mais profundos do que eu jamais tinha visto. Eles estavam afiados por um limite protetor.
“Foi uma boa luta lá no ginásio,” ele disse. “Mas acho que você se beneficiaria com mais algumas aulas de boxe.”
Como uma onda, tudo voltou. Lágrimas rolaram de dentro de mim. “O que aconteceu? Onde está o Jules? Como cheguei aqui?” Minha voz estava rachada com o pânico. “Eu me joguei da viga.”
“Precisou de muita coragem para fazer aquilo.” A voz do Patch se tornou rouca e ele atravessou meu quarto andando. Ele fechou a porta atrás dele e eu sabia que era o jeito dele tentar trancar para fora todo o mal. Ele estava colocando uma divisão entre mim e tudo o que tinha acontecido.
Ele veio e sentou-se na cama ao meu lado. “Do que mais você se lembra?”
Eu tentei juntar os pedaços da minha memória, trabalhando de trás para frente. Eu me lembrei do bater de asas que ouvi logo depois de ter me jogado
da viga. Sem dúvida nenhuma eu sabia que tinha morrido. Eu sabia que um anjo tinha vindo para carregar minha alma.
“Estou morta, não estou?” eu disse baixinho, cambaleando com pavor. “Eu sou um fantasma?”
“Quando você pulou, o sacrifício matou o Jules. Tecnicamente, quando você voltou, ele também deveria ter voltado. Mas já que ele não tinha uma alma, ele não tinha nada para reavivar seu corpo.”
“Eu voltei?” eu disse, esperando que eu não estivesse me enchendo de falsas esperanças.
“Eu não aceitei seu sacrifício. Eu o desfiz.”
Eu senti um pequeno Oh formar-se na minha boca, mas isso nunca passou pelos meus lábios. “Você está dizendo que desistiu de um corpo humano por mim?”
Ele ergueu minha mão enfaixada. Debaixo de toda a gaze, minhas articulações pulsavam por ter batido no Jules. Patch beijou cada dedo, sem pressa, mantendo seus olhos colados nos meus. “O que há de bom em ter um corpo se não posso ter você?”
Lágrimas pesadas rolaram pelas minhas bochechas, Patch me puxou para ele e aconchegou minha cabeça em seu peito. Muito devagar o pânico foi embora e eu soube que tudo tinha acabado. Eu iria ficar bem.
Repentinamente eu me afastei. Se Patch tinha recusado o sacrifício, então – “Você salvou minha vida. Vire-se.” Eu ordenei solenemente.
Patch me deu um sorriso tímido e atendeu meu pedido. Eu ergui sua camiseta até os ombros. Suas costas eram suaves e com a musculatura definida. As cicatrizes tinham sumido.
“Você não pode ver minhas asas,” ele disse. “Elas são feitas de material espiritual.”
“Agora você é um anjo da guarda.” Eu ainda estava muito admirada para envolver minha mente nisso, mas ao mesmo tempo eu senti uma curiosa... Felicidade.
“Eu sou o seu anjo da guarda,” ele disse.
“Eu tenho meu próprio anjo da guarda? No que constitui seu trabalho exatamente?”
“Guardar seu corpo.” Seu sorriso aumentou. “Eu levo meu trabalho a sério, o que significa que vou precisar me familiarizar com o assunto em um nível pessoal.”
Meu estômago ficou todo agitado. “Isso significa que agora você pode sentir?”
Patch me observou em silêncio por um tempo. “Não, mas isso significa que eu não estou na lista negra.”
No andar de baixo, eu escutei o rumor baixo da porta da garagem sendo aberta.
“Minha mãe!” eu engasguei. Eu encontrei o relógio na mesa-de-cabeceira. Era pouco depois das suas da manhã. “Eles devem ter aberto a ponte. Como essa coisa de anjo da guarda funciona? Sou a única pessoa que pode te ver? Quero dizer, você é invisível para as outras pessoas?”
Patch me encarou como se ele esperasse que eu não estivesse falando sério.
“Você não é invisível?” eu guinchei. “Você tem que dar o fora daqui!” Eu fiz um movimento para empurrar o Patch para fora da cama, mas fui interrompida por um golpe seco nas minhas costelas. “Ela vai me matar se te encontrar aqui. Você pode escalar árvores? Diga-me que você pode escalar uma árvore!”
Patch sorriu. “Eu posso voar.”
Oh. Certo. Bem, okay.
“A polícia e o departamento de bombeiros estiveram aqui mais cedo,” Patch disse. “A suite principal vai precisar de reforma, mas eles impediram que o fogo se alastrasse. A polícia vai voltar. Eles vão fazer algumas perguntas. Se eu tivesse que adivinhar, eles tentaram te rastrear pelo telefone que você ligou para o 911.”
“O Jules o pegou.”
Ele fez um aceno com a cabeça. “Eu imaginei. Eu não me importo com o que você vai dizer a polícia, mas eu agradeceria se me deixasse fora disso.” Ele deslizou a janela do meu quarto para abrir. “Uma última coisa. A trouxe a polícia a tempo. Os paramédicos salvaram o Elliot. Ele está no hospital, mas ele vai ficar bem.”
Eu ouvi a porta fechar no andar debaixo, no fim das escadas.
Mamãe estava dentro de casa.
?” ela chamou. Ela jogou sua bolsa e chaves na mesa de entrada. Seus saltos altos faziam barulho no chão de madeira, quase em um ritmo de corrida. “! Tem fita da polícia na porta da frente! O que está acontecendo?”
Eu olhei para a janela. O Patch já tinha ido, mas uma única pena preta estava presa na parte de fora do vidro, por causa da chuva da noite passada. Ou pela mágica de anjo.
No andar de baixo, minha mãe acendeu a luz da entrada, um fraco raio de luz se esticou por debaixo da minha porta. Segurei minha respiração e contei os segundos, sabendo que eu tinha mais dois antes –
Ela gritou. “! O que aconteceu com o balaústre!”
Bom saber que ela ainda não tinha visto seu quarto ainda.
O céu estava perfeito, lavado de azul. O sol estava apenas começando a aparecer no horizonte. Era segunda-feira, um novo dia, os horrores das últimas vinte e quatro horas ficaram para trás. Tive cinco horas de sono completo e todas as outras que a dor em todo o meu corpo por ter sido sugada pela morte e em seguida ter sido cuspida de volta permitiram, eu me sentia extraordinariamente renovada. Eu não queria uma ter nuvem negra no momento, lembrando-me que a polícia estava para chegar a qualquer momento para tomar meu depoimento dos eventos da noite passada. Eu ainda não tinha pesado no que iria dizer a eles.
Fui para o banheiro com minha camisola – bloqueando mentalmente a pergunta de como tinha colocado ela, já eu provavelmente estava usando as roupas da noite anterior quando Patch me trouxe para casa – e cumpri minha rotina matinal. Joguei água fria no rosto, escovei os dentes e domei meu cabelo com uma faixa elástica. No meu quarto, coloquei uma camiseta e calça limpas.
Eu liguei para a .
“Como você está?” eu perguntei.
“Bem. Como você está?”
“Bem.”
Silêncio.
“Okay,” disse rapidamente, “Ainda estou surtando. E você?”
“Completamente.”
“Patch me ligou no meio da noite. Ele disse que Jules foi muito violento com você, mas que você estava bem.”
“Sério? Patch te ligou?”
“Ele ligou do Jeep. Ele disse que você estava dormindo no banco de trás e iria te levar para casa. Ele disse que aconteceu de ele estar passando perto da escola quando ele ouviu um grito. Ele disse que encontrou você no ginásio, mas você tinha desmaiado de dor. Depois ele olhou para cima e viu Jules pular da viga. Ele disse que o Jules deve ter pirado, um efeito colateral da culpa pesada que sentiu por ter aterrorizado você.”
Eu não tinha percebido que estava segurando a respiração até tê-la soltado. Obviamente o Patch tinha manipulado alguns detalhes.
“Você sabe que não acredito nisso,” continuou. “Você sabe que acho que o Patch matou o Jules.”
Na posição da , provavelmente eu teria pensado o mesmo. Eu disse, “O que a polícia acha?”
“Ligue a TV. Tem uma cobertura ao vivo agora no canal cinco. Eles estão dizendo que o Jules invadiu a escola e pulou. Eles estão se referindo a isso como um trágico suicídio adolescente. Eles estão pedindo para as pessoas que tem informações ligarem para o telefone que está na parte de cima da tela.”
“O que você disse para a polícia quando você os chamou pela primeira vez?”
“Eu estava apavorada. Eu não queria ser presa por invasão. Então liguei como anônima de um telefone público.”
“Bem,” eu disse afinal, “se a polícia está tratando isso como suicídio, eu acho que foi isso que aconteceu. Afinal são tempos modernos na América. Temos o benefício dos peritos.”
“Você está escondendo alguma coisa de mim,” a disse. “O que aconteceu realmente depois que eu saí?”
Era aqui que a coisa complicava. era minha melhor amiga e nós vivíamos sob o lema: Sem Segredos. Mas algumas coisas eram impossíveis de explicar. O fato do Patch ser um anjo caído convertido em anjo da guarda estava no topo da lista. Logo abaixo estava o fato de eu ter pulado da viga e morrido, mas eu ainda estou viva hoje.
“Eu me lembro do Jules encurralando-me no ginásio,” eu disse. “Ele me contou toda a dor e medo que iria me infligir. Depois disso, os detalhes ficam nebulosos.”
“É muito tarde para desculpas?” disse, parecendo mais sincera do que ela já tinha sido em toda nossa amizade. “Você estava certa sobre o Jules e o Elliot.”
“Desculpas aceitas.”
“Nós deveríamos ir fazer compras,” ela disse. “Sinto essa necessidade irresistível de comprar sapatos. Muitos deles. O que nós precisamos é de uma boa e velha terapia de compras de sapatos.”
A campainha tocou e eu olhei para o relógio. “Tenho que dar meu depoimento para a polícia sobre o que aconteceu na noite passada, mas eu te ligo depois disso.”
“Noite passada?” O tom da denunciava pânico. “Eles sabem que você estava na escola? Você não deu meu nome para eles, deu?”
“Na verdade uma coisa aconteceu antes.” Alguma coisa chamada Dabria. “Te ligo logo,” eu disse, desligando antes de ter que mentir para dar outra explicação.
Mancando pelo corredor até o topo da escada onde vi quem minha mãe tinha convidado a entrar.
Os detetives Basso e Holstijic.
Ela os acompanhou até a sala e embora o detetive Holstijic colapsou no sofá, o detetive Basso permaneceu em pé. Ele estava de costas para mim, mas um degrau rangeu no meio da minha descida e ele se virou.
,” ele disse com sua voz de policial durão. “Encontramo-nos novamente.”
Minha mãe piscou. “Vocês já se encontraram antes?”
“Sua filha tem uma vida excitante. Parece que estamos aqui toda semana.”
Minha mãe me deu um olhar questionador e eu ergui os ombros, sem pistas, como se fosse para adivinhar, piadinha de policial?
“Por que você não se senta, , e nos conte o que aconteceu,” o detetive Holstijic disse.
Eu me acomodei em uma das poltronas macias do lado oposto do sofá. “Antes das nove, na noite passada, eu estava na cozinha tomando leite com chocolate quando a Srta. Greene, minha psicóloga da escola apareceu.”
“Ela simplesmente entrou na sua casa?” o detetive Basso perguntou.
“Ela me disse que eu tinha algo que ela queria e foi quando eu corri para o andar de cima e me tranquei na suite principal.”
“Volte,” disse o detetive Basso. “O que era essa coisa que ela queria?”
“Ela não disse. Mas ela mencionou que não era uma psicóloga de verdade. Ela disse que estava usando o emprego para espionar os alunos.” Eu olhei para todos. “Ela é louca, né?”
Os detetives trocaram olhares.
“Vou anotar o nome dela e ver o que posso encontrar,” o detetive Holstijic disse, ficando em pé.
“Deixe-me ver se entendi direito,” o detetive Basso me disse. “Ela te acusou de roubar uma coisa que pertencia a ela, mas ela nunca disse o que era?”
Outra pergunta complicada. “Ela estava histérica. Eu entendia apenas metade do que ela estava dizendo. Eu corri e me tranquei dentro da suite principal, mas ela arrebentou a porta. Eu estava escondida dentro da chaminé da lareira, ela disse que iria queimar a casa cômodo por cômodo para me encontrar. Então ela começou o fogo. Bem ali, no meio do quarto.”
“Como ela começou o fogo?” minha mãe perguntou.
“Eu não consegui ver. Estava na chaminé.”
“Isso é loucura,” o detetive Basso disse, chocalhando a cabeça. “Nunca vi nada parecido antes.”
“Ela vai voltar?” minha mãe perguntou para os detetives, vindo para ficar ao meu lado e colocou suas mãos protetoramente no meu ombro. “ está salva?”
“Talvez queira ver sobre instalação de um sistema de alarme.” Detetive Basso abriu sua carteira e deu um cartão para mamãe. “Eu confio nesses caras. Diga a eles que eu indiquei e eles darão um desconto para você.”
Algumas horas depois que os detetives saíram, a campainha tocou novamente.
“Deve ser da empresa de alarme,” mamãe disse, me encontrando no corredor. “Eu liguei e eles disseram que mandariam alguém hoje. Não posso dormir sem algum tipo de proteção até eles encontrarem a Srta. Greene e a trancarem em algum lugar. A escola se deu ao trabalho de checar as referências dela?” Ela abriu a porta e o Patch estava parado na entrada. Ele usava uma Levi’s desbotada, uma camiseta branca confortável e segurava uma caixa de ferramentas na mão esquerda.
“Boa tarde, Sra. .”
“Patch.” Não consegui distinguir o tom da minha mãe. Surpresa misturada com confusão. “Você está aqui para ver a ?”
Patch sorriu. “Estou aqui para inspecionar sua casa para o novo sistema de alarme.”
“Achei que você tinha um emprego diferente,” mamãe disse. “Achei que você servia mesas no Borderline.”
“Eu tenho um trabalho novo.” Patch fixou seus olhos nos meus e eu esquentei em muitos lugares. Na verdade, eu estava perigosamente perto de ferver. “Aqui fora?” ele me perguntou.
Eu o segui até sua moto.
“Ainda temos muito que conversar,” eu disse.
“Conversar?” Ele chacoalhou a cabeça, seus olhos cheios de desejo. Beijar, ele sussurrou nos meus pensamentos.
Não era uma pergunta, mas um aviso. Ele sorriu quando eu não protestei e abaixou sua boca até a minha. O primeiro toque foi apenas isso – um toque. Uma provocação, atraente suavidade. Lambi meus lábios e o sorriso do Patch se aprofundou.
“Mais?” ele perguntou.
Eu entrelacei minhas mãos em seus cabelos, trazendo-o para mais perto. “Mais.”